‘Sufocada e sem ar’: a crise de ansiedade de Juliette em show de Lady Gaga

A cantora Juliette Freire, de 35 anos, enfrentou uma crise de ansiedade durante o show de Lady Gaga, que aconteceu no último sábado, dia 3, na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. A campeã do BBB 21 explicou que começou a sentir falta de ar e uma sensação de sufocamento no evento, que reuniu mais de dois milhões de pessoas.

“Já tive algumas vezes, antes e depois do BBB. Eu fico sufocada e vai faltando ar. Quando entendi que estava tendo isso, fiquei mais desesperada ainda porque percebi que estava em público. Fiquei: ‘Meu Deus, o que eu vou fazer?’ Não tinha para onde sair, fui para uma paredezinha”, relatou em suas redes sociais.

Em meio ao mal-estar, uma pessoa chegou a filmá-la. Ao perceber, Juliette pediu que o vídeo não fosse divulgado. “Estava chorando, tentando respirar e me acalmar em um lugar mais distante, e uma moça filmou. Eu disse: ‘Moça, por favor, estou passando mal, não posta isso, não’. Ela apagou e pronto. A galera do evento estava comigo, me acalmando. Tomei uma água e fiquei bem. Mas a moça me filmou de longe, já recuperada. Depois fui aproveitar”, contou.

“Isso é uma coisa que tenho há muito tempo. Já levo para a terapia há muito tempo. Não é constante, mas tenho. Não consigo fazer sauna, não consigo dormir de brinco e colar… Se eu estiver em um lugar, sempre procuro uma porta e uma saída. Preciso ter a sensação de que posso sair”, revelou.

A crise de ansiedade de Juliette

A reportagem da IstoÉ Gente conversou com o psicólogo Alexander Bez, especialista em ansiedade e síndrome do pânico pela Universidade da Califórnia, que analisou o quadro de Juliette. Leia na íntegra!

“Esse episódio da Juliette deixa muito claras as manifestações sintomáticas que ela apresenta. Ela mesma relata como essas manifestações acontecem e se expressam. Então, é algo bastante evidente — não é aquela situação em que precisamos refletir muito ou investigar profundamente para entender o que ela tem ou deixa de ter.

O que ela apresenta, nesse caso, é um episódio de transtorno de pânico. Muita gente ainda usa o termo “síndrome do pânico”, que eu também costumo usar, mas o mais correto é “transtorno de pânico com agorafobia”. Isso é muito importante de destacar. Então, eu colocaria isso entre aspas: esse é o diagnóstico dela ali, e está muito claro para mim.

A manifestação sintomática dela é ocasional, ou seja, sazonal. Não é algo 100% constante. Dá para perceber que ela está em shows, em outros ambientes, como uma sauna, e consegue lidar com isso em muitos momentos. Quando se tem pânico com agorafobia, é necessário um estímulo externo para provocar esse episódio. Esse estímulo é o gatilho que desencadeia a crise.

Uma pessoa com pânico e agorafobia, por exemplo, pode ter dificuldade de ir a um shopping center, andar de metrô ou de ônibus. Para frequentar um shopping, ele precisa ser extremamente aberto. O curioso — e aqui está a complexidade — é que a agorafobia ocorre justamente em espaços abertos. Essa é uma das diferenças importantes no diagnóstico.

Então, um dos diagnósticos diferenciais da agorafobia é justamente esse: ela se manifesta em lugares abertos, como shows, por exemplo.

Quanto à duração, o curso típico da crise de pânico gira em torno de 20 minutos. O problema está em como a pessoa reage durante esse período. São 20 minutos que podem parecer eternos e, em casos clássicos, esses episódios podem ocorrer de uma até cinco vezes por dia.

Não existem episódios de síndrome do pânico que durem mais do que isso — 20 minutos é o tempo do chamado “descarrego total” do corpo. O desafio é como a pessoa lida com isso e como consegue sair do episódio.

Ela mesma relata que esses episódios não são constantes, e isso é positivo. Ela tem essa consciência. O que ela precisa fazer, então, é se preparar melhor para situações como shows ou eventos, buscando estratégias para reduzir os impactos negativos dessas manifestações.

A síndrome do pânico é um transtorno de ansiedade. Por isso, ela fala de sintomas como ansiedade e palpitação. Em momentos de desespero, pode haver choro, mas o choro, especificamente, não é um sintoma típico da síndrome do pânico. Isso é importante destacar: o desespero faz parte, mas o choro é uma resposta mais individual — uma reação emocional dela, não necessariamente da síndrome.

É importante frisar: a síndrome do pânico é um transtorno de caráter neurótico, portanto, totalmente tratável. No entanto, o tratamento costuma ser demorado.

Atualmente, alguns autores norte-americanos já não falam mais em “cura total”. Alguns ainda usam esse termo, mas outros preferem falar em “manutenção permanente”. Isso significa que o tratamento exige um preparo contínuo: psicoterapia e medicação.

No caso do transtorno de pânico com agorafobia, a medicação padrão é o ansiolítico. Nos Estados Unidos, como ela deriva da ansiedade, o tratamento medicamentoso é o mesmo: ansiolíticos. Para algumas pessoas, inclusive, associa-se ansiolíticos com betabloqueadores e, em casos de pacientes com predisposição ou histórico cardiovascular, também são usados anti-hipertensivos para evitar picos de pressão.

Cito os EUA porque são uma referência importante nesse campo. Eles estão na vanguarda dos estudos e tratamentos, então é essencial estarmos atualizados com os conceitos, medicamentos e abordagens terapêuticas que vêm de lá.

Como a síndrome do pânico possui diferentes níveis e causas, é impossível prever um tempo exato para a melhora. Pode durar um, dois, três ou quatro anos — isso varia muito. Mas o que sabemos é que a psicoterapia é fundamental. É um processo longo, caro, infelizmente inacessível para todos, mas necessário.

A psicoterapia, por si só, não elimina os sintomas. Por isso, os medicamentos são fundamentais para controlar os sintomas e proteger o organismo — algo que não se discutia tanto há 10 ou 15 anos. Hoje, sabemos que os ataques de pânico afetam seriamente a pressão arterial, o sistema cardiovascular e provocam descargas intensas de hormônios como o cortisol e o glucagon, ligados ao estresse e à ansiedade.

No caso da Juliette, o episódio que ela teve foi, de fato, um episódio de pânico com agorafobia. Ou seja, uma manifestação intensa de pânico, com desespero, medo de não conseguir sair da situação, mesmo estando em local aberto.

E esse é o ponto: não é preciso estar em um lugar fechado para sentir isso. Um ambiente aberto, como um show ou até um shopping a céu aberto, já pode ser o bastante para desencadear a crise. E o pior é justamente essa sensação de que, mesmo ao ar livre, você não encontra uma saída. Até chegar à saída, o sofrimento é enorme.

Então é isso. O tratamento indicado envolve psicoterapia e as medicações que mencionei.”

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