Discreto sem ser omisso: o estilo de Fachin no julgamento da tentativa de golpe

Desde junho de 2015, quando assumiu uma das onze cadeiras do STF, o ministro Edson Fachin caminha sobre a linha tênue que divide o silêncio da assertividade. Não é dado a entrevistas e declarações públicas. Mas, quando se arrisca no campo das palavras, defende de forma institucional o Supremo e os pilares da democracia.

Dez anos após chegar ao tribunal, Fachin assumirá a presidência da corte em setembro. A expectativa é que, até lá, as ações penais contra acusados de tramarem um golpe de Estado estejam em fase final de tramitação. Os ministros do Supremo querem julgar até o fim do ano os principais investigados – entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A intenção é fazer com que o processo criminal resvale o menos possível na campanha presidencial de 2026, para o julgamento não contaminar o processo político.

Fachin não vai participar dos julgamentos. Ele integra a Segunda Turma e os processos tramitam na Primeira. Ainda assim, será dele a responsabilidade pela defesa do tribunal perante a opinião pública e os demais poderes.

A expectativa é que o tribunal passe a ser ainda mais atacado por aliados e simpatizantes de Jair Bolsonaro, ao menos nas redes sociais. O mais provável é que Fachin não responda a eventuais agressões em declarações esparsas pela imprensa, mas que use o plenário, um cenário institucional, para falar pela corte.

Também é esperado que o ministro não politize os julgamentos. Em vez disso, deverá enfatizar aspectos jurídicos das decisões a serem tomadas e o comprometimento do Supremo com um julgamento isento de paixões.

Estilo Rosa Weber

É possível fazer um paralelo entre a gestão futura de Fachin e a presidência de Rosa Weber no STF. A ministra comandava a corte quando, em 8 de janeiro de 2023, houve a invasão e a depredação da sede do tribunal na tentativa de golpe.

Rosa não procurou os holofotes para alavancar sua imagem pessoal com a reconstrução do plenário em tempo recorde. Mas, na reabertura do ano Judiciário, menos de um mês após os atentados, discursou de forma firme no plenário contra os autores dos atos antidemocráticos.

“Não destruíram o espírito da democracia. Não foram e jamais serão capazes de subvertê-lo, porque o sentimento de respeito pela ordem democrática continua e continuará a iluminar as mentes e os corações dos juízes desta Corte Suprema, que não hesitarão em fazer prevalecer sempre os fundamentos éticos e políticos que informam e dão sustentação ao Estado Democrático de Direito”, afirmou em 1º de fevereiro de 2023.

Rosa deixou o tribunal em setembro do mesmo ano, às vésperas de completar 75 anos, a idade da aposentadoria compulsória. Fachin ocupa hoje no Supremo o posto raro de ministro com aversão aos holofotes.

Assim como Rosa, ele não costuma frequentar festas e jantares de autoridades em Brasília. Dono de hábitos espartanos, costumava ir ao cinema de mãos dadas com a esposa, a desembargadora aposentada Rosana Fachin. Nos últimos anos, os crescentes ataques ao STF tornaram inviável esse tipo de programa.

Fachin era defensor dos direitos das minorias bem antes de integrar o Supremo, quando ainda era advogado em Curitiba. Como ministro, seguiu a mesma linha. Se notabilizou na relatoria do processo sobre as demarcações das terras indígenas e da ação que limitou operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro.

“Respeito ao devido processo”

Em janeiro deste ano, o ministro discursou em evento dedicado a lembrar os dois anos dos ataques à Praça dos Três Poderes. “Precisamos sempre lembrar do que aconteceu, para que não se repita. Precisamos lembrar sempre do que aconteceu para que novas gerações não se esqueçam das dores de uma ditadura e dos males que o autoritarismo traz”, declarou.

Em novembro do ano passado, logo após o indiciamento de Bolsonaro e outras 36 pessoas pela trama golpista, Fachin deu rara declaração a jornalistas: “São fatos, sim, graves, que devem ser apurados, mas a democracia brasileira é maior do que isso tudo”.

Na ocasião, ponderou que “tudo isso deve ser visto nas etapas devidas, da forma adequada, com respeito ao devido processo, ampla defesa e todas as garantias que a Constituição e as leis preveem aos indiciados, acusados e depois para os réus, se vier uma ação penal”.

A cautela da declaração deve pautar os dois anos de mandato de Fachin. Isso não significa que o STF ficará de fora dos holofotes: além dos processos graves em tramitação, vários dos colegas do ministro são afeitos às declarações públicas – e, diante dos próximos capítulos a serem vividos na corte, não devem ficar calados.

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