Qual a diferença entre sapo, rã e perereca? Especialista explica


Embora possuam muitas semelhanças, esses anuros possuem características próprias que os tornam únicos no reino dos anfíbios. Descubra as principais diferenças entre sapos, rãs e pererecas
Willianilson Pessoa
Alguém já te falou que a rã é a fêmea do sapo? Ou que sapo e perereca é a mesma coisa? É normal que esses animais pareçam iguais, até por que fazem todos parte da mesma ordem, a Anura, mas não é bem assim que funciona. Apesar de frequentemente confundidos, sapos, rãs e pererecas são criaturas distintas, cada um com seu jeitinho especial de viver, cantar e até saltar.
A maior ordem de anfíbios existentes na Terra é justamente a Anura, da qual pertencem todas as diferentes famílias e espécies de sapos, rãs e pererecas. Com cerca de 7.300 espécies, os animais dessa ordem estão presentes no mundo todo – menos na Antártida, já que esses anfíbios não conseguem sobreviver às temperaturas tão geladas desse continente, conforme relata a Encyclopaedia Britannica (plataforma do Reino Unido).
Entre tantas espécies de anuros, o Brasil contabiliza 1.144 espécies, sendo, portanto, o país com a maior diversidade desse grupo de anfíbios do mundo, segundo o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios (RAN), um órgão que pertence ao ICMBio.
A principal semelhança entre todas as espécies de anuros é que esses animais respiram tanto pela pele quanto pelos pulmões e absorvem água pela região inguinal — localizada abaixo da barriga. Apesar dessas características em comum, há diversas particularidades que diferenciam os anfíbios da ordem Anura. O herpetólogo Willianilson Pessoa explica, a seguir, quais são as principais diferenças entre sapos, rãs e pererecas.
Sapos
Segundo Willianilson, os sapos são, em sua maioria, animais terrestres. Com saltos mais curtos, eles se deslocam com frequência andando, embora também consigam pular. Suas pernas traseiras, embora mais longas que as dianteiras, não são tão desproporcionais quanto as das rãs ou pererecas.
“Você pega uma perereca e vê proporcionalmente os braços, são quase duas vezes ou podem ser duas vezes maiores que os braços. Nos sapos, isso é maior ainda, o membro posterior, mas ainda não é tão maior do que o da frente”, explica Willianilson.
Proceratophrys cristiceps, sapo da família Odontophrynidae
Willianilson Pessoa
A pele rugosa é uma das marcas registradas dos sapos, que conseguem passar mais tempo longe da água, embora dependam dela para se reproduzir. Por isso, podem ser vistos em poças ou lagoas durante o período reprodutivo, mas habitam principalmente o chão de florestas e áreas abertas.
É raro encontrar sapos em árvores ou muros, mas há exceções. Uma delas é o Frostius pernambucensis, espécie conhecida como “cururuzinho rosa”, encontrada em bromélias no alto das árvores da Mata Atlântica em Pernambuco e Alagoas. Segundo Willianilson, esse sapo canta nas copas, comportamento atípico para o grupo, que costuma vocalizar no solo.
Outra característica marcante dos sapos é a presença de glândulas visíveis na pele, como as glândulas paratóides, situadas atrás dos olhos. Essas estruturas, comuns em espécies como o sapo-cururu (Rhinella marina), servem como mecanismo de defesa e são perceptíveis a olho nu, em forma de relevo na pele.
Apesar da fama, não há motivo para ter medo dos sapos. Esses animais não conseguem expelir veneno de forma ativa. A substância tóxica presente em algumas espécies só é liberada quando as glândulas na pele são pressionadas, geralmente durante o ataque de um predador, que acaba recebendo o veneno diretamente na boca.
Pererecas
As pererecas são conhecidas por seu estilo de vida arborícola — ou seja, vivem em árvores e vegetação elevada. Não por acaso, em inglês, são chamadas de tree frogs. Segundo o herpetólogo Willianilson Pessoa, as pererecas podem ser consideradas “rãs arborícolas”, com adaptações específicas que as tornam ótimas escaladoras.
Uma dessas adaptações são os discos adesivos nos dedos, estruturas semelhantes a ventosas, que permitem que elas se prendam facilmente a superfícies verticais, como paredes, troncos ou até janelas de banheiro. Portanto, se você encontrar um anfíbio grudado na parede da sua casa, é quase certo que se trata de uma perereca — e não de um sapo ou rã.
“Pererecas são adaptadas muito mais pro salto, um animal que a gente vai encontrar em árvore, grudado nas paredes. Então, se tem uma perereca na sua casa, grudada na parede da sua casa, no banheiro, na telha, em cima de uma árvore, é perereca, raramente vai ser um sapo”, elucida o especialista.
Pithecopus gonzagai, perereca da família Phyllomedusidae
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Outro traço marcante está nas pernas traseiras longas e bem desenvolvidas, que garantem saltos impressionantes. Por viverem nas copas das árvores, chegando a até 30 metros de altura a depender do bioma, as pererecas precisam de força e agilidade para se locomover com segurança. Embora algumas espécies mais lentas caminhem entre galhos, o salto continua sendo sua principal forma de deslocamento.
Assim como as rãs, as pererecas possuem membranas interdigitais nos pés, semelhantes às de um pato, que as ajudam a nadar com eficiência. Essa característica não está presente nos sapos, que têm os dedos totalmente separados por serem animais de hábito mais terrestre.
Segundo o Instituto Butantan, o Brasil abriga mais de 350 espécies de pererecas, sendo a Boana raniceps uma das mais frequentes no país. O nome “perereca”, usado para designar os anfíbios da família Hylidae, tem origem no termo indígena pere’reg, da língua tupi, que significa “aquele que salta”.
Rãs
As rãs são anfíbios que, apesar de também viverem no chão como os sapos, têm o corpo moldado para o desempenho: pernas traseiras muito compridas, cintura fina e peito musculoso. Essas características garantem não só saltos potentes, mas também uma ótima performance na água, já que muitas espécies passam boa parte do tempo em ambientes alagados ou próximos a corpos d’água.
Segundo Willianilson, uma das melhores formas de reconhecer uma rã é observar a estrutura corporal. “Se você pegar uma rã, vai notar o antebraço grosso, os braços fortes e o peito bem desenvolvido. É ele quem absorve o impacto dos saltos”, explica. Essas adaptações funcionam como amortecedores naturais, essenciais para animais que pulam alto e frequentemente.
Leptodactylus fuscus, rã da família Leptodactylidae.
Willianilson Pessoa
Diferente das pererecas, as rãs não têm discos adesivos nos dedos, o que as impede de escalar com facilidade. Por isso, é raro encontrar uma rã em árvores ou grudada em paredes. Um bom exemplo de rã brasileira é o gênero Leptodactylus, que está presente em todos os biomas do país. Mesmo quando longe da água, essas rãs conseguem se locomover com facilidade até brejos, lagoas ou açudes — especialmente durante o período reprodutivo.
No coro noturno dos anuros, em noites de chuva, é possível diferenciar os grupos pelo local de onde vocalizam: os sapos geralmente cantam dentro ou à beira da água, as rãs ficam próximas ou dentro dos corpos d’água, enquanto as pererecas preferem cantar sobre galhos, folhas ou telhados, sempre nas redondezas da água.
Conservação
Sapos, rãs e pererecas não são apenas fascinantes por suas diferenças e adaptações, eles também desempenham um papel essencial no equilíbrio dos ecossistemas. Esses anfíbios são bioindicadores, ou seja, sua presença (ou ausência) em um ambiente pode revelar sinais de degradação ambiental, como poluição da água, mudanças climáticas ou desmatamento. Por serem extremamente sensíveis a alterações químicas e climáticas, ajudam cientistas a monitorar a saúde dos biomas.
Scinax xgisnatus, perereca da família Hylidae
Willianilson Pessoa
Além disso, os anuros fazem parte da base alimentar de diversos animais, de aranhas e peixes a aves, répteis e mamíferos, sendo peças-chave na cadeia ecológica. Ainda assim, sofrem com a perda de habitat, uso excessivo de agrotóxicos e a desinformação, que leva muitas pessoas a temê-los ou matá-los injustamente.
Conservar esses animais é preservar a saúde dos ambientes onde vivemos. Conhecer melhor esses pequenos saltadores é um passo importante para superar mitos, respeitar a fauna brasileira e fortalecer ações de educação e proteção da biodiversidade. Afinal, quanto mais aprendemos sobre eles, mais entendemos o quão essenciais e vulneráveis eles são.
*Texto sob supervisão de Lizzy Martins
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