Saiba como ondas de calor diminuem doações de sangue, aumentam lesões no trabalho e prejudicam ensino


Com quinta onda de calor prevista para durar até domingo (9), Campinas enfrenta temperaturas com máximas cerca de 5 a 7 °C acima da média. Saiba como ondas de calor afetam doações de sangue, lesões no trabalho e prejudicam ensino.
Reprodução/EPTV
O calor extremo deste verão tem reduzido o número de doadores de sangue nos hemocentros de Campinas (SP) e região. Além da saúde, as altas temperaturas também impactam o ambiente de trabalho, aumentando os riscos de acidentes, e prejudicam o desempenho dos estudantes em salas de aula sem ventilação adequada.
Em 2024, ano considerado o mais quente da história, a região teve 113 dias com máximas de pelo menos 35°C. Só em 2025 a metrópole enfrentou cinco ondas de calor nos dois primeiros meses do ano, provocando a suspensão de aulas presenciais em faculdades e colégios técnicos.
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“Seu corpo está lutando para se manter inteiro, para não desmaiar. Então não há capacidade cognitiva que possa competir nesse momento em que o corpo tá entrando em colapso. Que é o que de fato está acontecendo”, diz Heloísa Matos, professora doutora da Unicamp.
Para compreender as implicações nos hemocentros, escolas e para o trabalhador, o g1 conversou com:
Acacira Araújo, diretora do Centro de Hematologia de Campinas e Americana.
Heloísa Matos Lins, professora doutora da Unicamp e coordenadora do Observatório de Direitos Humanos da universidade.
Thaís Cremasco, advogada trabalhista.
📉 Queda no número de doadores
Acacira Araújo, explica que, no momento que as temperaturas externas são superiores às do corpo humano que fica em torno dos 36°C, há um desgaste maior dos órgãos, principalmente do aparelho circulatório e cardíaco.
“A pessoa pode ter inicialmente uma queda de pressão arterial e uma compensação para reverter isso com taquicardia e um trabalho cardíaco aumentado, podendo inclusive ocasionar eventos como arritmias, infartos e se em situações mais extremas”
Ela explica que este é um cenário que resulta no aumento do uso dos bancos de sangue, mas o calor excessivo também provoca uma queda expressiva no número de doadores.
“As pessoas saem menos de casa e com isso também deixam de ir até os bancos de sangue. Em contrapartida, a gente tem uma taxa de utilização maior de sangue e uma queda nas doações desbalanceia ainda mais essa equação.”
“As pessoas saem menos de casa e com isso também deixam de ir até os bancos de sangue”, diz a diretora do Centro de Hematologia de Campinas e Americana.
Divulgação
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🧑‍🏫 Ensino prejudicado
Dentro do ambiente educacional, a capacidade de manter a atenção nas salas de aula é uma habilidade essencial para os estudantes, mas o calor extremo em ambientes sem climatização impacta diretamente na concentração por uma questão de sobrevivência do corpo.
Heloísa Matos Lins explica que a capacidade de aprendizado e produtividade cai em relação ao que é esperado pela escola. As soluções mais simples como mudança nos horários das aulas de educação física, por exemplo, e aumento da ventilação natural não são suficientes.
“A climatização através de aparelho de ar-condicionado é alguma coisa para ontem”
Apenas 3% das escolas da rede pública do Estado de São Paulo tem salas climatizadas, segundo dados do Censo Escolar de 2023.
Reprodução/EPTV
A professora ressalta que o Estado de São Paulo tem o pior índice do país em relação à climatização nas salas de aula da educação básica pública, cerca de apenas 3% tem algum tipo de refrigeração, segundo dados do Censo Escolar de 2023.
“Isso é inadmissível considerando o nosso PIB. Não tem desculpa para esse tipo de precarização […] não é luxo, não é alguma coisa a se somar, no que já é oferecido. Não, a gente não tá oferecendo o mínimo em termos da dignidade de permanência dessas pessoas na sala de aula”
Outras ações paralelas podem ser tomadas como a diminuição da carga horária presencial e aulas online, bem como o “desemparedamento”, que leva algumas disciplinas para fora das salas convencionais. No entanto, todas as decisões exigem mudanças na proposta pedagógica em nos aspectos metodológicos.
“Em algumas escolas em que o nível socioeconômico permite, tá havendo uma proposição de aulas online, o que não é possível em escolas em que há uma população mais empobrecida por falta de recursos e de acesso à internet.”
Ela também pondera, para além das questões sociais, que é necessário atenção às adequações para um sistema online. Pois, como foi observado durante a pandemia, o isolamento pode resultar em problemas de saúde mental em jovens e crianças.
“Sair do presencial para o online, como se ainda que houvesse possibilidade de todos os estudantes participarem e não houvesse comprometimento de nenhuma outra ordem, não vai resolver e a gente vai criar possibilidade de adoecimento mental das crianças e jovens”.
Por fim, ela conclui que as escolas e a sociedade civil precisa fazer valer os direitos das crianças, cobrando do poder público para investimentos estruturais, pois “não é possível que um corpo nessas condições adversas, possa aprender e muito menos se desenvolver plenamente”
Sob calor excessivo aumenta em 10% a probabilidade de sofrer um acidente de trabalho.
Marcos Serra Lima/g1
👨‍🏭👷🧑‍💼 Lesões no trabalho
O estresse térmico, ou condição na qual o corpo não consegue dissipar o calor de forma eficiente, também provoca lesões no trabalho, dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), apontam cerca de 4.200 trabalhadores morreram em todo o mundo devido a ondas de calor.
Este índice representa um aumento de 66% em relação ao ano 2000, e segundo a advogada trabalhista Thaís Cremasco, estudos indicam que trabalhar sob calor excessivo aumenta em 10% a probabilidade de sofrer um acidente de trabalho.
“O trabalho tem que ser uma fonte de saúde, vida e bem estar! Às empresas devem estar atentas a sua obrigação legal de zelar pela saúde e segurança no trabalho”, fala.
A questão do conforto térmico no ambiente de trabalho já estava prevista desde a consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em 1943. Ela estabelece a necessidade de ventilação artificial, quando a natural não é suficiente e roupas especiais para trabalhos ao ar livre.
Posteriormente, foi estabelecido padrões de temperatura para ambientes climatizados “recomendando que seja mantida entre 20 °C e 23 °C para atividades que exigem maior demanda intelectual”, diz Cremasso.
“O empregador tem a responsabilidade de garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável. Se for comprovado que a exposição ao calor excessivo ocorreu por negligência ou falta de medidas adequadas de proteção por parte do empregador, este pode ser responsabilizado por doenças ou lesões sofridas pelo trabalhador”, conclui.
O que diz a Educação?
“A atual gestão da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) ampliou em quase 70 vezes o número de escolas estaduais climatizadas em todo o estado. Em 2023, apenas nove unidades contavam com ar-condicionado em todas as salas de aula.
Hoje, esse número subiu para 692, e até o fim do ano, mais 364 escolas serão beneficiadas, totalizando mais de mil unidades climatizadas e em pleno funcionamento. Cerca de R$ 350 milhões estão sendo investidos nesse projeto, que é implementado em etapas, priorizando as escolas localizadas nas regiões mais quentes do estado”. 
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