Guerra na Ucrânia abre caminho para o domínio chinês no mercado russo

O enfraquecimento do rublo, as sanções internacionais e a debandada de empresas ocidentais após a invasão da Ucrânia abriram espaço para uma ampla expansão das empresas chinesas no mercado russo. Desde automóveis até máquinas industriais e microchips, a China se tornou o principal fornecedor da Rússia, e especialistas avaliam que essa reconfiguração dificilmente será revertida mesmo em caso de paz. As informações são do jornal The Moscow Times.

Atualmente, 76% do equipamento tecnológico utilizado pela Rússia com fins militares é de origem chinesa. Em 2024, a China foi responsável por 89% das importações de microchips e 71% das máquinas de processamento de materiais. Tais produtos são cruciais para setores industriais, desde a fabricação de carros até o controle de redes elétricas e sistemas de segurança.

A presença chinesa também se consolidou no mercado automobilístico. Marcas como Haval, Chery e Geely ganharam espaço após a retirada de montadoras ocidentais, enquanto modelos de marcas ocidentais produzidos na China, como o Ford Taurus, também abastecem o mercado russo.

“Novos carros premium chineses começam por cerca de 6 milhões de rublos (R$ 420 mil), em comparação com os cerca de 9 milhões (R$ 631 mil) de um Volkswagen Touareg trazido da Europa”, disse Ivan, um revendedor em São Petersburgo.

Presidentes da China, Xi Jinping e da Rússia, Vladimir Putin, no Cazaquistão, julho de 2024 (Foto: Kremlin)

De acordo com concessionárias locais, os carros premium chineses custam cerca de 6 milhões de rublos (R$ 420 mil), valor competitivo frente a modelos europeus, como o Volkswagen Touareg, que pode superar os 9 milhões de rublos (R$ 631 mil) com impostos e taxas de importação.

A indústria de máquinas também passou por uma guinada. Equipamentos de marcenaria e metalurgia chineses são hoje entre 30% e 50% mais baratos que os equivalentes europeus, sem perda significativa de qualidade, segundo um empresário ouvido pelo jornal.

Problemas para o setor de serviços

Esse movimento não se restringe à indústria pesada. Setores de serviços também acompanham a reorganização. Grandes consultorias ocidentais, deixaram o país em 2022 e transferiram suas operações para outros mercados, como Azerbaijão e Cazaquistão. No vácuo deixado por elas, surgiram firmas locais, mas nenhuma conseguiu ainda alcançar o prestígio e a capacidade de atração de talentos das consultorias ocidentais.

No setor de tecnologia corporativa, a alemã SAP, que prestava serviços para gigantes como a Gazprom, também suspendeu suas operações na Rússia. Empresas russas, como a 1C Company, correm para desenvolver substitutos, mas um ex-funcionário da SAP afirmou que “será extremamente difícil substituir toda a gama de serviços da empresa no curto prazo”.

Diante de tal cenário, os EUA discutem formas de desarticular a aliança entre Moscou e Beijing. “O petróleo russo hoje é vendido barato para a China. Não tenho certeza de que isso seja um benefício tão maravilhoso [para os EUA]”, disse Steve Witkoff, enviado especial do presidente Donald Trump.

Mas, segundo o analista Alexander Gabuev, essa tentativa enfrenta obstáculos políticos. “Para afastar a Rússia do abraço chinês, seria necessário oferecer algo crível e de longo prazo. Mas como isso seria possível se Donald Trump provavelmente ficará apenas quatro anos?”, afirmou.

Mesmo que a guerra termine, a Rússia deve continuar dependente da China. Máquinas e veículos têm vida útil de décadas, e os contratos atuais vão garantir o fornecimento de peças chinesas por muitos anos. “O mercado russo nunca mais será o mesmo. Os europeus e americanos não conseguirão recuperar o espaço perdido, exceto em nichos como moda de luxo”, disse um ex-funcionário do governo russo, sob anonimato.

O post Guerra na Ucrânia abre caminho para o domínio chinês no mercado russo apareceu primeiro em A Referência.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.