Para alguns dos casais que a Dra. Samantha Rodman atende em sua clínica como psicóloga em Potomac, Maryland, as discussões frequentemente parecem urgentes, independentemente da situação.
Esse desejo de resolver um conflito antes de ir para a cama é particularmente comum entre clientes que cresceram em lares onde os familiares brigavam constantemente, segundo Rodman, autora de “52 E-Mails to Transform Your Marriage: How to Reignite Intimacy and Rebuild Your Relationship” (“52 e-mails para transformar seu casamento: como reacender a intimidade e reconstruir seu relacionamento”, em tradução livre para o português). “Nem passa pela cabeça simplesmente deixar de lado e ir dormir”, explica.
Para outros, a tendência vem do antigo ditado de que nunca se deve ir dormir com raiva — que às vezes surge da “crença de que a raiva não resolvida pode fermentar durante a noite, levando a um ressentimento mais profundo”, diz Sabrina Romanoff, psicóloga clínica em Nova York, por e-mail.
“Sua sabedoria provavelmente está enraizada na ideia de que a resolução de conflitos é essencial para manter a harmonia e evitar ainda mais distanciamento emocional”, afirma Romanoff. “Historicamente, é um apelo à conexão e à priorização do relacionamento sobre a negatividade persistente”.
A resistência de alguns em abandonar uma discussão durante a noite pode vir da autocomparação ou da positividade tóxica, segundo Rodman — o que pode levar você a pensar que deveria ser capaz de discutir rapidamente as coisas com seu parceiro, pedir desculpas, resolver o problema e ir dormir feliz.
Há também a preocupação — às vezes em retrospectiva — sobre o que pode acontecer se você deixar seu parceiro seguir seu dia com aquele ressentimento persistente entre vocês dois ou sem ter dito “eu te amo”.
Considerando tudo isso, nunca ir dormir com raiva parece uma boa regra a seguir. Mas nem sempre é útil, de acordo com Romanoff.
“Sua rigidez pode negligenciar necessidades individuais, descanso e perspectiva”, afirma Romanoff. “Aplicar essa convenção sem critério pode, na verdade, ser prejudicial ao seu relacionamento”.
Colocar uma discussão em pausa e ir dormir chateado é uma habilidade que você pode praticar, diz Rodman. Veja como como fazer isso e ainda manter seu relacionamento intacto.
Quando você deve encerrar a noite
Adiar o sono para resolver uma discussão pode sair pela culatra por vários motivos. Quando você está exausto, está menos inibido e, portanto, tem menos controle sobre suas emoções, então você é mais impulsivo e propenso a dizer ou fazer coisas que não quer e das quais se arrependerá depois, explicam os especialistas.
Suas habilidades de resolução de problemas, escuta e raciocínio, todas necessárias para uma comunicação eficaz, também podem ser prejudicadas, especialmente se você estiver muito agitado. Esses fatores, assim como estar sob influência de substâncias, podem agravar ainda mais o problema, segundo Rodman.
Uma boa noite de sono, no entanto, pode reiniciar completamente o cérebro.
Dormir “reduz a reatividade do seu cérebro a estímulos negativos — ou estímulos percebidos como negativos — ajuda a processar emoções e restaura sua capacidade de abordar problemas racionalmente”, afirma Romanoff. “Um cérebro bem descansado está mais preparado para se envolver em uma comunicação reflexiva e respeitosa”.
Às vezes, aquilo sobre o que você estava discutindo não parecerá mais importante no dia seguinte. Para as preocupações que permanecerem, no entanto, você estará mais capaz de expressá-las de uma maneira menos emocional ou defensiva e, em última análise, melhor para o relacionamento.
Exceto nas raras ocasiões em que algo importante e relevante para o conflito está prestes a acontecer tarde da noite, Romanoff diz que todas as discussões devem esperar até o dia seguinte.
Quando você ainda está com muita raiva para dormir
Digamos que você queira dormir, mas está lutando porque o problema parece urgente, você está deitado acordado ruminando enquanto seu parceiro dorme profundamente, ou você está preocupado que algo ruim possa acontecer.
Esses sentimentos podem vir do “pânico de apego”, segundo Rodman. Esse é o medo de que sua figura de apego ou relacionamento mais próximo, tipicamente seus pais na infância ou seu parceiro na idade adulta, não esteja lá para você ou não o ame.
“Isso é muito motivado evolutivamente para tentar voltar a um estado onde você se sente seguro no relacionamento”, acrescenta Rodman.
Em muitos desses casos, as pessoas sentem que a única maneira de gerenciar sua ansiedade é tentar consertar as coisas imediatamente. Mas quando você está agitado e cansado, as conversas com seu parceiro não serão tão boas quanto quando você está calmo e descansado. Na verdade, essas conversas podem até levar a uma situação que aumenta sua ansiedade.
Independentemente do motivo pelo qual você simplesmente não consegue deixar para lá, existem coisas que você pode fazer para se acalmar o suficiente para ter um sono reparador.
Em alguns relacionamentos, uma pessoa quer discutir conflitos mais do que a outra, de acordo com Rodman. Essa pessoa pode se preocupar que, se a conversa não acontecer imediatamente, nunca acontecerá — significando que o problema nunca será resolvido e a segurança e conexão no relacionamento nunca serão restauradas.
Por isso, especialistas afirmam que é fundamental que os casais se comprometam com um horário e local para conversar assim que for razoavelmente possível e quando ambos estiverem em um melhor estado mental. Antecipar que as coisas serão resolvidas em breve pode ajudar a acalmar o suficiente para dormir.
Os casais também podem tentar manter quaisquer rituais noturnos que reforcem a base do relacionamento, como dizer “eu te amo”, abraçar ou dar um beijo de boa noite, segundo Romanoff.
Manter esses rituais comunica que seu compromisso um com o outro é mais importante que o desentendimento atual, oferecendo segurança sem dispensar o conflito e equilibrando sua segurança emocional imediata com a necessidade de dormir, explica Romanoff.
Emoções são geralmente passageiras, mas seu compromisso e cuidado com seu parceiro provavelmente não são. Você pode até mesmo dizer todas essas coisas.
Se você está lendo esta dica e pensando “Se eu estiver com raiva, não há chance de eu dizer ‘eu te amo’”, essa teimosia é parte do que leva a conflitos frequentes, diz Romanoff.
“Quanto mais você diz ‘não posso aprender novas formas de me envolver’, menor a probabilidade do relacionamento dar certo”, acrescenta. “Em um relacionamento saudável, as pessoas estão sempre aprendendo novas habilidades.”
Você não precisa fazer essas coisas alegremente ou romanticamente — um “eu te amo” monótono ou um beijo rápido ainda podem fazer muita diferença. Não se trata de negar sua raiva, mas de afirmar o vínculo que vocês compartilham, afirma Romanoff.
A autorregulação também pode ser importante. Você pode tentar meditar, escrever em um diário, fazer exercícios respiratórios ou se distrair tomando um banho rápido ou mergulhando as mãos em água fria, sugeriu Rodman. Pergunte a si mesmo: “Como posso lidar com as coisas de uma maneira que fará meu futuro eu se orgulhar? Como posso cuidar de mim mesmo como um pai cuidaria de um filho que está chateado?”
Aprender a se acalmar “é o verdadeiro trabalho profundo que muitas pessoas fazem com apego ansioso, especialmente na terapia”, afirma Rodman.
Sempre que você tiver essa conversa de acompanhamento com seu parceiro, lembre-se que, embora as discussões sejam inevitáveis, a forma como você lida com elas define seu relacionamento e, às vezes, sua saúde do sono, segundo Romanoff.
“Trate os conflitos como oportunidades de se aproximar, não de se afastar”, acrescenta Romanoff. “Não se trata de manter sempre um relacionamento perfeito; trata-se de crescer, aprender e progredir pela vida juntos, mesmo nos momentos difíceis.”
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Este conteúdo foi originalmente publicado em Dormir brigado faz mal? Nem sempre, segundo especialista no site CNN Brasil.