Reconhecer anexação da Crimeia pode desestabilizar a ordem mundial, alertam especialistas

A pressão para que a Ucrânia reconheça a anexação da Crimeia pela Rússia pode desencadear consequências profundas para a ordem internacional estabelecida desde a Segunda Guerra Mundial, segundo especialistas em direito e relações internacionais citados pelo jornal The Moscow Times. A discussão ganhou força após o Kremlin afirmar nesta semana que considerar a península parte do país é “imperativo” para a resolução do conflito.

O tema ganhou ainda mais destaque depois que o presidente dos EUA, Donald Trump, sugeriu no domingo (27) que o homólogo Volodymyr Zelensky poderia aceitar a perda da Crimeia como parte de um acordo de paz, proposta que o líder ucraniano rejeitou reiteradamente. Para estudiosos, ceder a península significaria romper uma regra essencial do pós-guerra: a proibição da mudança de fronteiras pela força.

“O recado que isso envia é o de que pode valer a pena, pelo menos para as grandes potências, violar essa proibição do uso da força”, alertou Lauri Malksoo, professor de direito internacional da Universidade de Tartu, na Estônia.

Vista de Sebastopol, principal cidade da Crimeia, região na Ucrânia anexada pelos russos em 2014 (Foto: Elen Wolf/Pixabay)

O contexto histórico reforça a gravidade do risco. “Não houve nenhum caso de um país expandir seu território militarmente à custa de outro nos últimos 80 anos”, lembrou Phillips O’Brien, professor de estudos estratégicos da Universidade de St. Andrews. A Crimeia foi tomada pela Rússia em 2014, e Moscou ainda reivindica outras quatro regiões ucranianas, embora não tenha pleno controle sobre elas.

Especialistas apontam que obrigar a Ucrânia a reconhecer a soberania russa sobre a Crimeia seria “um retorno ao direito da conquista”, nas palavras de Elie Tenenbaum, do Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI). Para Michel Erpelding, do Instituto Max Planck, na Alemanha, o precedente seria perigoso: poderia gerar “consequências extremamente desestabilizadoras, até mesmo catastróficas para a paz mundial”.

O debate também envolve a validade jurídica de um possível acordo. “Em princípio, pelo menos, tratados produzidos através de coerção são nulos”, explicou Malksoo, alertando que a Ucrânia poderia contestar qualquer assinatura feita sob pressão. Segundo Erpelding, “a Ucrânia poderia usar esse argumento para contestar a validade de qualquer acordo que possa ter sido pressionada a assinar”.

A Casa Branca ainda não detalhou seu plano de paz, mas já indicou que poderia congelar as linhas de frente do conflito, entregando à Rússia as áreas ocupadas desde a invasão iniciada em fevereiro de 2022. Para O’Brien, permitir a cessão da Crimeia abriria caminho para novas ofensivas: “É a ponta do iceberg no plano russo para acabar com a Ucrânia”, afirmou.

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