O poder do presidente da Câmara e do Senado é efêmero, afirmam ex-presidentes

O Congresso Nacional está nos preparativos finais para as eleições da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, previstas para este sábado, 1º. Os cartazes dos candidatos estão espalhados pelo prédio, e as últimas articulações estão sendo ajustadas para garantir os cargos-chave para os partidos.

Nas duas Casas, os resultados estão praticamente definidos. O deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) é o amplo favorito na Câmara, enquanto Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) deve retornar ao posto de presidente do Congresso.

Afilhado político do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e apoiado por Arthur Lira (Progressistas-AL), Motta tem perfil conciliador, é visto como mais maleável que seu antecessor, mas pode mostrar suas garras a qualquer momento. Na avaliação de interlocutores do Palácio do Planalto, é um político que não deve oferecer tantas resistências a pautas governistas.

O deputado conseguiu uma frente ampla que vai do PL ao PT e pode contabilizar até 495 votos, sem contar as possíveis traições. Para isso, precisou fechar acordos duros sobre cargos na Mesa, em comissões e pautas-bomba para garantir o apoio das legendas.
No caso do PL, Hugo Motta precisou se comprometer com o PL da Anistia, além de pautas ideológicas do partido e a 1ª vice-presidência da Mesa. Já o PT recebeu a garantia de governabilidade para Lula (PT), além de cargos estratégicos, como a 1ª secretaria da Mesa, vista como a prefeitura da Casa.

Outra promessa feita por Motta é a previsibilidade de pautas, além de maior participação de deputados fora das lideranças nas decisões. Sob o comando de Arthur Lira, a Câmara teve um número recorde de sessões extraordinárias, com pautas decididas horas antes das votações.

Ex-presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS) afirma ser necessário o cumprimento dessa promessa para o aumento do diálogo com a base da Casa. Ele ainda alerta para os cuidados que devem ser tomados. “Os grandes presidentes da Câmara dos Deputados foram aqueles que tiveram a capacidade de ouvir muito: ouvir a sociedade, ouvir as instituições, ouvir os poderes, ouvir os parlamentares também”, afirmou.

“Você tem que saber lidar com o poder que tem para que ele não suba à sua cabeça, para que não ache que tem poder em demasia, que não tenha a compreensão de que pode tudo. Um presidente da Câmara dos Deputados não pode tudo. Ele pode muito, mas não pode tudo. E, portanto, o primeiro conselho que eu daria seria o da humildade e de saber que o poder é efêmero”, ressaltou.

Sob o comando de Hugo Motta, a Câmara deve seguir o ritmo de tramitação de pautas polêmicas, como o projeto que anula as condenações do ex-presidente Jair Bolsonaro e o que proíbe o aborto após 22 semanas. Ambas são demandas do PL, de Bolsonaro.
Na avaliação de Marco Maia, as chamadas “pautas-bomba” devem ser bem discutidas e articuladas para evitar desgaste na própria Câmara. Ele ainda ressaltou a necessidade de debates em favor da democracia e, principalmente, de pôr fim aos esquemas de emendas no Congresso Nacional.

“Nós não podemos, de forma alguma, dialogar com qualquer possibilidade que não seja a de mantermos o Brasil no rumo da democracia. E, portanto, a defesa da democracia tem que ser uma causa tanto do Congresso Nacional quanto da Câmara e do Senado, separadamente. O papel dos presidentes, nesse aspecto, é fundamental, ou seja, criar resistência a qualquer tentativa de rompimento da democracia e do fortalecimento das instituições democráticas do país”, defendeu.

“Nós temos que sair dessa coisa imediata, cotidiana, do dia a dia do parlamento e dessa ocupação extra que o parlamento se deu nos últimos anos de administrar uma parcela significativa do orçamento. Precisamos estimular todas as forças vivas da sociedade brasileira a pensar um projeto para o Brasil, um projeto nacional para os próximos 10, 20, 30, 40, quem sabe até para os próximos 50 anos. E, claro, nas pautas polêmicas, é necessário um esforço redobrado para construir acordos e consensos”, avaliou.

O retorno de Davi Alcolumbre

Se na Câmara dos Deputados a votação deve ser um massacre contra os adversários, no Senado o cenário não é diferente. Davi Alcolumbre é o grande favorito para retomar a cadeira que ocupou entre 2019 e 2021, ao suceder Eunício Oliveira (MDB-CE), que não havia sido reeleito para a legislatura seguinte.

Ao contrário de Hugo Motta, Alcolumbre tem um perfil mais direto. Ele mesmo desce à base para negociar as pautas de seu interesse, em vez de mandar emissários.

Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a principal da Casa, Davi Alcolumbre é conhecido por ser um político típico do Centrão: é necessário dar para receber, e é assim que ele pretende lidar com o Palácio do Planalto.

Hoje deputado federal, Eunício Oliveira não vê dificuldades para Alcolumbre na nova gestão. Na avaliação do ex-senador, o favorito para assumir a presidência do Congresso está mais maduro, deve impor as vontades do Legislativo, mas tende a ser mais maleável nas negociações com o Judiciário.

“Muito jeitoso, novo, muito trabalhador, dedicado ao processo legislativo. Manteve uma articulação sempre muito forte ali, e o Davi é uma pessoa muito articulada e não terá grande dificuldade. O Senado vai viver um novo momento com o Davi, não tenho dúvida disso, que ele vai viver e fazer um novo momento conciliador para dentro da Casa”, aponta Oliveira.

“Ele busca muito fazer esse equilíbrio entre os poderes, se relacionar bem com o Poder Judiciário, se relacionar bem com o Poder Executivo e dirigir bem para dentro da Casa, promovendo o equilíbrio e a independência dos poderes.”

Eunício fez coro a Marco Maia e afirmou ser necessário manter o poder de articulação com o “chão de fábrica” do Senado. “É necessário que permaneça esse articulador, que transite abertamente e converse abertamente com as pessoas, porque essa é a essência do parlamento.”

“[A presidência do Senado] é uma honraria, mas não é uma eternidade, nem nos coloca numa posição diferente daqueles que não estão presidindo. Somos todos iguais, somos todos companheiros. Eventualmente, você está presidindo, eventualmente, você está liderando, mas isso não é um processo ditatorial, é um processo democrático”, completou.

Governabilidade de Lula

Durante a gestão de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfrentou dificuldades para conseguir aprovar projetos importantes para o governo. Em outras pautas, como o PL das Fake News, sequer houve tramitação ágil.
Eunício Oliveira admite que o governo tem grandes dificuldades de articulação no Congresso Nacional, mas avalia que Hugo Motta e Alcolumbre podem trazer mais “calmaria” ao Palácio do Planalto.

“Eu não vejo harmonia hoje entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo. O presidente Lula, mesmo com o Davi não pertencendo nem ao meu partido nem ao Partido dos Trabalhadores, acho que irá ponderar e articular de forma maleável as pautas que entrarão em discussão”, afirmou.

Marco Maia compartilha da opinião de Eunício, mas credita a articulação a Lula. Ele avalia a necessidade de jogo de cintura de Hugo Motta para evitar instabilidade entre as instituições.

“Eu acho que o governo vai ter uma boa governabilidade. O presidente Lula é muito habilidoso nisso. Tem uma equipe que provavelmente vai passar por algumas mudanças, algumas transformações agora, neste primeiro momento. Há ajustes que precisam ser feitos no governo. O presidente Lula sabe disso, o mundo da política sabe disso.”

“Se o presidente Hugo Motta for também habilidoso, como eu espero que seja, ele vai saber conduzir o processo legislativo para que não haja instabilidade entre o governo e as instituições.”

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