Estratégia “segura” de investimento evitaria rombo bilionário na Previ, dizem especialistas

Uma estratégia de investimentos “segura”, priorizando ativos de renda fixa, que garantem previsibilidade em pagamentos futuros, teria evitado o rombo bilionário na Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ), de acordo com especialistas consultados pela CNN.

O Tribunal de Contas da União (TCU) iniciou na semana passada uma auditoria na gestão da Previ, após um rombo de R$ 14 bilhões no Plano 1 entre janeiro e novembro de 2024.

A solicitação partiu do ministro Walton Alencar Rodrigues, que expressou “gravíssimas preocupações” com o resultado do fundo.

O resultado vai na direção contrária do histórico recente da Previ: em 2022, o resultado acumulado no ano ficou em superávit de R$ 5,2 bilhões; e em 2023, de R$ 9,8 bilhões.

O déficit de 2024, com gestão capitaneada pelo sindicalista João Fukunaga, só se compara ao resultado do fundo no pico da pandemia.

Em 2021 houve déficit de R$ 14,85 bilhões — mas num momento em que a crise da Covid-19 impactou cadeias globais de abastecimento e gerou volatilidade, afetando tanto investimentos de renda fixa quanto de renda variável, explicou a própria Previ em balanço anual.

Segundo Luigi Micales, gestor da Black Swan, o “maior desacordo” nas escolhas de investimentos do fundo é a distribuição percentual entre as classes de ativos.

Do total de 102 mil beneficiários da Previ, 3% estão na ativa, o que significaria que o fundo está em fase de pagamento de benefícios e não mais de acumulação

“Isso implica que deveria haver uma alocação mais conservadora, priorizando ativos de renda fixa que garantam a previsibilidade dos pagamentos futuros. Com resgates anuais de aproximadamente 8%, a Previ poderia priorizar uma alocação maior em renda fixa”, disse.

“Em um cenário em que títulos públicos pagam IPCA + 7,5% ao ano, o fundo poderia garantir um fluxo de caixa mais adequado à sua estrutura de pagamentos, trazendo maior previsibilidade e segurança financeira para seus beneficiários”, completou.

No acumulado de janeiro até novembro — período do rombo —, o Plano 1 da Previ concentrou 27,88% de seus ativos em renda variável.

Estes investimentos registraram 9,04% de prejuízo e lideraram as perdas no ano. Mesmo em 2021, durante a Covid-19, o déficit nesta classe foi menos expressivo (1,79%). Em 2022 e 2023 o lucro superou 16%.

Os ganhos com renda fixa ficaram abaixo dos percentuais registrados em anos recentes, mesmo em um cenário de juro elevado: 7,79%. Em 2021, o lucro com esta classe de ativos foi de 10,49%; em 2022, de 12,43%; e em 2023, de 11,21%.

Esta mesma percepção sobre a distribuição equivocada de ativos é compartilhada por Cássio Landes, head de Previdência e Seguridade da Valor Investimentos.

O especialista indica que “a diminuição da parcela de renda variável poderia ter mitigado parte do resultado negativo da Previ”.

Lucas Sharau, economista da iHUB Investimentos, afirma que, para minimizar riscos, uma estratégia conservadora deveria ser aplicada, com ativos pós-fixados, como o Tesouro Selic.

“Se houvesse uma gestão mais cautelosa, considerando o cenário econômico, a Previ poderia ter reduzido o impacto da volatilidade dos mercados e minimizado o déficit”, disse.

Impactos para aposentados do BB

Especialistas consultados pela CNN citam “vários motivos” que justificam a análise da saúde dos grandes planos de previdência complementar, desde o impacto no bolso dos brasileiros até as contas públicas, e a eventual possibilidade de casos de corrupção.

“Esses fundos têm uma obrigação social. Eles lidam com beneficiários que, ao longo da vida inteira, foram acumulando recursos para poder se aposentar. Quando ocorre um resultado negativo como esse, fica a dúvida de por quanto tempo isso vai se perpetuar”, afirma Cássio Landes.

A preocupação é que os beneficiários sejam impactados no futuro, já que a previdência é a “única ou principal fonte de renda que eles têm”, completa Landes.

Na Previ, os funcionários do Banco do Brasil (BB) na ativa contribuem mensalmente com uma parte de seus vencimentos para formar um fundo que, teoricamente, deve se multiplicar para pagar os benefícios dos aposentados e futuros aposentados.

“Perdas e prejuízos podem acontecer e, quando são confirmadas, o contexto das decisões que levaram a esses resultados devem ser analisados e justificados. Um bom parâmetro é a comparação da performance do fundo de pensão com o comportamento dos demais fundos de pensão do mercado”, avalia Gilberto Braga, professor de economia do Ibmec-RJ.

Jorge Boucinhas, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP) cita a possibilidade de “malversação de recursos públicos”.

Mesmo sendo uma entidade fechada de Previdência Complementar, com dinheiro dos empregados do BB, o déficit da Previ gera risco para as contas públicas, já que a União pode ser acionada para suprir os recursos.

“Um fundo como esse tendo resultado negativo, se houver déficit por qualquer razão, muito possivelmente serão necessários aportes de novos recursos pelo ente público”, explica André Gilberto, CEO e responsável pela área de Direito Administrativo do CGM Advogados.

“Quando olhamos para uma Caixa Econômica, para um Banco do Brasil, estamos falando de uma potencial sangria em recursos de empresas públicas ou sociedades de economia mista muito importantes”, complementa.

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