Alerj pagou R$ 23,5 milhões, sem transparência, a fundação que era canil falido e tem contratos com secretarias estaduais investigados


De quebrada a gestora de verbas milionárias em poucos anos, a Fundação São Francisco de Assis já recebeu R$ 94 milhões do estado, como mostra série de reportagens do RJ2. Alerj pagou R$ 23,5 milhões, sem transparência, a fundação que tem contratos com secretarias estaduais investigados
A Fundação São Francisco de Assis – que como o RJ2 tem mostrado passou em poucos anos de um canil falido a gestora de contratos milionários com o estado – recebeu R$ 23,5 milhões da Assembleia Legislativa. Tudo sem licitação, sem transparência, sem prazo e nem escopo de trabalho.
A verba é para o desenvolvimento de um centro de pesquisa e documentação legislativa (CPDOC-Alerj), sobre o qual não há nenhuma informação disponível no site da Alerj.
O RJ2 teve acesso a informações que mostram os pagamentos, feitos em três parcelas: dezembro de 2023, setembro do ano passado e fevereiro deste ano. Os pagamentos constam em um banco de dados estadual e fazem referência a um convênio. No site da Alerj, o convênio foi omitido.
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Festa
Belo cantou na festa de fim de ano da Alerj de 2024
Reprodução
A relação da Alerj com a fundação passa por uma festa, chamada por quem trabalha na Assembleia há décadas como a “melhor confraternização de fim de ano de todos os tempos”.
O evento foi em dezembro de 2024, teve comida e bebida liberadas e pagode ao som de Belo. Cada um dos 70 deputados tinha direito a dois convidados, sem contar os funcionários da assembleia. Tudo de graça.
Quer dizer, pagar, alguém pagou. Só não se sabe quem nem quanto. Só onde: o salão de festas do Campo Olímpico de Golfe, na Barra da Tijuca.
No site da Alerj, não há nenhuma informação sobre os gastos com aluguel do espaço, bufê, nem com os shows.
O RJ2 descobriu que a Alerj e o anfitrião da festa são parceiros de negócios. Quem comanda o local também controla a fundação que está recebendo milhões por serviços sem transparência: Carlos Favoreto.
O empresário é presidente do Campo de Golfe Olímpico e também presidente do Conselho Deliberativo da Fundação São Francisco de Assis.
Campo de Golfe Olímpico, na Barra da Tijuca
Reprodução/TV Globo
No governo estadual, a fundação administra o Fundo da Mata Atlântica, que reúne dinheiro pago por empresas que causam danos ao meio ambiente. Só no ano passado, a movimentação foi de R$ 400 milhões.
O contrato para gerir o fundo foi obtido graças a um atestado de capacidade técnica assinado por Carlos Favoreto. O empresário dizia que a fundação estava apta a realizar os serviços por ter dado consultoria ambiental a uma outra empresa dele mesmo, durante a concessão do Campo Olímpico de Golfe. Só que, na época do suposto serviço, em 2018, a fundação era um canil que estava fechado.
R$ 94 milhões do estado
A fundação que cuidava de cachorrinhos carentes se tornou uma máquina de contratos públicos. Um levantamento do RJ2 mostra que, desde 2021, já recebeu mais de R$ 94 milhões do estado.
Os clientes são:
empresa de pesquisa agropecuária do estado
Departamento de Estradas de Rodagem
Secretaria de Desenvolvimento Econômico e
Secretaria de Transportes
Instituto Estadual do Ambiente (Inea)
Assembleia Legislativa
Depois das reportagens, as pastas estaduais que têm contratos com a fundação de Favoreto começaram a agir.
A Secretaria do Ambiente e a Secretaria de Desenvolvimento Econômico abriram sindicâncias para apurar as possíveis irregularidades.
O Ministério Público (MPRJ) informou que está analisando as denúncias, e o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) disse que também está examinando as contratações.
O que dizem os citados
A Alerj disse que o evento de fim de ano foi uma confraternização privada de alguns deputados, assessores e diretores, que fizeram um rateio para pagar o evento.
O RJ2 ouviu deputados e chefes de gabinete – que preferiram não se identificar – que garantiram que não pagaram nada para participar da festa.
Sobre os pagamentos à Fundação São Francisco de Assis, a Alerj declarou que há um convênio celebrado com a UFRJ, que indicou as fundações de apoio e que o trabalho é uma das entregas comemorativas pelos 100 anos do Palácio Tiradentes. A Alerj disse que os serviços estão sendo feitos regularmente e que as prestações de contas foram apresentadas, conforme previsão no programa.
Não há, no entanto, nada publicado em Diário Oficial ou na internet.
O RJ2 pediu à Alerj e à UFRJ o convênio, mas não recebeu.
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