
Houve época em que Lula não vacilava para demitir ministros do seu governo. Bastava o escândalo ganhar alguma visibilidade e ele logo baixava a guilhotina. Dessa forma, acalmava as críticas e se preservava de possíveis envolvimentos com as denúncias que estampavam as manchetes.
Sabe esse receio que alguns comentaristas têm de criticar, ou até de mencionar, o nome do ministro Alexandre de Moraes? Pois é, multiplique esse sentimento e talvez se aproxime do que representava o medo da imprensa ao falar de José Dirceu. Os mais jovens não têm ideia do poder que ele possuía.
O escândalo do mensalão
Quando explodiu o escândalo envolvendo seu ex-assessor para Assuntos Parlamentares, Waldomiro Diniz, flagrado em vídeo pedindo suborno ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, demorou para que algum jornalista ligasse o nome do ministro-chefe da Casa Civil ao fato. A impressão era de puro pavor diante da possibilidade de sofrer algum tipo de reprimenda.
José Dirceu só foi pressionado de fato quando estourou o escândalo do mensalão. O então deputado Roberto Jefferson revelou ao jornal Folha de S. Paulo que o PT pagava uma “mesada” de R$ 30 mil a diversos parlamentares para que votassem favoravelmente aos projetos de interesse do governo.

Perdeu o timing
Assim que a denúncia ganhou corpo, Lula não hesitou em afastar o todo-poderoso chefe da Casa Civil. Dirceu voltou à Câmara dos Deputados, com o objetivo de se contrapor ao seu desafeto. Sua permanência no governo poderia contaminar o restante da administração.
Bons tempos aqueles em que ainda havia esse mínimo de escrúpulo. Hoje, talvez pela sensação de impunidade que rondou a política nos últimos anos, Lula parece disposto a esperar, sem pressa, que assuntos indigestos simplesmente desapareçam da memória coletiva. Por isso, provavelmente, perdeu o timing para ações mais enérgicas.
Juscelino Filho foi um desgaste
Levou um tempo interminável para retirar Juscelino Filho do ministério. As denúncias se acumulavam, mas o presidente, ao que tudo indica por conveniências políticas, manteve-o no cargo. É impossível que não tenha percebido que essa presença indesejável contribuía para desgastar sua imagem. As sucessivas quedas de popularidade estão aí para comprovar.
O mais recente vacilo de Lula ocorreu no escândalo do INSS. E não foi um escândalo qualquer: a estimativa de prejuízo já ultrapassou os R$ 90 bilhões, e talvez vá além. A notícia dominou as manchetes. Nem a visita de uma oficial de Justiça à UTI onde Bolsonaro estava internado, nem o bombástico show de Lady Gaga nas praias de Copacabana, tampouco o julgamento que tornou réus, por unanimidade, os denunciados do chamado “núcleo 4”, serviram de cortina de fumaça para tirar do noticiário a roubalheira contra os aposentados.
Tarde demais
O ministro da Previdência, Carlos Lupi, deu entrevistas, tentou explicar o inexplicável, defendeu os envolvidos, e Lula permaneceu em silêncio, sem mover uma vírgula. O partido tentou transferir a culpa para Bolsonaro, mas não colou. Os números são evidentes demais para permitir esse tipo de manobra.
Só depois de muito desgaste o presidente “aceitou o pedido de demissão” do ministro. Àquela altura, a situação já era insustentável. O estrago estava feito, e a imagem do governo, comprometida. Para piorar, quem assumiu o cargo foi o número dois da pasta, Wolney Queiroz.
Um dilema perfeito
Nem cabe aqui analisar se Wolney também estava ou não envolvido na trama. O fato é que o nome deveria ser outro, alguém sem qualquer ligação com o ex-ministro. No imaginário popular, o ocupante do posto imediatamente abaixo provavelmente sabia o que estava acontecendo. E, se não sabia, foi incompetente.
Aí está o dilema perfeito: se sabia, é cúmplice; se não sabia, não merecia ocupar o cargo, muito menos ser promovido. Já chega sob fogo cruzado, com a oposição pronta para atirar. E não há do que reclamar: os opositores estão apenas cumprindo o seu papel.
Ainda faltam dois anos de governo. Lula está desesperado para recuperar a popularidade perdida. As campanhas eleitorais já começaram a se movimentar. Se quiser se reeleger, o presidente terá de mudar imediatamente seu comportamento. Segurar ministros denunciados por corrupção apenas para facilitar a “articulação” com o Congresso pode, nas atuais circunstâncias, ser um tiro pela culatra. Siga pelo Instagram: @polito