
Onça capturada no local segue em tratamento no Centro de Reabilitação de Animais Silvestres em Campo Grande (MS) e polícia ainda aguarda resultados de outros exames para encerrar o caso Jorge Avalo e a onça macho capturada, no Pantanal de MS
Reprodução
Laudo necroscópico, elaborado pelo Núcleo Regional de Medicina Legal de Aquidauana, concluiu que o caseiro Jorge Avalo, de 60 anos, morreu devido a mordida de onça-pintada na cabeça. O laudo foi emitido na sexta-feira (9), mas divulgado no começo desta semana pela polícia.
A morte de Jorge aconteceu após ataque de uma onça às margens do rio Miranda, no Pantanal de Aquidauana (MS), no dia 21 de abril (segunda-feira).
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Consta no laudo, ao qual o g1 teve acesso, que a morte foi causada por ‘choque neurogênico agudo decorrente de ação perfuro-lacero-contundente no segmento cefálico, provocada por ataque de animal carnívoro de grande porte, identificado como onça-pintada’.
Na descrição do laudo informa as circunstâncias da morte, como por exemplo, havia indícios de arrasto e vestígios de sangue e tecidos no pesqueiro, o corpo apresentava sinais de que a vítima estava viva no momento da abordagem, com lesões vitais nos membros e quadril.
Já sobre as lesões, o laudo informa ausência do segmento cefálico, pescoço, cintura escapular, membro superior esquerdo e parte do tórax, diversas lesões perfuro-lacero-contundentes e equimoses, condizentes com mordedura e arrasto por animal.
Vítima foi identificada como Jorge Avalo, de 60 anos.
Redes sociais/Reprodução
Além de vestígios de ação de predação posterior à morte (órgãos internos e grandes massas musculares ausentes), lesões em membro superior direito indicam reação defensiva (reações vitais), sugerindo que o ataque começou com a vítima ainda consciente.
Ainda conforme o laudo, as lesões não demonstram indícios de violência humana.
Por fim, o laudo confirma que a causa da morte foi choque neurogênico por trauma no crânio, compatível com técnica predatória descrita para a onça-pintada, que morde diretamente o osso temporal, atingindo o cérebro.
Outros laudos
Onça capturada segue em tratamento em Campo Grande
Saul Schramm/ Governo de MS
O delegado Regional de Aquidauana, Amylcar Eduardo Paracatu, disse ao g1 que ainda faltam laudos para concluir o caso.
“Vamos aguardar os laudos de local e de perfil genético, não havendo indícios de ação humana será concluído para arquivamento pelo judiciário”, informou.
Conforme o delegado, o laudo de local são as impressões da dinâmica nos locais onde foi a ação, já o de perfil genético é para confirmar que os vestígios encontrados durante todo o local pertencem somente à vítima, ambos ainda sem prazo definido, mas devem ser entregues logo mais.
Amylcar ainda explicou que foi solicitado exames nas fezes da onça, quando foram encontrados ossos e cabelos, que não há confirmação se são de humanos.
“Ainda não há resultado do exame das fezes. Não podemos afirmar que se trata de vestígios humanos sem laudos”, explica.
O Governo do Estado de Mato Grosso do Sul divulgou o último boletim sobre o estado de saúde da onça no início deste mês (6), onde consta que ela está estável. “Ativo, principalmente no período noturno – comum para a espécie – e se alimentando adequadamente, o animal está alerta e consciente”, diz o boletim.
Até o momento não foram repassadas novas informações sobre a onça que segue em tratamento no Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (Cras) em Campo Grande (MS).
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Entenda o caso
Imagens mostram a presença de onças no local onde Jorge foi atacado
Jorge trabalhava como caseiro em um pesqueiro há 16 anos. Ele estava acostumado com a presença de onças na região. Familiares contaram ao g1 que o homem era uma pessoa alegre, sorridente e bastante sistemático.
Ainda conforme os familiares, Jorge já havia saído do pesqueiro uma vez, mas que o patrão ligou pedindo para que voltasse pois ninguém conseguia permanecer na região.
Jorge desapareceu na manhã de segunda-feira. A Polícia Militar Ambiental (PMA) confirmou a morte do caseiro após encontrar pegadas do felino junto a partes do corpo do homem.
No dia seguinte, outras partes do corpo foram encontradas pelas equipes de busca, em uma toca do felino localizada em uma mata fechada, a cerca de 300 metros do local do ataque. Helicópteros e drones foram utilizados durante a operação pelo local do ataque, que é de difícil acesso. Além dos policiais, familiares da vítima ajudaram nas buscas pelo corpo.
O corpo de Jorge foi recolhido pela equipe da PMA e encaminhado para perícia técnica no Núcleo Regional de Medicina Legal de Aquidauana.
É comum o ataque de onças?
Especialistas em conservação ouvidos pelo g1 afirmam que o ataque do felino a seres humanos é raríssimo.
O biólogo da ONG SOS Pantanal, Gustavo Figueroa, esclarece que as onças tendem a fugir dos seres humanos. O especialista, que trabalha há mais de 10 anos no bioma, usou as redes sociais para reforçar a importância de não transformar o episódio em motivo de caça ou retaliação contra a espécie.
“É importante destacar que as onças não são vilões, o que aconteceu é muito raro, e por isso não podemos demonizar ou achar que todas elas irão fazer isso com os humanos. Temos pouquíssimos registros de ataques de onças pintadas no Pantanal”.
A prática de ceva, discussão levantada após o caso, é apontada como “comum” na região em que o caseiro foi encontrado morto. Especialistas afirmam que a ação coloca em risco todo o ecossistema.
Fernando Tortato, biólogo e coordenador da ONG Panthera, especialista em conservação de felinos no Brasil, alerta que a prática da ceva pode aumentar o risco de ataques, ao fazer com que animais silvestres percam o medo natural do ser humano e passem a associá-lo à oferta de alimento — comportamento que pode ter causado o ataque ao pantaneiro.
“Ao condicionar o animal à presença humana, ele perde esse medo natural que uma onça tem do ser humano, e isso não deve ser encarado como normal. E o pior dessa questão da ceva é que ela passa a associar o ser humano com alimento. Então, além de você condicionar o animal a ficar transitando ambientes do homem de maneira tranquila, ele também condiciona com a alimentação”.
Captura do animal
Onça-pintada é capturada em pesqueiro onde homem foi atacado e morto
Três dias após o ataque uma onça-pintada macho, de 94 quilos, que rondava o pesqueiro onde Jorge foi atacado foi capturada pela Polícia Militar Ambiental. O animal foi encaminhado para o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (Cras) de Campo Grande.
As buscas pelo animal foram determinadas pelo governo de Mato Grosso do Sul. Todo o processo foi monitorado pela PMA e contou com o apoio de 10 policiais.
A equipe utilizou mais de dez armadilhas ao redor do pesqueiro a fim de capturar o felino.
Biólogo responde perguntas sobre captura de onça ao g1
O pesquisador e especialista em manejo de onças-pintadas da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Gediendson Ribeiro de Araújo, acompanhou a operação.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) informou que o animal não deve ser reintroduzida à natureza.
Os primeiros exames mostraram que a onça estava em estado delicado, conforme o boletim médico veterinário. Ela apresentava desidratação, alterações hepáticas, renais e gastrointestinais, além de estar abaixo do peso considerado normal.
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