De Tarcísio a Gusttavo Lima: a corrida pelo espólio de Bolsonaro em 2026

Em um começo de ano de movimentação reduzida em Brasília e com disputas bem encaminhadas para as presidências da Câmara e do Senado, as movimentações para a disputa presidencial de 2026 passam a tomar forma diante de um cenário de incertezas.

+ Quais são as chances da empreitada política de Gusttavo Lima

Enquanto Luiz Inácio Lula da Silva (PT) faz um governo que não emplaca na avaliação popular e tem nos próprios problemas de saúde uma fonte incerteza sobre a disputa de mais uma eleição (quando ele terá 80 anos), a oposição enfileira nomes que mostram maior ou menor disposição para substituir Jair Bolsonaro (PL), inelegível até 2030, ou mesmo concorrer à Presidência da República sem sua anuência.

Neste texto, o site IstoÉ apresenta esses postulantes e as razões que podem viabilizar ou dificultar suas empreitadas ao Palácio do Planalto.

+PlatôBR: De olho em 2026, PT tenta estreitar diálogo com evangélicos

Tarcísio de Freitas (Republicanos)

Nas “bolsas de apostas” de analistas e políticos para ocupar o vácuo de Bolsonaro, a menção ao governador de São Paulo é quase certa. Em levantamento divulgado pela Paraná Pesquisas nesta segunda-feira, 13, Tarcísio somou 25,3% das intenções de voto, contra 35,2% de Lula no confronto.

O ex-ministro da Infraestrutura é considerado um candidato com menos fontes de rejeição e, portanto, capaz de conquistar um eleitorado mais amplo do que outros nomes da direita radical que almejam o espólio do ex-presidente. Essa amplitude política é demonstrada pelo arco de partidos que o apoiam no Legislativo estadual e nas prefeituras e ficou mais evidente em seu papel essencial para a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) na capital paulista, a despeito da ausência prática de Bolsonaro no pleito.

De Tarcísio a Gusttavo Lima: a corrida pelo espólio de Bolsonaro em 2026

Governador participa de celebração da Rota (Rotas Ostensivas Tobias Aguiar), tropa de choque da PM paulista | Pablo Jacob/Governo do Estado de SP

Acontece que, ao menos publicamente, o governador não mostra interesse em disputar a Presidência na próxima eleição. “Qual é o meu caminho em 2026? É continuar em São Paulo. Eu sou muito fiel àqueles que me elegeram. Tive um grande apreço da população do estado, que me acolheu, e nós temos projetos muito interessantes para entregar em 2028, 2029 e 2030”, afirmou, em entrevista à TV Bandeirantes.

Com declarações do tipo, Tarcísio demonstra fidelidade ao ex-chefe — quando Bolsonaro foi indiciado pela Polícia Federal por envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado, ele foi o único governador de oposição a Lula que o defendeu publicamente.

Tarcísio mira em alguns exemplos para não arriscar a relação. Nas eleições de 2022, enquanto ele era eleito para o Executivo com apoio do ex-chefe, bolsonaristas arrependidos como os ex-deputados Joice Hasselmann (Podemos) e Alexandre Frota (PDT) não renovaram seus mandatos, e o ex-governador João Doria (PSDB) desembarcava do Palácio dos Bandeirantes com uma candidatura frustrada à Presidência da República na bagagem.

“O governador esteve em manifestações contrárias ao STF (Supremo Tribunal Federal), não condenou os atos criminosos do 8 de janeiro e evita criticar o ex-presidente. Isso acontece porque ele precisa de Bolsonaro até para uma recondução ao cargo que ocupa”, disse Lilian Sendretti, cientista política e pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), ao site IstoÉ.

Ronaldo Caiado (União Brasil)

Apostando em uma postura oposta à do colega de São Paulo, o governador de Goiás não procura demonstrar fidelidade a Bolsonaro e coloca o plano de concorrer à Presidência em 2026 à frente da relação com o outrora aliado. 

Munido pelos altos índices de aprovação no cargo que ocupa e sem poder concorrer à reeleição — tendo em vista que está no segundo mandato –, o experiente político se declarou pré-candidato a presidente em 2026 e, com o intuito de representar a oposição no pleito em questão, passou a criticar abertamente o governo federal. Em reação, Bolsonaro chegou a chamá-lo de covarde na campanha municipal de 2024 e esteve em lado oposto a ele nas disputas pelas duas maiores cidade de Goiás — o governador acabou triunfando.

Com as vitórias locais na bagagem, Caiado disse que o país cansou da “conversa chata, cansativa, enjoada” de Bolsonaro e associou o ex-aliado ao extremismo político, do qual não faria parte, ao jornal Folha de S. Paulo. “Que eu serei candidato no primeiro turno, serei. E vou trabalhar muito para chegar ao segundo”, reiterou na mesma entrevista.

“Ele representa uma espécie de reedição dos chamados ‘candidatos azuis’, como foram José Serra e Geraldo Alckmin [então no PSDB], com capacidade para atrair o eleitor de centro. Do ponto de vista do marketing político, há potencial para uma candidatura muito competitiva”, disse ao site IstoÉ Renato Dorgan, proprietário do instituto de pesquisas Travessia.

De Tarcísio a Gusttavo Lima: a corrida pelo espólio de Bolsonaro em 2026

Ronaldo Caiado (União), em foco, e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) | Adriano Machado/Reuters

Esse perfil e a cisão com o bolsonarismo podem, contudo, tirar do mandatário a chance de concorrer ao Planalto como representante único da direita em 2026, o que tende a fragilizar seu plano.

Embora os dirigentes nacionais do União Brasil o mencionem publicamente como pré-candidato do partido, fato é que a legenda já negociou a filiação de Pablo Marçal (PRTB) e comanda três ministérios de Lula, em sinais de que não há definição acordada. “Em uma legenda que tem braços dados com o governo e a oposição, pode faltar solidez política para a construção de uma chapa presidencial”, avaliou Dorgan.

Romeu Zema (Novo)

Pouco afeito a uma mudança para o Legislativo ao final de seu ciclo de oito anos como governador de Minas Gerais, Zema já deixou aberta a possibilidade de se lançar ao Planalto na próxima eleição. “Estarei junto com o grupo da direita apoiando aquele nome que for mais viável. Pode ser o meu? Pode. Pode ser outro? Pode. O que quero é participar, nem que seja varrendo as ruas de Brasília que está com muita sujeira”, afirmou, em setembro de 2024.

Nas eleições municipais, o mandatário teve um desempenho aquém do esperado no próprio estado. Na capital Belo Horizonte, apoiou candidaturas derrotadas no primeiro e segundo turnos do pleito — Mauro Tramonte (Republicanos) e Bruno Engler (PL), respectivamente — e, enquanto trabalha para emplacar seu vice, Mateus Simões (Novo), como sucessor, viu os senadores Rodrigo Pacheco (PSD) e Cleitinho Azevedo (Republicanos), possíveis candidatos ao governo em 2026, colherem vitórias nas urnas.

Sem decolar a nível local, passou a adotar um tom mais brando sobre o pleito nacional e defender que a direita tenha uma candidatura única para se opor ao campo lulista, sem se colocar no páreo. “O discurso liberal de Zema limita sua conexão com o eleitorado de um país com enorme déficit social, o que o enfraquece do ponto de vista presidencial”, disse Renato Dorgan. Em um partido com cinco deputados federais, um senador e pouca representatividade nacional, o governador não apareceu no levantamento da Paraná Pesquisas para 2026.

Eduardo Bolsonaro (PL-SP)

Filho do ex-presidente, o deputado federal admitiu a possibilidade de substituir o próprio pai na corrida pelo Palácio do Planalto pela primeira vez durante o painel da CPAC (Conferência de Ação Política Conservadora), em Buenos Aires, em dezembro de 2024. “O plano A é [Jair] Bolsonaro. Eu posso ser o plano B”, disse.

A seu favor, o parlamentar conta justamente com o respaldo irrestrito do ex-presidente e de seu grupo mais próximo. Ao canal GloboNews, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, afirmou que Eduardo seria o segundo na fila — atrás de Tarcísio — para a candidatura nacional em caso de ausência de Bolsonaro, demonstrando confiança nos planos de seus filiados mais populares.

De Tarcísio a Gusttavo Lima: a corrida pelo espólio de Bolsonaro em 2026

O ex-presidente é seguido pelo filho, Eduardo Bolsonaro (PL-SP) | Adriano Machado/Reuters

Esse mesmo ponto pesa, contudo, contra a viabilidade da empreitada. Conhecido pelo tom verborrágico e pela “tolerância zero” com aliados infiéis às premissas de sua família, o deputado enfrentaria dificuldade para aglutinar forças políticas e atrair um eleitorado que não se identifica com a direita radical. Ao contrário de outros postulantes ao espólio de Bolsonaro, seu filho está no terceiro mandato em Brasília e não foi testado em eleições majoritárias.

Pablo Marçal (PRTB-SP)

Terceiro colocado na eleição para a prefeitura de São Paulo, o influenciador e ex-coach viu os resultados do pleito o projetarem ao páreo da política nacional. Mesmo enfrentando Ricardo Nunes, que estava na cadeira, tinha o apoio de Bolsonaro e uma ampla aliança partidária, e Guilherme Boulos (PSOL), que tinha o endosso de Lula e gastou nove vezes mais para fazer campanha, Marçal obteve 1,7 milhões de votos, chegou perto de ir ao segundo turno e pautou boa parte da disputa com estratégias questionáveis.

Depois da derrota, não hesitou em prometer uma candidatura majoritária para 2026.  “Pode ficar tranquilo que vou estar lá”, disse, à revelia de parcerias políticas. Como demonstrado na campanha paulistana, Marçal é capaz de atrair parte do eleitorado bolsonarista mesmo sem o apoio formal do ex-presidente. “Ele mobiliza o ressentimento da direita radical e adota uma linguagem mais próxima da população, características que o aproximam de Bolsonaro”, disse ao site IstoÉ Karolina Roeder, professora de ciência política da Uninter e pesquisadora do INCT ReDem.

Por outro lado, o ex-coach corre o risco de estar inelegível no pleito em questão, assim como Bolsonaro. Enfrentando ao menos nove processos na Justiça Eleitoral, Marçal se complicou especialmente pela publicação de um laudo médico falso para prejudicar Boulos. A publicação não tirou o psolista do segundo turno, rendeu a Marçal um indiciamento pela Polícia Federal e pode barrar suas ambições eleitorais nos próximos anos.

Gusttavo Lima (sem partido)

Mais novo integrante do páreo, o cantor sertanejo nunca disputou uma eleição, mas é mais conhecido do que boa parte de seus possíveis adversários. Com dois discos de diamante triplo — conquistados após superar 450 milhões de reproduções em plataformas de áudio –, mais de 45 milhões de seguidores no Instagram e dezenas de apresentações a cada ano pelo país, Lima disse ao site Metrópoles que o “Brasil precisa de alternativas” ao anunciar que pretende concorrer ao Palácio do Planalto.

De Tarcísio a Gusttavo Lima: a corrida pelo espólio de Bolsonaro em 2026

Gusttavo Lima, cantor, tornou público o desejo de ingressar na política

Nos dias que sucederam a declaração, jornais repercutiram uma reação negativa de Bolsonaro, a quem o sertanejo apoiou nas eleições de 2018 e 2022. Por outro lado, partidos passaram a cortejá-lo e Ronaldo Caiado, também presidenciável, o convidou a entrar no União Brasil, conforme a assessoria do governador confirmou ao site IstoÉA popularidade de Lima justifica o interesse das legendas, mas uma candidatura presidencial pode esbarrar no incômodo de futuros correligionários com trajetórias maiores na política.

Para a cientista política Vera Lúcia Chaia, professora da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica), Lima encontrou uma oportunidade de projeção ao se colocar no páreo. “Ele se apresentou sem nenhuma proposta e com ímpetos de revanchismo, visto ter sido acusado de uma série de problemas”, disse ao site IstoÉ.

O cantor é assombrado por encrencas judiciais. Alvo da Polícia Federal no âmbito da Operação Integration, que mira um suposto esquema de lavagem de dinheiro em jogos ilegais, Lima teve um alívio ao ver a investigação contra ele ser arquivada por decisão da Justiça de Pernambuco em 9 de janeiro, mas não se livrou de todos os receios. A revista Veja revelou que o artista procurou parlamentares ligados às empresas de apostas para que não seja incluído na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Bets.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.