Especialistas veem relação com papa Leão 13, comprometido com a justiça social, e São Leão Magno, primeiro pontífice a adotar esta alcunha, tomado como um pacificador.Ao ser eleito o 267º papa da Igreja Católica, o cardeal americano Robert Prevost escolheu o nome pontifício Leão 14 para marcar seu papado. Para especialistas, a decisão sinaliza um compromisso do pontífice com a justiça social, alinhado à proposta do falecido papa Francisco.
“Muitos de nós ficamos com uma interrogação quando elegeram um americano, e então ele escolheu o nome Papa Leão 14” disse Natalia Imperatori-Lee, presidente do departamento de estudos religiosos da Universidade de Manhattan, à agência de notícias AP. “Para mim, isso significa que ele pretende continuar o trabalho de Leão 13.” Até o momento, o papa não deu explicações para a escolha deste nome.
Como a DW mostrou, a escolha do nome costuma dar o tom adotado pelo pontífice em seus anos à frente da Igreja Católica. Foi o que aconteceu com Francisco, que contou ter escolhido a alcunha de São Francisco de Assis, uma forma de orientar seu trabalho a uma igreja mais próxima dos pobres. Ele e o papa João Paulo foram os únicos a escolher um nome inédito desde o ano 914.
A defesa social de Leão 13
Já Leão 14 parece apontar para um compromisso com as questões sociais, analisa Imperatori-Lee. O papa Leão 13, por exemplo, que liderou a Igreja Católica de 1878 a 1903, lançou as bases do pensamento social católico moderno, especialmente com sua encíclica Rerum Novarum, de 1891.
No documento, ele abordou temas como a dignidade humana, direitos dos trabalhadores e faz críticas ao capitalismo no início da era industrial. Leão 13 também chamou a igreja a defender a classe trabalhadora por meio da promoção de sindicatos.
“Ao escolher o nome Leão 14, ele mostra que está comprometido com o ensinamento social da igreja, que foi fundado por seu antecessor Leão 13”, afirmou Thomas Reese, padre americano e especialista em Vaticano, ao jornal americano The Washington Post.
Além disso, Leão 13 também atendeu a um apelo de um abolicionista brasileiro e publicou uma carta em 5 de maio de 1888 pedindo o fim da escravidão no Brasil. O principal argumento do pontífice era que o regime escravocrata era contrário aos princípios do cristianismo.
Ouvido pela CNN americana, o padre Art Purcaro, um amigo de Robert Prevost, também vê relação da escolha com o “pensamento social” do predecessor. Ele acredita que a escolha do nome significa que o novo pontífice “quer continuar o papel que o papa Francisco” desempenhou na promoção da justiça social.
Já o padre John Lydon, ex-companheiro de casa do cardeal americano, também disse à CNN que acredita que Prevost escolheu o nome Leo “para se conectar ao primeiro papa que nos deu o ensinamento social católico da Igreja”.
A doutrina e diplomacia de Leão 1
Outro predecessor, o primeiro a escolher a alcunha, Leão 1, ficou conhecido por ter impedido a invasão bárbara de Átila, o Huno, em 452 d.C., convencendo-o a não saquear Roma por meio da diplomacia, contou o cardeal italiano Maurizio Piacenza à emissora estatal italiana RAI, relacionando-o ao perfil pacificador do novo papa.
Leão 1 foi um dos principais pontífices por ter defendido a autoridade papal sobre a Igreja e estabelecido a doutrina da dupla natureza de Cristo (visto como Deus e também como homem). Após sua morte, foi canonizado São Leão Magno. Ele é o primeiro papa listado com o título de “O Grande” no Annuário Pontifício, compêndio da hierarquia da Igreja.
Para especialistas, a preocupação dos papas que usaram o nome Leão com a eclesiologia, ou seja, a doutrina da Igreja, também pode dar o tom do papado de Leão 14.
Isso porque Prevost é agostiniano — ordem mendicante que tem atuação pastoral missionária — mas também doutor em Direito Canônico pela tradicional Pontifícia Universidade São Tomás de Aquino. Tal perfil alia tanto o olhar social quanto a tradição e preocupação com a doutrina católica.
Como os papas escolhem seu nome pontifício?
Durante a maior parte do primeiro milênio da Igreja Católica, os papas usavam seus nomes de batismo. A primeira exceção ocorreu no século 4, com o romano Mercúrio, que havia recebido o nome de um deus pagão e optou pelo mais apropriado João 2.
A prática de adotar um novo nome se consolidou no século 11, um período de papas alemães que escolhiam nomes por “um desejo de expressar continuidade”, explicou Roberto Regoli, historiador da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma à agência de notícias AP.
Por muitos séculos, os novos papas tendiam a escolher o nome de quem os havia elevado a cardeal. João foi o mais popular, escolhido por 23 papas, seguido por Bento e Gregório, com 16 cada.
Segundo Regoli, foi a partir da metade do século 20 que os papas passaram a escolher nomes que expressassem o propósito de seus papados.
g1 (ap, ots, dw)