São Paulo, 22 – O Grupo Safras protocolou, na quinta-feira passada, 17, a entrega da documentação complementar exigida pela juíza Giovana Pasqual de Mello para que seja analisado o processamento de seu pedido de recuperação judicial. O conglomerado havia solicitado a proteção judicial no dia 4 de abril, e recebeu prazo de 15 dias para corrigir e complementar a petição inicial com 61 documentos. A manifestação, entregue antes do fim do prazo legal, inclui também a retificação do valor da dívida para R$ 1,78 bilhão, após a exclusão de R$ 420,6 milhões em créditos extraconcursais.
O pedido abrange 40 empresas e produtores rurais organizados em dois blocos econômicos: o “Núcleo Safras”, liderado por Pedro de Moraes Filho, e o “Núcleo Rossato”, encabeçado por Dilceu Rossato, ex-prefeito de Sorriso (MT). A lista inclui companhias como Safras Armazéns Gerais, Safras Agroindústria, D&P Participações, Rossato Participações e produtores rurais ligados aos dois grupos familiares. A defesa é conduzida pelos advogados Elias Mubarak Junior e Daniel Carnio Costa.
Na nova petição, os advogados entregaram balanços patrimoniais individualizados, certidões criminais e falimentares, demonstrações financeiras, projeções de fluxo de caixa e a relação completa dos credores sujeitos à recuperação. A lista foi apresentada em duas versões: uma pública e outra sob sigilo, para preservar informações pessoais de produtores e empresas familiares. O grupo também reiterou os pedidos de consolidação processual dos devedores, antecipação dos efeitos do stay period (suspensão de cobranças e execuções por 180 dias) e declaração de essencialidade da planta industrial de Cuiabá (MT) e de 14 armazéns com capacidade total superior a 700 mil toneladas.
A entrega da documentação marca o fim da fase de regularização da petição inicial, condição necessária para que o juízo analise o pedido de processamento. Caso aceito, a recuperação judicial será oficialmente iniciada, e o grupo terá prazo para apresentar seu plano de reestruturação aos credores.
A petição também explica que três das requerentes – D&P Participações, Rossato Participações e Agro Rossato – foram constituídas há menos de dois anos, período mínimo exigido pela Lei de Recuperação Judicial. Os advogados alegam, no entanto, que essas empresas integram há décadas o grupo econômico familiar e que há jurisprudência consolidada nos tribunais superiores permitindo a flexibilização dessa exigência em casos similares.
O Banco do Brasil aparece como principal credor bancário, com valor total de R$ 303,6 milhões, considerando diferentes empresas e classes de crédito. Apenas na Safras Armazéns Gerais, o banco soma R$ 116,8 milhões em créditos com garantia real (Classe II) e R$ 83,2 milhões em créditos quirografários (Classe III).
O Bravano Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) concentra a maior dívida extraconcursal do Grupo Safras, no valor de R$ 284,1 milhões, conforme informado na petição inicial. O fundo, que não está sujeito à recuperação judicial, é gerido pela Flowinvest, especializada em crédito estruturado e securitização. A própria gestora também aparece como credora direta do grupo com R$ 98,8 milhões em valores sujeitos à RJ.
Entre os demais credores estão Sicoob Credisul (R$ 92,7 milhões), Caixa Econômica Federal (R$ 69,6 milhões), Banco Bradesco (R$ 43,3 milhões) e Oliveira Trust (R$ 92,4 milhões). A relação contempla ainda fornecedores, cooperativas e dezenas de produtores rurais com créditos relacionados a operações de armazenagem, aquisição de grãos e contratos de prestação de serviços.
A crise do grupo, conforme narrado na petição inicial, se intensificou em 2023, com a queda de até 62% nos preços da soja. Segundo os advogados, apenas 40% da produção daquele ano foi comercializada, gerando represamento de estoques e comprometimento do fluxo de caixa. A aquisição da paranaense Copagri (hoje Safras Agroindústria), que envolveu a absorção de passivos superiores a R$ 500 milhões, e os investimentos em uma usina de etanol de milho e uma esmagadora de soja, ambos sem estrutura de project finance, agravaram a situação financeira.
A petição também informa que parte dos produtores do Núcleo Rossato apresentou projeções de fluxo de caixa zeradas por já estarem concentrando operações agrícolas na produtora Caroline Randon Rossato Morais, com gestão conjunta via parceria agrícola. O grupo também relatou dificuldades em obter certidões fiscais de algumas prefeituras, que condicionaram a emissão à regularização de débitos, motivo pelo qual foi solicitado ao juízo o envio de ofícios para obtenção desses documentos.
De acordo com reportagem publicada pelo Agfeed no fim da última semana, o grupo já trabalha em um plano de recuperação que pode envolver a retomada das operações de armazenagem na safrinha de milho, a venda da usina de etanol em Sorriso (MT) e ajustes no modelo de negócios da agroindústria em Cuiabá, que atualmente opera sob contrato com a Engelhart, trading ligada ao BTG Pactual.
O pedido de recuperação judicial provocou o vencimento antecipado de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) lastreados em dívidas da antiga Copagri. Os papéis estão presentes nas carteiras de dois Fiagros listados na B3: o Vectis Datagro (VCRA11), com exposição de 3,5% do patrimônio, e o Itaú Asset Rural Fiagro (RURA11), com 0,7%.