
O desenvolvimento tecnológico permitiu um conhecimento mais detalhado não apenas da anatomia, mas também dos mecanismos causadores das doenças (fisiopatologia), e, com isso, o aprimoramento das técnicas operatórias. Pinças, tesouras, sistemas de energia (como os de tecnologia bipolar e ultrassônica), grampeadores, seladores de vasos sanguíneos, visão ampliada de alta definição e tridimensional, além da avaliação instantânea da perfusão sanguínea dos tecidos, possibilitaram o franco desenvolvimento da videolaparoscopia e, mais recentemente, da cirurgia robótica. Procedimentos que antes exigiam grandes incisões (cortes) agora podem, em grande parte das vezes, ser realizados com apenas 4 a 6 pequenas incisões de 0,5 a 1,0 cm.
Mas além do aspecto estético — de não deixar uma grande cicatriz no abdome —, as vantagens dos procedimentos minimamente invasivos incluem menor risco de infecção no sítio cirúrgico, menor taxa de sangramento, recuperação mais rápida, menor índice de hérnia incisional e taxas reduzidas de complicações cirúrgicas. Com maior precisão, o trauma cirúrgico é menor e o paciente tende a se recuperar com mais agilidade. Isso se traduz em retorno precoce à rotina, ao trabalho, à atividade física, à convivência familiar e, eventualmente, mais rapidez para iniciar etapas complementares de tratamentos complexos, como a quimioterapia.
Mesmo no tratamento do câncer, que muitas vezes exige abordagens agressivas com ressecções extensas de órgãos, os procedimentos minimamente invasivos têm ganhado cada vez mais espaço — graças ao alto nível de detalhamento e destreza alcançados, com resultados semelhantes ou até superiores aos da cirurgia aberta, tradicionalmente considerada o “padrão-ouro” em muitas situações.
A plataforma robótica chegou ao Brasil em 2008. Atualmente, estamos na quarta geração da tecnologia (a quinta geração foi lançada nos Estados Unidos em 2024), e ela tem ganhado popularidade especialmente nos últimos cinco anos. Trata-se de um equipamento que auxilia o especialista na realização de procedimentos minimamente invasivos. O sistema é composto por um console — onde o cirurgião atua à distância, sentado, de forma ergonomicamente favorável —, imerso em uma tela 3D de altíssima definição que reproduz a imagem do interior do corpo do paciente. A partir desse console, o cirurgião controla os braços robóticos que executam, com delicadeza e precisão, todos os seus movimentos.
Robô não opera sozinho: tudo é comandado pelo cirurgião
Os braços do robô — equipados com instrumentos cirúrgicos e a câmera — são conectados ao paciente. Não há qualquer movimentação involuntária: todos os comandos são executados exclusivamente pelo especialista, o que aumenta a segurança do procedimento. A quinta geração da tecnologia promete ainda mais avanços, incluindo sensibilidade tátil, realidade aumentada e inteligência artificial integrada.
Na cirurgia digestiva, o uso da robótica tem se mostrado especialmente eficaz em regiões anatômicas de difícil acesso, como a transição esofagogástrica e a pelve. Mas, a cada dia, surgem evidências de que sua aplicação pode ser expandida para praticamente qualquer cirurgia abdominal — de hérnias e diástases abdominais (como no caso da influenciadora Virgínia Fonseca), até cirurgias colorretais, hepáticas e pancreáticas, inclusive no tratamento de tumores como os enfrentados por Tony Bellotto e Preta Gil.
A cirurgia robótica já está redefinindo os paradigmas dos procedimentos cirúrgicos. Assim como ocorreu na transição da cirurgia aberta para a videolaparoscopia, a incorporação dessa nova tecnologia exige tempo e adaptação. Menor sangramento, abordagem anatômica precisa, instrumentos ultradelicados — com destreza comparável à da mão humana —, menos complicações e recuperação acelerada para o paciente são apenas algumas das vantagens já comprovadas.
O futuro da cirurgia já começou, mas ainda é pouco acessível
A maior limitação para a adoção ampla da cirurgia robótica ainda é o custo. No Brasil, cerca de 90 hospitais possuem o robô, com aproximadamente 150 plataformas instaladas — a maioria concentrada na cidade de São Paulo. O investimento necessário pode ultrapassar sete dígitos, e a cobertura pelos planos de saúde ainda é limitada. No entanto, espera-se que os custos diminuam nos próximos anos, com o fim de patentes, surgimento de novas marcas e tecnologias concorrentes, e consequente maior acessibilidade para a população.
Dr. Ricardo Vitor Silva de Almeida – CRM-SP 131016 – RQE 38117 / RQE 32427
Cirurgião do Aparelho Digestivo