Longas jornadas de trabalho podem não ser apenas ruins para você, mas também podem estar alterando a estrutura do seu cérebro, sugere um novo estudo. A pesquisa, publicada na terça-feira (13) encontrou “mudanças significativas” nos cérebros de pessoas que estavam sobrecarregadas, uma combinação de exaustão física e emocional, além de falta de descanso.
A pesquisa foi conduzida por dois cientistas das universidades Chung-Ang e Yonsei, da Coreia do Sul, que acompanharam 110 profissionais de saúde classificados em grupos “sobrecarregados” e “não sobrecarregados”. Na Coreia do Sul, onde 52 horas de trabalho por semana é o limite legal máximo, o excesso de trabalho tornou-se uma preocupação de saúde pública.
O grupo sobrecarregado, trabalhando 52 horas ou mais por semana, consistia em 32 pessoas que eram, em média, mais jovens, com menos tempo de emprego e mais altamente educadas em comparação com aqueles que trabalhavam horas normais.
Ao comparar dados de um estudo diferente e exames de ressonância magnética, os pesquisadores puderam usar uma técnica de neuroimagem para analisar o volume cerebral dos trabalhadores.
A técnica permitiu identificar e comparar diferenças nos níveis de matéria cinzenta em diferentes regiões do cérebro, enquanto a aplicação de análise baseada em atlas permitiu identificar e rotular estruturas em exames cerebrais.
“Pessoas que trabalhavam 52 ou mais horas por semana apresentaram mudanças significativas em regiões cerebrais associadas à função executiva e regulação emocional, diferentemente dos participantes que trabalhavam horas normais”, disseram os pesquisadores em um comunicado à imprensa.
As áreas do cérebro que mostraram um aumento no volume incluem o giro frontal médio, que desempenha um papel importante nas funções cognitivas, atenção, memória e processos relacionados à linguagem, bem como a ínsula, que está envolvida no processamento emocional, autoconsciência e compreensão do contexto social.
Os pesquisadores acreditam que suas descobertas sugerem uma “relação potencial” entre o aumento da carga de trabalho e mudanças nessas partes do cérebro, fornecendo uma base biológica para os desafios cognitivos e emocionais relatados por pessoas sobrecarregadas.
Joon Yul Choi, coautor do estudo e professor assistente do Departamento de Engenharia Biomédica da Universidade Yonsei, disse à CNN que essas mudanças podem ser “pelo menos em parte, reversíveis” se os estressores ambientais forem revertidos. Ainda assim, retornar ao estado inicial do cérebro pode levar muito mais tempo.
“Novas evidências importantes”
Pesquisas anteriores também encontraram evidências dos impactos negativos das longas jornadas de trabalho na saúde. Em 2021, uma pesquisa conjunta da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que o excesso de trabalho levou a mais de 745.000 mortes em um ano.
Longas jornadas também foram associadas ao aumento do risco de diabetes em mulheres e contribuem para um declínio na capacidade cognitiva.
Embora essas consequências comportamentais e psicológicas do excesso de trabalho sejam bem conhecidas, os mecanismos neurológicos subjacentes e as mudanças na anatomia são menos compreendidos, explicou o estudo.
Frank Pega, que liderou o estudo OMS-OIT de 2021, disse à CNN que essas últimas descobertas constituem “nova evidência importante” que poderia ajudar a entender melhor como longas horas de trabalho impactam “radicalmente” a saúde física dos trabalhadores.
Pega, um oficial técnico da OMS que não esteve envolvido neste último estudo, disse que a pesquisa apoia as descobertas da OMS-OIT de que “longas horas de trabalho contribuem para a maior carga de doenças entre todos os fatores de risco ocupacional identificados até agora”.
No entanto, o pequeno tamanho da amostra do estudo e o foco apenas em profissionais de saúde na Coreia do Sul dificultam a generalização dos resultados. “Mais estudos em diferentes populações são necessários”, disse Pega.
“Embora os resultados devam ser interpretados com cautela devido à natureza exploratória deste estudo piloto, eles representam um primeiro passo significativo para entender a relação entre excesso de trabalho e saúde cerebral”, disseram os pesquisadores.
E para quem está preso a trabalhar muitas horas? Agora você pode ter uma base científica para reduzir seu tempo de trabalho.
“Governos, empregadores e trabalhadores podem tomar medidas para proteger a saúde dos trabalhadores de longas jornadas de trabalho”, aconselhou Pega, citando leis, regulamentos e políticas que podem garantir horas de trabalho saudáveis.
“Os resultados ressaltam a importância de abordar o excesso de trabalho como uma preocupação de saúde ocupacional”, disseram os autores do estudo.
Jonny Gifford, pesquisador principal do Instituto de Estudos de Emprego em Brighton, Inglaterra, que não estava envolvido no estudo, disse à CNN que a pesquisa “confirma algumas razões fisiológicas pelas quais trabalhar longas horas afeta nosso bem-estar”.
“O uso de equipamentos de escaneamento cerebral para fornecer explicações neurológicas fornece novas evidências poderosas que ligam o excesso de trabalho a mudanças estruturais em partes do cérebro envolvidas na função executiva e na regulação emocional”, disse ele.
“É um pequeno estudo com 110 profissionais de saúde na Coreia, mas, como se baseia em medidas neurológicas robustas e aborda mecanismos fundamentais (excesso de trabalho e fadiga) que podem afetar qualquer pessoa, as descobertas centrais são amplamente relevantes”, acrescentou Gifford.
O estudo foi publicado no periódico Occupational and Environmental Medicine.
*Jack Guy, da CNN, contribuiu para esta reportagem.
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Este conteúdo foi originalmente publicado em Trabalhar demais pode mudar a estrutura do seu cérebro, diz estudo no site CNN Brasil.