Bancada na Câmara e impacto em 2026: o que há por trás da federação entre PP e União

O PP e o União Brasil anunciam nesta terça-feira, 29, a formação de uma federação partidária. Quarto acordo do tipo firmado no país, esse dispositivo fará com que, na prática, as duas legendas atuem como uma só pelos próximos quatro anos.

Essa definição ganha proporções mais relevantes na medida em que, federados, os dois partidos passarão a ter a maior bancada da Câmara dos Deputados e a segunda maior do Senado, um cenário que proporciona as fatias mais numerosas do fundo eleitoral e da propaganda na TV e no rádio para — ao menos — as eleições de 2026 e 2030.

Para que os recursos tenham efeitos práticos — no Congresso e nas urnas –, no entanto, a federação terá de acomodar forças políticas antagônicas nos estados e mesmo quanto à própria congregação entre as siglas, como a IstoÉ explica neste texto.

O que muda no papel

A federação é um dispositivo criado na reforma eleitoral de 2021 como forma de permitir que os partidos se organizem e preservem sua atuação política após as restrições que foram estabelecidas com a cláusula de desempenho e o fim das coligações em eleições proporcionais — aquelas em que os representantes do Legislativo são eleitos –, ambos decretados em 2017.

Para formar uma federação, dois ou mais partidos devem chegar a um acordo e se registrarem como tal no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em um acordo com validade de quatro anos.

A partir do registro, as legendas envolvidas preservam suas próprias estruturas partidárias (como os filiados e as sedes de diretórios), mas ficam obrigadas a lançar candidaturas únicas para cargos majoritários — prefeito, governador e presidente –, independentemente da região do país, bem como orientar em conjunto as votações no Congresso. Além disso, elas dividem os recursos do fundo partidário e o tempo de propaganda no rádio e na televisão no período.

Nas extintas coligações para eleições proporcionais, vale lembrar, as siglas se agrupavam em um pleito e formavam, em cada cidade ou estado, listas conjuntas de candidatos a vereadores e deputados, obtendo o montante total de votos e sua distribuição por todos os concorrentes. Não havia necessariamente um alinhamento político e, fechadas as urnas, elas não precisavam manter qualquer tipo de laço.

Até o momento,  três federações em vigor no país, todas formadas em 2022. A principal delas reúne PT, PCdoB e PV, e as demais são integradas por PSDB e Cidadania, e PSOL e Rede.

À exceção do PT, todas as agremiações que já integram esses acordos foram movidas pelo risco de perder o financiamento público de campanhas e o tempo de propaganda, o que não é o caso de PP ou União Brasil.

O cientista político Fernando Meireles, professor adjunto de ciência política do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e sócio da Quaest Pesquisa e Consultoria, explicou à IstoÉ que a cláusula de desempenho gerou um “sistema de competição” entre as siglas: “Elas se antecipam umas às outras para garantir recursos”.

“A criação da cláusula provocou uma redução no número de partidos representados no processo Legislativo do país. Atualmente, há um cenário em que as legendas precisam se aglomerar de alguma forma“, afirmou.

Acordo conflituoso

A conclusão do acordo foi facilitada pelo engajamento dos presidentes das legendas, Antônio Rueda e Ciro Nogueira, no matrimônio. Mais verborrágico, o dirigente do PP deixou clara a posição pela convergência. Em entrevista ao jornal O Globo, afirmou que uma federação formaria o “player mais importante” para 2026 e “o maior partido do país, em todos os sentidos, seja em número de prefeitos, vereadores ou deputados”.

“Isso também mexe com fundo eleitoral e tempo de televisão, o que é importante para as eleições do próximo ano. Há muita sinergia entre os partidos de centro-direita e de perfil mais conservador. São mais pontos que nos aproximam dos que nos afastam“, concluiu Nogueira.

Embora apoie publicamente a reversão da inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL) — de quem foi ministro — para que o ex-presidente concorra contra Lula (PT) ou um representante do governo em 2026, o senador articula para unir as forças de oposição em torno de um projeto conjunto para enfrentar o petismo nas urnas.

Na esteira da alta na rejeição a Lula, Nogueira defendeu um desembarque conjunto da Esplanada dos Ministérios para concretizar esse objetivo — o PP comanda a pasta dos Esportes, enquanto o União chefia o Turismo, mas tem indicados do senador Davi Alcolumbre (AP) à frente da Integração Regional e das Comunicações.

O gesto converge com lideranças do União que têm se afastado do Palácio do Planalto neste mesmo contexto de desgaste, conforme relatou a IstoÉ. Dentro do partido, no entanto, a defesa da federação não é unânime.

Bancada na Câmara e impacto em 2026: o que há por trás da federação entre PP e União

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos integrantes do União Brasil contrários à federação com o PP

Mesmo sendo um antagonista conhecido de Lula — é o primeiro pré-candidato de oposição à Presidência da República –, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, criticou essa possibilidade em entrevista à IstoÉ. “Federar dois partidos dessa importância e tamanho não faz sentido. É um dispositivo que funciona para legendas que possam perder o fundo partidário, o tempo de televisão, e precisam se restabelecer”, disse.

“Em 90% dos estados, União e PP convivem de forma harmônica. Torná-los uma força única e sobrepor as lideranças da base pela direção de Brasília por quatro anos será um erro enorme. A fusão entre o Democratas e o PSL [que formou o União em 2021] deixou cicatrizes que continuam expostas. Não faz sentido ampliar essa briga“, concluiu Caiado.

A manifestação expõe um problema comum a negociações do tipo, em que os acordos firmados a nível nacional nem sempre respeitam os cenários políticos de cada estado.

“Em um cenário de financiamento público dos partidos, o comando dos diretórios regionais sempre moveu os políticos, porque permite o controle da alocação de recursos. Sob uma federação, essa equação muda, já que passa a depender de concordância entre diferentes forças. O conflito que antes era reservado às urnas agora é internalizado, havendo disputa desde a definição das candidaturas“, afirmou Fernando Meireles.

Na Bahia e no Ceará, por exemplo, o PP está na base dos governadores petistas Jerônimo Rodrigues e Elmano de Freitas, enquanto o União abriga prováveis opositores deles nas urnas em 2026 — o ex-prefeito ACM Neto e o ex-deputado Capitão Wagner, respectivamente. Em Minas Gerais, a legenda tem o prefeito de Belo Horizonte, Álvaro Damião, eleito como vice de Fuad Noman (PSD, morto em março), em posição oposta à do PP, que comanda secretarias do governo Romeu Zema (Novo).

Uma vez que a federação for registrada no TSE, as legendas não poderão integrar chapas distintas nas eleições para cargos majoritários por quatro anos. Na prática, a adequação à regra poderá desfazer acordos políticos já firmados ou inibir candidaturas que, hoje, estão colocadas.

Os resultados da composição

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