Em decisão anunciada na madrugada deste sábado, 19, a Suprema Corte dos EUA determinou a proibição temporária de que o governo do presidente Donald Trump deporte imigrantes ilegais venezuelanos para uma prisão salvadorenha utilizando a chamada Lei de Inimigos Estrangeiros, de 1798, que só havia sido usada em tempos de guerra.
“O governo está instruído a não remover nenhum membro da suposta classe de detidos dos Estados Unidos até nova ordem deste tribunal”, diz a determinação da Suprema Corte.
Dois dos nove juízes, os conservadores do Clarence Thomas e Samuel Alito, discordaram da decisão.
A decisão foi tomada em resposta a uma apelação de emergência apresentada por advogados de direitos humanos que buscam suspender a deportação de imigrantes atualmente detidos em uma instalação no estado do Texas, no sul dos EUA.
Em seu recurso, apresentado na noite de sexta-feira em vários tribunais, a União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) argumentou que os venezuelanos detidos no Texas haviam sido informados de que eram “iminentemente removíveis”.
Alguns dos detidos já estavam a bordo de ônibus para serem transferidos para aeroportos, o que explica a rapidez com que o recurso foi apresentado.
Para executar as expulsões, Trump invocou a Lei de Inimigos Estrangeiros para prender supostos membros da gangue venezuelana Tren de Aragua e deportá-los para uma prisão de segurança máxima em El Salvador.
Até agora, a lei só havia sido usada durante a Guerra de 1812 contra o Império Britânico e suas colônias canadenses e nas duas Guerras Mundiais.
“Pessoas más”
Nesta sexta-feira, Trump disse a repórteres não ter conhecimento dessas planejadas novas deportações especificamente, mas que se houvesse “pessoas más”, ele autorizaria as expulsões. “Foi por isso que fui eleito. Os juízes não foram eleitos”, observou ele.
Advogados de vários venezuelanos deportados anteriormente insistem que seus clientes não eram membros do Tren de Aragua e sustentam que eles não cometeram crimes e foram amplamente visados na campanha por causa das tatuagens em seus corpos.
A Suprema Corte já havia emitido uma decisão na semana passada permitindo que as deportações continuem para uma megaprisão em El Salvador, mas somente se aqueles ameaçados de deportação sob esta lei do século 18 tivessem direito a “um prazo razoável” para contestar sua expulsão judicialmente.
A ACLU declarou em seu apelo na sexta-feira que os migrantes detidos no Texas corriam o risco de “serem removidos dos Estados Unidos sem aviso prévio ou oportunidade de serem ouvidos”.
“Estamos profundamente aliviados pelo fato de o tribunal ter bloqueado temporariamente as expulsões. Estes indivíduos corriam o risco iminente de passar o resto das suas vidas numa prisão salvadorenha brutal, sem nunca terem tido um processo justo”, afirmou o advogado da ACLU, Lee Gelernt, citado pela agência de notícias Associated Press (AP).
Na sexta-feira, dois juízes federais recusaram-se a intervir enquanto os advogados dos detidos tomavam as iniciativas legais urgentes para impedir a deportação.
A ACLU havia já interposto outros recursos para bloquear a deportação de dois venezuelanos detidos nas instalações de Bluebonnet, apelando a uma decisão da Justiça americana que impedisse as remoções de quaisquer imigrantes na região ao abrigo da Lei de Inimigos Estrangeiros.
Na sequência de uma decisão unânime do Supremo Tribunal, em 9 de abril, os juízes federais do Colorado, de Nova Iorque e do sul do Texas emitiram prontamente ordens que impedem a expulsão de detidos ao abrigo da Lei de Inimigos Estrangeiros, até que a administração federal providencie um processo e apresente queixa em tribunal.
Acordo com Bukele
O governo dos Estados Unidos chegou a um acordo com o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, para enviar os imigrantes detidos nos Estados Unidos para o Centro de Confinamento de Terroristas (Cecot), uma prisão de segurança máxima que tem sido objeto de alegações de abusos dos direitos humanos.
Como parte do acordo, cujos pormenores específicos não são conhecidos, Washington pagará a El Salvador seis milhões de dólares por ano para apoiar o sistema prisional do país centro-americano.
No total, os Estados Unidos enviaram mais de 200 imigrantes, na sua maioria venezuelanos, para esta prisão, acusando-os de pertencerem ao Tren de Aragua.
De acordo com uma análise publicada na semana passada pela Bloomberg, 90% dos mais de 200 homens que os Estados Unidos prenderam em El Salvador não têm registo criminal em solo americano.
Caso Kilmar Garcia
Na semana passada, a Suprema Corte ordenou que o governo Trump “facilite” o retorno do migrante salvadorenho Kilmar Ábrego Garcia, injustamente expulso em março e preso em uma prisão salvadorenha sob exatamente a mesma lei.
Nesta quinta-feira, ele recebeu a visita do senador americano Chris Van Hollen. Inicialmente, o político democrata teve acesso negado para visitar a famosa prisão de segurança máxima em El Salvador para onde Ábrego Garcia foi enviado com mais 200 outras pessoas.
Mas, na noite de quinta-feira, Van Hollen compartilhou uma foto de um encontro de ambos na plataforma de mídia social X, ocorrido em um hotel em San Salvador. “Eu disse que meu principal objetivo dessa viagem (a El Salvador) era me encontrar com Kilmar. Esta noite eu tive essa chance”, escreveu o senador de Maryland.