Da presidência ao ostracismo: a derrocada dramática do PSDB

O PSDB está cada vez mais próximo de selar o seu destino com a incorporação da legenda ao PSD ou MDB. Nas próximas semanas, o partido deve reunir a executiva nacional para bater o martelo e dar fim de vez ao partido que já ocupou o Palácio do Planalto e provocou uma histórica disputa de espaço com o PT.

Enquanto não decide o próprio futuro, os tucanos vivem uma “guerra” interna entre as principais lideranças. O presidente do partido, Marconi Perillo, quer a incorporação ao PSD, de Gilberto Kassab, enquanto Aécio Neves (MG) quer o embarque da legenda no MDB, pensando em uma candidatura majoritária em 2026.

Perillo tem apoio do quadro paulista para fechar com o PSD. Quem lidera as negociações é o ex-prefeito de Santo André, Paulo Serra, que abriu as conversas com Kassab no fim do ano passado.

Já o deputado federal Isnaldo Bulhões (MDB-AL) é o principal articulador para que os tucanos migrem para o MDB. Os emedebistas chegaram a se reunir internamente para negociar os termos do acordo e querem avançar nas negociações com o PSDB.

De acordo com membros da legenda, a executiva deve selar o destino apenas depois do dia 20 de fevereiro, quando as condições para o acordo devem ser fechadas. A partir daí, as conversas devem avançar.

Na avaliação de Glauco Peres, professor de ciência política da Universidade de São Paulo (USP), a possível união dos tucanos com o MDB pode ser curiosa, já que retornaria à casa-mãe depois de quase 40 anos. Ele vê o PSD com um projeto mais organizado politicamente, podendo fazer a legenda pender para o partido de Kassab.

“Voltar ao MDB, de onde eles saíram e onde o PSDB se originou, seria um fim curioso para o PSDB. O PSD é um partido com mais ambição, né? É o partido que o Kassab tem claramente um projeto de poder, um projeto de se aproveitar desse momento em que o eleitorado de direita está bem organizado”, afirma.

A mesma opinião compartilha o professor de ciência política da ESPM-SP, Paulo Ramirez, que ressalta uma herança tucana no PSD. Ramirez lembra que a aliança com o MDB colocará os tucanos no toma lá dá cá da velha política, enquanto os emedebistas poderão se beneficiar pelo perfil de gestão do partido de Fernando Henrique Cardoso.

“O PSD herdou do PSDB exatamente essa postura, de partido de centro-direita, capaz de gerir com a responsabilidade mínima possível. Se o PSDB apostar na fusão com o MDB, a gente pode dizer que será o retorno à casa-mãe, já que o PSDB nasceu de lá mesmo”.

“A fusão com o MDB faria com que o PSDB se caracterizasse como um partido de centro, mas um partido que fará parte do toma lá dá cá das velhas políticas fisiológicas dentro do Centrão. O PSDB, do ponto de vista da gestão, foi pela racionalização das contas públicas, dos projetos, dos contratos, e isso pode até mesmo ser positivo para o MDB”, completa Ramirez.

Fundado em 25 de junho de 1988, o PSDB surgiu como uma dissidência do então PMDB, após a insatisfação com a aproximação do governo José Sarney, o primeiro presidente após a ditadura militar.

Em sua primeira eleição, em 1989, tentou emplacar o então senador Mário Covas como candidato à presidência, ficando em um surpreendente quarto lugar, perdendo apenas para Fernando Collor, Lula e Leonel Brizola. No segundo turno, decidiu apoiar aquele que seria seu maior adversário nos 20 anos seguintes: o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Com a crise provocada pelo impeachment de Collor e a criação do Plano Real, capitaneada por Fernando Henrique Cardoso, o PSDB ascendeu à presidência da República em 1994, mantendo seu posto até 2002, quando José Serra perdeu a eleição para Lula. Durante o governo FHC, os tucanos ficaram notabilizados pela privatização da Vale e pela abertura comercial.

Já nessa época, a legenda social-democrata se aproximou da centro-direita, ao se alinhar com o PFL (hoje União Brasil). Disputou as eleições presidenciais de 2002 (José Serra x Lula), 2006 (Geraldo Alckmin x Lula), 2010 (Serra x Dilma Rousseff), 2014 (Aécio Neves x Dilma Rousseff) e 2018, com Geraldo Alckmin – leia mais abaixo.

Com um perfil mais central, emplacou o governo do Estado de São Paulo por 20 anos, sob o comando de Mário Covas, Geraldo Alckmin – hoje vice-presidente e filiado ao PSB -, José Serra e João Dória.

Atualmente, o PSDB conta com três governadores, sendo um deles pré-candidato à presidência da República. Raquel Lyra (Pernambuco) é favorável à fusão com o PSD e tentará a reeleição em 2026, enquanto Eduardo Riedel também se mostra favorável ao lado de Kassab, mas seu nome é cotado para ir ao PL na tentativa da reeleição em Mato Grosso do Sul.

Da presidência ao ostracismo: a derrocada dramática do PSDB

Hoje deputado federal, Aécio Neves (PSDB-MG) perdeu as eleições presidenciais de 2014 para Dilma Rousseff (PT)

O início do fim

A derrocada do partido começou a ganhar corpo em 2014, quando Aécio Neves, então candidato à presidência pelo partido, questionou o resultado das eleições em que perdeu para Dilma Rousseff (PT). Na época, Aécio perdeu o pleito no segundo turno por uma diferença de 3,5 milhões de votos.

Mas o início do fim passou a ganhar mais força em 2018, durante as eleições presidenciais que levaram Jair Bolsonaro, então no PSL, ao Palácio do Planalto. Na época, o PSDB acreditava ter mantido seu poder político após João Doria vencer as eleições para a prefeitura de São Paulo em 2016.

Dois anos mais tarde, o partido apostou na dobradinha de Geraldo Alckmin para a presidência e Doria, seu afilhado político, para o governo de São Paulo. Durante a campanha, o partido já dava indícios de divisão. Alckmin tentava emplacar uma campanha próxima da população, colocando as redes sociais em segundo plano, enquanto Doria tentava descolar sua imagem da de seu padrinho político e se alinhava à de Jair Bolsonaro, que avançava entre os eleitores conservadores, com a campanha “BolsoDoria”.

Com apenas a quarta colocação, obtendo 4,76% dos votos, o PSDB teve seu pior desempenho eleitoral na disputa pela presidência desde 1994. Doria, no entanto, foi eleito governador de São Paulo e apoiou Bolsonaro no segundo turno.

“O processo de decadência do PSDB começa principalmente com a eleição de 2014, quando Aécio Neves não aceita o resultado das eleições, aciona o TSE pedindo revisão da contagem e, ao mesmo tempo, caciques do partido, como FHC e até mesmo Serra, salvo engano, foram contra”, afirma Paulo Ramirez.

“O problema central foi quando Doria não retribuiu o apoio a Alckmin em 2018 e acabou emplacando o lema ‘BolsoDoria’, gerando uma divisão dentro do PSDB. A saída do próprio Alckmin do PSDB de São Paulo e a resistência do grupo de Aécio Neves em Minas foram decisivas para a queda do partido”, completa o professor da ESPM.

Em 2020, o PSDB ainda tinha seu poder de influência, mas já estava fragmentado, mesmo com a eleição de Bruno Covas na capital paulista. No entanto, a base do partido na Câmara dos Deputados já não estava mais consolidada no Congresso Nacional. A debandada de parlamentares e grandes nomes, como o ex-senador Aloysio Nunes Ferreira, também ajudou a afundar o partido.

Nas eleições de 2022, Eduardo Leite e João Doria disputavam a preferência dos tucanos para a disputa presidencial. Doria chegou a sair do governo de São Paulo, venceu as prévias contra Leite, mas foi traído por parte da legenda, que o obrigou a retirar a candidatura para apoiar Simone Tebet (MDB).

Após esse movimento, o partido começou a perder seu protagonismo político, caindo no ostracismo no Congresso Nacional e nas principais Assembleias Legislativas. A legenda acreditava que poderia se recuperar com a candidatura de Datena à prefeitura de São Paulo, mas o fracasso do apresentador na política colocou uma pá de cal no partido.

Para Glauco Peres, o PSDB não criou uma identidade com o eleitor e acabou se perdendo no sentimento antipetista. Segundo o professor da USP, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobrevive exatamente pela identidade partidária e não apenas pela ideologia de esquerda.

“O principal erro do PSDB na história foi ter sido incapaz de conquistar um eleitorado próprio. Não criou identidade partidária junto ao eleitor, né? Os votos ao PSDB eram basicamente votos antipetistas, né? Eram votos não aliados ao PT, quer dizer, não queriam votar nos candidatos do PT à presidência, então votavam no PSDB”, opina.

“O partido não teve capacidade de cativar o eleitorado de forma ideológica, né? Não conseguiu fazer com que o eleitor soubesse o que era ser tucano. O PT vem sobrevivendo muito à custa disso, de que o eleitorado à esquerda é um eleitorado não só ideologicamente colocado à esquerda, mas que se identifica como tal e vota no PT por isso”, ressalta.

O que pesa a favor do PSD e do MDB

A escolha entre MDB e PSD é mais complexa do que uma simples articulação política. Envolve os espaços nos estados, municípios e, principalmente, as eleições de 2026.

Marconi Perillo prefere o PSD porque poderá se lançar ao governo de Goiás com uma bancada maior que a do MDB no estado. O mesmo pensam Paulo Serra e Duarte Nogueira, que têm pretensões de se fixarem em Brasília.

Já para Aécio Neves, a filiação ao MDB o colocaria em destaque para tentar a eleição ao Senado em Minas Gerais. Caso os tucanos escolham o partido de Gilberto Kassab, Aécio teria que disputar espaços com Rodrigo Pacheco, que tende a entrar na disputa pelo governo do estado, e Alexandre Silveira, que vai concorrer a uma cadeira no Senado.

Para a disputa de 2026, a legenda ainda quer lançar seu “filhote”, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, como candidato ao Palácio do Planalto. Entretanto, o PSD tem Ratinho Júnior, governador do Paraná, como pré-candidato, enquanto ainda articula com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a possibilidade de declarar apoio à sua reeleição nas próximas eleições.

Outro fator que pesa são as cadeiras nos estados. Os tucanos querem protagonismo em alguns estados-chave, como Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Os termos ainda estão sendo negociados com os partidos.

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