Novas regras para cidadania italiana: entenda o que muda

SÃO PAULO, 29 MAR (ANSA) – O Conselho dos Ministros da Itália, chefiado pela premiê Giorgia Meloni, aprovou um pacote de medidas para restringir a transmissão da cidadania por direito de sangue, o chamado “jus sanguinis”, notícia que caiu como uma bomba em comunidades de ítalo-descendentes no exterior, sobretudo em países como o Brasil, um dos principais destinos de imigrantes italianos nos séculos 19 e 20.   

Estima-se que a maior nação da América Latina seja lar de cerca de 30 milhões de pessoas com ascendência italiana, número que fica entre 60 milhões e 80 milhões no mundo todo. A partir de agora, no entanto, esse público deve sofrer uma redução drástica com as novas regras aprovadas pelo governo Meloni. Veja abaixo o que muda: Limite geracional – Uma das medidas é um decreto-lei que estabelece que os ítalo-descendentes nascidos no exterior “serão automaticamente cidadãos italianos apenas por duas gerações”, segundo uma nota oficial do governo. “Apenas quem tem pelo menos um pai ou um avô nascido na Itália será cidadão desde o nascimento”, explica o comunicado. Ou seja, pessoas que não tiverem pelo menos um genitor ou um avô nascido em solo italiano não terão mais a cidadania reconhecida, diferentemente do que acontecia até agora, quando não havia limite geracional.   

A regra vale independentemente da data de nascimento do ítalo-descendente, porém não deve afetar processos já em andamento, e busca colocar um freio na explosão de pedidos apresentados ao longo dos últimos anos, sobretudo na América do Sul.   

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a rede consular da Itália no Brasil reconheceu mais de 14 mil cidadanias em 2022, número que aumentou para 20 mil em 2024. Na Argentina, a cifra passou de 20 mil em 2023 para 30 mil no ano seguinte.   

Entre 2014 e 2024, a população de italianos residentes no exterior aumentou 40%, de 4,6 milhões para 6,4 milhões de pessoas.   

“É uma reforma de grande importância pois busca reforçar os laços entre quem quer ser cidadão italiano e a Itália. Ser cidadão italiano é uma coisa séria. Infelizmente, ao longo dos anos houve abusos e pedidos de cidadania que iam além do verdadeiro interesse de nosso país”, disse o vice-premiê e ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani, em coletiva de imprensa em Roma.   

Além disso, ítalo-descendentes também poderão requerer a cidadania automaticamente se tiverem nascido na Itália ou, em caso de nascimento no exterior, se um de seus pais for cidadão italiano e tiver morado no país europeu por pelo menos dois anos consecutivos. “Continuará sendo cidadão quem já tiver sido reconhecido como tal. Também serão processadas segundo as regras anteriores as solicitações de reconhecimento da cidadania documentadas e apresentadas até 23h59 (horário de Roma) de 27 de março de 2025”, ressalta a nota do governo.   

Um decreto-lei equivale a uma medida provisória brasileira, ou seja, entra em vigor em caráter imediato, mas precisa ser aprovado pelo Parlamento em até 60 dias para se tornar definitivo. O governo Meloni tem maioria confortável tanto na Câmara quanto no Senado.   

Projetos de lei – O pacote do Conselho dos Ministros também inclui um projeto de lei com uma reforma mais ampla das regras de cidadania. Neste caso, as medidas só entrarão em vigor depois da aprovação pelo Parlamento.   

O texto, segundo o governo, “introduz o princípio internacional da ligação efetiva entre a pessoa e o Estado, que permite a aquisição da cidadania apenas na presença de um vínculo efetivo com o país que a confere”. A proposta combate o fenômeno dos indivíduos que buscam o passaporte italiano para ter portas abertas na União Europeia e acesso facilitado nos Estados Unidos.   

“Não é que somos contrários a dar a cidadania italiana pelo jus sanguinis, mas deve ser uma verdadeira solicitação para fazer parte da comunidade nacional de nosso país, não deve ser um instrumento para viajar a Miami com o passaporte europeu”, salientou Tajani.   

Segundo o comunicado do Palácio Chigi, “tal ligação é considerada efetiva na presença do requisito da ‘residência qualificada’ na Itália, caracterizada por um período de tempo suficientemente longo (igual a pelo menos dois anos seguidos)”.   

Na prática, o projeto de lei sistematiza as medidas contidas no decreto-lei sobre cidadania, por meio da “conciliação de uma dupla exigência: a manutenção de laços com a Itália e o encorajamento da imigração de retorno dos descendentes; e a afirmação da exigência de que a aquisição e manutenção da cidadania italiana sejam ancoradas em vínculos efetivos com a República e seu território”.   

Além disso, o projeto põe como requisito que a certidão de nascimento de ítalo-descendentes nascidos no exterior seja registrada antes do 25º aniversário; do contrário, a pessoa perderá o direito à cidadania, assim como aquelas que, reconhecidas cidadãs após a entrada em vigor da lei e residentes no exterior, não exercerem seus direitos e deveres com a Itália por mais de 25 anos. Isso inclui atividades como participação em eleições e atualizações de estado civil.   

Para aqueles que tiverem apenas um avô italiano, será possível se tornar cidadão somente depois de residir na Itália por três anos, caso o projeto de lei seja aprovado. Já os cônjuges de cidadãos italianos casados no exterior continuarão tendo a possibilidade da naturalização, mas desde que morem no país europeu. Por fim, o projeto fixa em 48 meses o prazo para reconhecimento da cidadania.   

Outro projeto de lei retira dos consulados a tarefa de analisar os pedidos, encargo que será transferido a um novo escritório especial centralizado no Ministério das Relações Exteriores, com um período de transição de cerca de um ano.   

Consulados italianos no Brasil inclusive já anunciaram a suspensão dos agendamentos para apresentação da documentação de “cidadania jus sanguinis” e da marcação de novas datas, bem como da inscrição nas listas de espera. (ANSA).   

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