Neutrino de energia recorde abre portas a Universo inexplorado

ROMA, 12 FEV (ANSA) – Um telescópio submarino localizado na costa da Sicília, sul da Itália, detectou o neutrino com maior energia já visto, em uma descoberta que abre caminho para uma nova página para a física de partículas.   

O resultado, publicado na capa da revista científica Nature, foi alcançado pelo projeto europeu KM3NeT e apresentado em um evento simultâneo no Instituto Nacional de Física Nuclear (INFN) da Itália, em Roma, no Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) da França, em Paris, e no Instituto Nacional de Física Subatômica da Holanda, em Amsterdã.   

O neutrino cósmico, chamado KM3-230213A, tem uma energia de 220 milhões de bilhões de elétron-volts (220 PeV), o equivalente a 20 mil vezes a carga energética usada para acelerar partículas no Grande Colisor de Hádrons (LHC), o maior equipamento do tipo no mundo.   

“Isso abre uma nova janela de observação do Universo”, disse Paschal Coyle, pesquisador do CNRS em Marselha e que chefiava o KM3NeT no momento da descoberta, que demonstra pela primeira vez que podem existir neutrinos com carga energética tão elevada.   

Os neutrinos são partículas fantasmagóricas e enigmáticas emitidas sobretudo por estrelas, mas também por simples seres vivos, e que quase nunca interagem com a matéria. Sem carga elétrica, eles viajam sempre em linha reta e são capazes de atravessar até mesmo os materiais mais compactos sem sofrer alteração.   

O termo foi estabelecido pelo físico italiano Enrico Fermi e significa “pequeno nêutron”. Acredita-se que os neutrinos sejam a segunda partícula mais abundante do Universo, atrás apenas dos fótons (partículas de luz). No entanto ainda não se sabe como eles se formam.   

“A energia extremamente elevada coloca o neutrino em uma região totalmente inexplorada e de extremo interesse para a ciência. Futuras observações de outros eventos desse tipo servirão para construir um quadro interpretativo mais claro”, afirmou Rosa Coniglione, pesquisadora do INFN e vice-coordenadora do KM3NeT, que reúne 360 cientistas de 68 instituições e 22 países, no momento da descoberta.   

Já Giacomo Cuttone, responsável italiano do projeto, apontou que uma energia dessa magnitude “não é simples de enquadrar na nossa galáxia”. “O desafio é compreender possíveis mecanismos que podem tê-la gerado”, acrescentou. “Encontramos algo que não esperávamos. Estamos abrindo uma nova janela para o Universo”, reforçou Luigi Antonio Fusco, também do INFN.   

Uma das hipóteses, segundo Damien Dornic, do CNRS, é de que o neutrino superenergético tenha chegado de fora da nossa galáxia, a Via Láctea. A partícula foi detectada em 13 de fevereiro de 2023, mas os pesquisadores preferiram realizar novas análises dos dados antes de divulgar o resultado, por se tratar de um evento extraordinário.   

O responsável pela descoberta é o detector Arca (acrônimo em inglês para “Pesquisa de Astropartículas Cósmicas no Abismo”), que integra o telescópio KM3NeT-IT, situado a 3,45 mil metros de profundidade e a 80 quilômetros da costa da Sicília.   

E as profundezas do Mediterrâneo não foram escolhidas por acaso: alguns neutrinos conseguem interagir e produzir múons, partícula subatômica semelhante ao elétron, porém com massa muito maior e tempo de vida de apenas frações de segundos. Ao fazer isso em um meio transparente, como a água, eles emitem uma luz azul detectável pelo Arca. (ANSA).   

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