A Câmara dos Deputados gastou R$ 1,5 milhão com o ex-deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) e seus assessores durante o período em que o parlamentar esteve preso na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS). Os dados foram apurados pela IstoÉ junto ao Portal da Transparência da Casa, mas o valor pode aumentar no próximo mês, quando o ex-deputado e seus assessores devem receber os vencimentos pela última vez.
Cassado na quinta-feira, 24, Brazão está preso desde março de 2024, acusado de ser um dos mandantes da morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Ele segue em prisão domiciliar após a autorização do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por razões de saúde.
De acordo com o levantamento, Chiquinho Brazão recebeu R$ 116.441,51 em salários de abril do ano passado até março deste ano. No ano passado, cada deputado recebia, em média, R$ 28,7 mil por mês líquido, ou seja, já considerando os descontos. Em abril de 2024, Brazão recebeu R$ 24 mil, sofrendo com o desconto pela ausência de uma semana nas sessões obrigatórias.
Preso em Campo Grande e sem comparecer às sessões, Brazão continuou recebendo salário da Câmara dos Deputados. De maio até novembro do ano passado, o parlamentar recebia R$ 7.949,85 por mês. O valor, muito abaixo do salário real de um deputado (R$ 44 mil), foi reduzido devido às punições pelas faltas nas sessões.
Em dezembro de 2024, o agora ex-deputado recebeu R$ 4.645,38, fora os R$ 9,6 mil recebidos em junho do ano passado como adiantamento da gratificação natalina.
No começo deste ano, o pagamento para Brazão subiu para R$ 7.991,82 em janeiro e R$ 8.321,09 em março. O valor destoa apenas em fevereiro (referente ao salário de janeiro – época de recesso parlamentar), quando R$ 30.197,41 caíram na conta de Chiquinho.
A Mesa Diretora da Câmara dos Deputados cassou o mandato de Chiquinho Brazão na quinta-feira sob a justificativa de ausência em sessões ordinárias. De acordo com a Constituição, um parlamentar pode ser cassado caso falte em um terço das sessões plenárias.
No caso de Brazão, foram ao menos 100 faltas registradas no sistema da Câmara dos Deputados. No seu período preso, o parlamentar não chegou a pedir o afastamento. A cassação do mandato pela Mesa não deixa o carioca inelegível.
A decisão pela cassação de Chiquinho Brazão tem sido interpretada internamente como uma manobra da Câmara para evitar o andamento do processo de cassação no plenário. Isso porque, mesmo afastado, Brazão tem uma base sólida de aliados no Salão Verde que querem evitar sua inelegibilidade.
Manutenção do gabinete
Além dos salários de Chiquinho Brazão, a Câmara sustentou por um ano os salários de assessores ligados ao ex-parlamentar. Ao todo, 24 secretários parlamentares tiveram seus salários pagos integralmente pela Casa entre abril de 2024 e março deste ano, com salários que variam de R$ 1,6 mil e R$ 36 mil.
Por mês, os 513 deputados recebem R$ 125.478,69 extras para bancar seus assessores mensalmente, seja funcionários em Brasília ou em suas bases eleitorais. Entre abril e novembro de 2024, a Câmara pagou R$ 994.275,27 de cota parlamentar para sustentar os assessores de Brazão.
Entre janeiro e março deste ano, a Câmara gastou R$ 445.740,22 com os salários dos servidores lotados no gabinete do carioca. A média da cota parlamentar por mês é de R$ 148,5 mil.
Preso, mas ativo
Quando ainda era deputado, Chiquinho Brazão indicou R$ 37,8 milhões de emendas parlamentares na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024. Desse total, R$ 21,2 milhões foram pagos pelo governo federal.
A maior emenda foi paga para o estado do Rio de Janeiro, no valor de R$ 10.371.585,00, para o investimentos em saúde e ambulatorial para o cumprimento de metas no setor. A menor emenda destinada foi R$ 200 mil para fomento à cultura.
Além da indicação de emendas, Brazão assinou 20 requerimentos de deputados. A maioria deles é de registro ou criação de Frentes Parlamentares. O último documento assinado por Brazão foi no dia 18 de março, referente à Frente Parlamentar da Baixada Fluminense.
Além dos requerimentos de colegas, o ex-parlamentar chegou a assinar a tramitação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê condições especiais de trabalho do motorista profissional empregado no transporte rodoviário de cargas e de passageiros. O último documento protocolado por ele foi o recurso do pedido de cassação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
A IstoÉ entrou em contato com a assessoria de imprensa da Câmara dos Deputados para saber o motivo da não interrupção dos gastos, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto. A reportagem também tenta localizar a defesa e os ex-assessores de Brazão.
Brazão em prisão domiciliar
João Francisco Inácio Brazão foi preso em 23 de maio de 2024, após uma operação da Polícia Federal para prender os mandantes da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes. Além dele, seu irmão, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão, e o ex-chefe da Polícia Civil do estado Rivaldo Barbosa, também foram presos. Todos negam o envolvimento no crime.
O trio foi apontado como mandante da morte de Marielle na delação de Ronnie Lessa, condenado por ser o responsável por atirar na vereadora carioca. Lessa foi condenado a 78 anos de prisão, enquanto seu comparsa, Élcio de Queiroz, foi condenado a 59 anos de reclusão.
No começo do mês, Brazão deixou a Penitenciária de Campo Grande (MS) e aguarda o julgamento em regime domiciliar. O benefício foi concedido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que atendeu a um pedido da defesa, que justifica razões humanitárias devido ao estado crítico de saúde do ex-parlamentar.
Mesmo em casa, Chiquinho Brazão é obrigado a manter o uso de tornozeleira eletrônica, não pode ter contato com outros investigados e nem acessar as redes sociais. Ele também é proibido de conceder entrevistas, salvo com autorização do STF.