EUA: Corte de funcionários pode afetar alertas sobre terremotos e tsunamis

Em algum momento entre hoje e daqui a 200 anos, cientistas dizem que o terremoto devastador “Big One” atingirá os Estados Unidos.

Há perigo à espreita no fundo do mar ao largo da costa noroeste do Pacífico: séculos após duas placas tectônicas se chocarem, a zona de subducção da Cascadia, que se estende do norte da Califórnia até a Colúmbia Britânica, província localizada no extremo oeste do Canadá, deverá se romper.

“Sabemos que temos o potencial para um terremoto de magnitude realmente grande, o maior que já vimos no planeta”, disse Harold Tobin, professor da Universidade de Washington e diretor da Rede Sísmica do Pacífico Noroeste. “Sabemos que o Pacífico Noroeste tem essa possibilidade.”

O terremoto resultante pode ter uma magnitude devastadora de 9,0, e o tsunami subsequente pode atingir 30 metros de altura, devastando cidades e vilas costeiras.

Cerca de 13.800 pessoas podem morrer e mais de 100.000 podem ficar feridas, segundo estimativas da Agência Federal de Gestão de Emergências (Federal Emergency Management Agency).

Em resumo, poderá ser o pior desastre natural que os Estados Unidos já presenciaram nos tempos modernos.

E muitos cientistas afirmam que estamos menos preparados para ele do que nunca. A equipe de especialistas que passou décadas vigiando, os “guardiões no portão”, está sendo dizimada pelos cortes de funcionários do governo Trump.

Não se trata apenas de terremotos e tsunamis; especialistas que alertam sobre erupções vulcânicas afirmam que os cortes serão mais sentidos em momentos de crise.

Cortes de funcionários do governo Trump ameaçam momentos de crise

Os cientistas que observam o sol em busca de tempestades solares invisíveis, porém devastadoras, não estão apenas perdendo funcionários; eles correm o risco de serem transferidos para uma agência totalmente diferente.

Um porta-voz do Serviço Geológico dos EUA, a agência federal encarregada de monitorar terremotos e vulcões, não quis comentar sobre questões de cortes em um comunicado à CNN, mas acrescentou que a pasta “continua comprometida com seu mandato como braço científico do Departamento do Interior”.

A Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA), que supervisiona tsunamis e tempestades solares, não retornou um pedido de comentário da CNN.

Além disso, novas restrições de gastos para algumas agências federais estão criando obstáculos extras para os cientistas consertarem sismógrafos de terremotos e sensores de águas profundas que capturam a velocidade de propagação das ondas de tsunami, disseram quatro pessoas com conhecimento da situação à CNN.

O mesmo se aplica aos equipamentos que monitoram tremores de terra antes da erupção de vulcões.

“Já estamos despreparados para esses eventos”, disse Corina Allen, ex-gerente do Programa de Tsunamis do Serviço Nacional de Meteorologia da NOAA.

Allen foi recentemente demitida do cargo, assim como milhares de outros funcionários federais em estágio probatório que estavam no cargo há menos de um ano.

“Ser capaz de detectar previsões e alertar as pessoas sobre a aproximação de um tsunami salvará centenas, senão milhares de vidas”, acrescentou Allen. “Esse é o impacto. Esse é o risco que enfrentamos ao reduzir a capacidade de realizar esse trabalho na NOAA”, completou.

Veja os quatro grandes perigos terrestres para os quais, segundo especialistas, será mais difícil se preprar, devido a cortes de funcionários e restrições de financiamento.

Terremotos

Uma rede de cerca de 800 sismógrafos no Ocidente é a primeira linha de defesa contra o “Big One”. Ela detecta tremores e movimentos nas profundezas do subsolo, alertando os cientistas.

“Muitos (sensores) precisam estar em locais remotos”, disse Tobin. “No topo da montanha, no final de uma estrada de exploração madeireira. É um terreno bastante bruto. E todos eles precisam de manutenção, de uma forma ou de outra.”

Equipes de cientistas do Serviço Geológico dos EUA (USGS) costumam sair todo verão para consertar instrumentos quebrados ou retirá-los da neve profunda.

Mas obter aprovação para viagens se tornou difícil, e o medo está se espalhando pela agência, disse uma fonte familiarizada com o assunto à CNN, criando uma barreira ainda maior para a realização do trabalho.

Tobin, que, juntamente com o USGS, supervisiona o sistema de alerta precoce ShakeAlert para grandes terremotos, está particularmente preocupado com o que poderia acontecer se o orçamento de Trump fosse aprovado sem financiamento para o programa.

“Não conseguiríamos ter a equipe que temos agora sem esse financiamento”, disse Tobin. “Só isso já representa algo como 50% do meu orçamento.”

Sem pessoal ou financiamento suficiente para manutenção do sistema ShakeAlert, “ele não desligaria no primeiro dia, mas não sei por quanto tempo duraria”, disse Tobin.

Tsunamis

Tsunamis são desastres mortais que podem surgir de um terremoto no oceano. São ondas gigantes que avançam sobre a terra, inundando quilômetros.

Semelhante aos sismógrafos espalhados ao longo da costa oeste, a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA) mantém uma rede de sensores nas profundezas do oceano, projetada para alertar cientistas quando uma onda de tsunami passa por lá.

Os dois centros de alerta de tsunami da NOAA e o programa do Serviço Nacional de Meteorologia (NWS), que trabalha para modernizar os sistemas de software obsoletos, foram atingidos por demissões de funcionários em estágio probatório. Vários trabalhadores aceitaram o projeto de demissão voluntária de Trump, de acordo com Corina Allen, que trabalhava como gerente do programa de tsunami no NWS.

Os centros de monitoramento 24 horas por dia, 7 dias por semana, já contavam com uma equipe reduzida, disse Allen, e as novas reduções são profundamente preocupantes, especialmente considerando a ameaça de um terremoto e tsunami no noroeste do Pacífico.

“Esses programas já estão em estado precário”, disse Allen. “Eles foram reduzidos; foram cortados. As vagas não foram preenchidas.”

Na época da demissão, Allen trabalhava para modernizar o software do programa de alerta de tsunamis para integrá-lo melhor ao sistema de alertas usado pelo Serviço Nacional de Meteorologia, uma atualização crucial para ajudar a enviar alertas às comunidades com mais rapidez.

“Esses cortes de pessoal e os potenciais cortes orçamentários aumentam o risco de tsunamis e terremotos nos Estados Unidos, e terão impactos devastadores para as populações costeiras e para a economia americana”, disse Allen.

Vulcões

O vulcão Kilauea, localizado no Havaí, está em processo de erupção intermitente desde o ano passado, expelindo lava e cinzas. O USGS, que monitora vulcões além de terremotos, prevê mais erupções, de acordo com o site oficial.

Os cientistas do Serviço Geológico dos EUA também estão monitorando de perto dois vulcões no Alasca: o Great Sitkin, que vem expelindo lava lentamente desde que entrou em erupção em 2021, e o Monte Spurr, onde pequenos terremotos vulcânicos foram detectados recentemente.

Há dois escritórios principais do USGS monitorando a atividade vulcânica, um no Havaí e outro no Alasca.


Um geólogo do Observatório de Vulcões Havaianos do USGS verifica uma webcam durante erupção no vulcão Kilauea, no Havaí, em 2024. • M. Patrick/USGS/Reuters via CNN Newsource

Alguns cientistas de vulcões do USGS aceitaram o processo de demissão adiada, de acordo com Jeff Freymueller, professor da Universidade Estadual de Michigan que trabalhou no Observatório de Vulcões do Alasca e que mantém contato com os demais funcionários do USGS.

Os observatórios de vulcões são monitorados 24 horas por dia, 7 dias por semana, e, se houver uma grande erupção vulcânica, todos precisam estar a postos.

“A escassez de funcionários será muito, muito pior quando houver uma crise vulcânica, porque você simplesmente precisa estar com todos a postos para cobrir a carga de trabalho”, disse Freymueller.

Por enquanto, os dados continuam fluindo. Mas Freymueller está de olho para ver se a manutenção do sismógrafo acontecerá neste verão.

“Eles esperam que já tenha avido cortes suficientes para apaziguar os superiores, para que não haja mais (cortes de funcionários)”, completou.

Tempestades Solares

Embora muitos dos maiores perigos que exigem monitoramento constante aconteçam na Terra, existem outros no cosmos. Em particular, vindos do Sol.

Tempestades solares ocorrem quando o Sol lança plasma e outras partículas carregadas, transportando o campo magnético solar em direção à Terra.

As tempestades, que seriam invisíveis a olho nu, podem criar auroras impressionantes, mas também causar estragos em nossas redes elétricas e sistemas de rádio. E esses tipos de tempestades têm acontecido com mais frequência porque o Sol está em uma fase particularmente ativa.

Há cerca de uma dúzia de especialistas trabalhando no Centro de Previsão do Clima Espacial da NOAA em Boulder, Colorado, com geralmente dois cientistas em cada turno de 24 horas. O Centro perdeu recentemente três funcionários, de acordo com Tim Keebler, pesquisador de clima espacial da Universidade de Michigan.

“Eles estão amplamente sem funcionários para uma equipe pequena”, disse Keebler.

Mais mudanças importantes podem estar chegando ao programa, que é um dos poucos do tipo no mundo. O governo Trump propôs transferi-lo da NOAA para o Departamento de Segurança Interna.

O programa também está se preparando para lançar um novo satélite para medir e prever melhor o clima espacial, mas tanta incerteza pode ameaçar o futuro de um programa pequeno, mas importante.

“Muitas, muitas pessoas dependem desses poucas funcionários neste escritório”, disse Keebler. “São as empresas de energia, as operadoras de satélite, as operadoras de telefonia celular, as empresas ferroviárias.”

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