
A decisão anunciada segunda-feira (20/05/25) pelo Ministério da Educação (MEC) de proibir a oferta 100% a distância dos cursos de Medicina, Odontologia, Psicologia, Direito e Enfermagem causou forte repercussão. Paralelamente, o MEC determinou que os cursos EAD restantes (inclusive os de TI) deverão conter ao menos 20% de atividades presenciais ou síncronas obrigatórias.
Essa mudança, que já entrou em vigor, tem respaldo não só em diretrizes pedagógicas, mas também em achados da neurociência cognitiva moderna. O cérebro humano é profundamente social e plástico, sendo moldado pela qualidade das experiências de aprendizagem — e isso envolve mais do que apenas acesso a conteúdo.
O que a neurociência diz sobre o aprendizado?
A neurociência aponta que a aprendizagem de longo prazo está diretamente ligada à atenção, repetição com sentido, e socialização. Ambientes presenciais favorecem:
- Feedback imediato, essencial para correção de erros e reforço do aprendizado;
- Estímulos sensoriais variados, que aumentam a retenção de memória;
- Engajamento emocional e empático, fatores que ampliam a motivação;
- Regulação da atenção, que tende a ser dispersa em ambientes exclusivamente virtuais.
O aprendizado é um processo dinâmico que exige presença cognitiva, emocional e, muitas vezes, física. Quando há ausência de rituais sociais, rotina de estudos e convivência real com pares e docentes, o cérebro das novas gerações pode desenvolver dificuldades na formação de vínculos, comunicação interpessoal e pensamento crítico em grupo — algo que a educação híbrida pode ajudar a reverter.

Sintoma geracional: Jovens conectados, mas com dificuldades reais de comunicação
Pesquisas recentes em neuropsicologia e psiquiatria da infância e juventude revelam que há uma deterioração progressiva nas habilidades de escuta, oratória, colaboração e empatia nas novas gerações, atribuída ao excesso de interações digitais passivas.
Estudantes que crescem em um universo de comunicação por mensagens curtas, emoticons e vídeos rápidos muitas vezes chegam ao ensino superior com dificuldade de argumentar oralmente, apresentar ideias com clareza e ouvir o outro sem distrações. A presença obrigatória em atividades síncronas e presenciais, como determinado pelo MEC, pode ajudar a reconstruir essas competências socioemocionais, tão necessárias no mercado de trabalho — inclusive na área de TI.
Impacto técnico e pedagógico nos cursos de TI
Embora os cursos de TI permaneçam autorizados no EAD, a exigência de atividades presenciais ou síncronas impõe um reposicionamento estratégico por parte das instituições. Isso não é, necessariamente, uma desvantagem. Veja por quê:
Exemplos técnicos de vantagens do ensino híbrido/presencial:
-
Laboratórios computacionais
As universidades contam com infraestruturas de alta performance, como servidores para simulação de redes, clusters de processamento paralelo, ambientes virtualizados, robôs e hardwares para IoT. Essas tecnologias dificilmente são acessíveis em domicílio, o que compromete o desempenho em disciplinas práticas.
-
Suporte técnico e colaboração in loco
Muitos alunos têm dificuldades em configurar ambientes de desenvolvimento localmente. O suporte técnico imediato em laboratórios pode evitar frustrações e aumentar o tempo produtivo de aprendizagem.
-
Ambientes simulados de segurança e testes
Disciplinas como Segurança da Informação, Testes de Software e Redes de Computadores podem usar ambientes controlados para testes de ataques, exploits e firewalls, inviáveis em redes domésticas por questões de risco e custo.
-
Integração com hardware e eletrônica
Cursos com disciplinas de IoT, Sistemas Embarcados e Robótica se beneficiam de aulas com placas físicas (Arduino, Raspberry Pi, sensores), o que amplia o entendimento da camada física, essencial para projetos mais sofisticados. Vale uma provocação necessária: nem toda tecnologia impulsiona a cognição — algumas a atrofiam. O uso excessivo de GPS, por exemplo, tem sido associado à perda gradual das habilidades de orientação espacial e memória de trajetos, funções antes exercidas pelo próprio cérebro.
Da mesma forma, pesquisas recentes indicam uma queda no QI médio em jovens das últimas gerações, além de dificuldades crescentes em habilidades comunicativas, empatia e atenção sustentada. Uma das hipóteses é que o cérebro esteja sendo “terceirizado” por dispositivos, reduzindo sua plasticidade e capacidade adaptativa. A exigência de vivências presenciais e colaborativas no ensino, portanto, surge como uma resposta pedagógica e neurocientífica a esse cenário de dependência tecnológica e regressão cognitiva silenciosa.
Disciplinas que se beneficiam com atividades presenciais ou híbridas:
Disciplina | Benefícios do formato presencial/híbrido |
Redes de Computadores | Montagem de redes físicas, simulações em laboratórios |
Segurança da Informação | Ambientes isolados para testes de vulnerabilidades e firewalls |
Internet das Coisas (IoT) | Manuseio de sensores, atuadores e protocolos reais |
Estrutura de Dados e Algoritmos | Suporte presencial para entendimento de lógica complexa |
Programação de Sistemas Embarcados | Necessidade de placas físicas, multímetro, soldagem etc. |
Engenharia de Software e Gerência de Projetos | Desenvolvimento colaborativo, Scrum em dinâmica de equipe real |
Banco de Dados Avançado | Manipulação de bases grandes, cluster SQL e tuning com ferramentas reais |
Conclusão: uma medida equilibrada que promove o desenvolvimento integral
Ao exigir uma porcentagem mínima de atividades presenciais ou síncronas nos cursos superiores, o MEC não extingue o EAD — mas estimula um modelo mais equilibrado, neurocompatível e conectado à realidade de mercado. Na área de TI, essa medida pode representar um salto de qualidade na formação profissional, ao aliar o melhor da flexibilidade digital com a profundidade da aprendizagem prática e colaborativa.
** ATUALIZE-SE! **
Essa reflexão sobre os impactos da tecnologia na cognição humana, na educação e na formação profissional também se conecta diretamente com os debates propostos no CNPPD 2025 – VI Congresso Nacional dos Profissionais de Privacidade de Dados, que acontecerá nos dias 27 e 28 de junho de 2025, de forma online e presencial, no Auditório da UNIP – Campus Norte, em São Paulo/SP. Com o tema “Soberania Digital”, o congresso reunirá especialistas de todo o país para discutir como as tecnologias estão moldando — e, em alguns casos, enfraquecendo — nossa autonomia intelectual, social e nacional. Será o espaço ideal para aprofundar essas discussões e refletir sobre os limites éticos, educacionais e neurológicos de uma sociedade cada vez mais guiada por algoritmos e interfaces.
Adquira seu ingresso:
📍https://cnppd.live/2025
Em tempos de hiperconectividade, repensar o uso da tecnologia é um ato de soberania. Educar o cérebro humano continua sendo nossa ferramenta mais poderosa de proteção digital.
Quer se aprofundar no assunto, tem alguma dúvida, comentário ou quer compartilhar sua experiência nesse tema? Escreva para mim no Instagram: @davisalvesphd.