Alemã se tornou uma das mais importantes testemunhas dos horrores do nazismo. Ela dedicou sua vida a conversar com jovens e defender a empatia como antídoto contra o ódio.A sobrevivente do Holocausto Margot Friedländer, uma das testemunhas mais importantes dos horrores do nazismo, morreu nesta sexta-feira (09/05) aos 103 anos, em sua cidade natal, Berlim, segundo anunciou a fundação que leva seu nome.
“Com sua morte, a Alemanha perde uma voz importante da história contemporânea”, disse a fundação em um comunicado. “Desde seu retorno à cidade natal, após seis décadas de exílio em Nova York, esta cidadã honorária de Berlim dedicou-se incansavelmente à reconciliação e à memória”, acrescentou.
Margot Friedländer faleceu no mesmo dia em que receberia a Grã-Cruz de Mérito, uma das mais altas condecorações do país, das mãos do presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier. Mas a cerimônia foi cancelada previamente devido a seus problemas de saúde. Em vida, ela recebeu diversas homenagens, como o Prêmio Walther Rathenau por sua contribuição para esclarecer a perseguição e o extermínio de judeus durante o nazismo.
“Ela ofereceu reconciliação ao nosso país, apesar de tudo o que os alemães lhe fizeram quando era jovem. Não poderíamos estar mais gratos por esse presente”, declarou Steinmeier.
Sobrevivente de Theresienstadt
Friedländer nasceu em Berlim em 1921 em uma família judaica de fabricantes de botões. Quando seu irmão Ralph foi preso em janeiro de 1943, sua mãe se entregou à polícia secreta da Gestapo , foi deportada para Auschwitz junto com o filho e lá foi assassinada.
Friedländer, então com 21 anos de idade, escondeu-se e sobreviveu por 15 meses em 16 esconderijos subterrâneos diferentes em Berlim. Na primavera de 1944, ela se deparou com uma patrulha dos chamados “agarradores” – judeus que eram forçados a rastrear e entregar outros judeus em nome da organização paramilitar nazista Schutzstaffel (SS).
Ela foi presa e levada para o campo de concentração de Theresienstadt. Lá, reencontrou Adolf Friedländer, um conhecido de seu trabalho como costureira de fantasias na Liga Cultural Judaica em Berlim. Juntos, eles sobreviveram ao Holocausto, casaram-se e emigraram para Nova York em 1946.
Em 2008 publicou sua autobiografia Versuche, dein Leben zu machen (Tente viver sua vida). O título do livro é também a mensagem que recebeu de sua mãe quando se entregou à polícia. Em 2010, Friedländer mudou-se definitivamente para Berlim, e passou a realizar leituras e palestras sobre o Holocausto.
“Sempre me perguntei se voltar [a Berlim] era o certo a fazer”, relembra Margot Friedländer no documentário A long way home (Longo caminho para casa), coproduzido pela DW em 2010.
No filme, ela admitiu sentir certo desconforto em meio a alguns berlinenses. “Ainda sou muito cautelosa com pessoas da minha geração que conheço aqui. Foram elas que aplaudiram os nazistas naquela época, e não fizeram nada para pará-los. Todo mundo sabia o que estava acontecendo, mas fingia que não via. Embora eu tenha voltado, ainda é algo que me afeta muito profundamente”, contou.
“Olhe para o que te une”
Após retornar para a capital alemã, dedicou sua vida a conversar com os jovens, para contar sua história e defender a empatia como antídoto contra o ódio.
Em A long way home ela explica sua relação com a juventude. “Como posso sentir saudades da Alemanha depois que os alemães mataram meus pais? A isso, eu teria que responder: é exatamente por isso que vim, ou seja, para conhecer os jovens que não tiveram nada a ver com isso”, argumenta.
“Não falo para os jovens sobre o campo de concentração e o que aconteceu exatamente, eles sabem disso. Eu lhes digo o que significaria para eles passar por isso. Que aquilo simplesmente não era humano”, disse, em entrevista concedida à DW em 2023.
Na ocasião, afirmou que seria a voz dos milhões que foram assassinados durante o nazismo, e que sua missão seria impedir que isto acontecesse novamente.
“Não olhe para o que te separa. Olhe para o que te une. Seja humano”, defendeu no ano passado.
gq (DW, ots)