Entenda como a sanção americana pode impactar o tabuleiro diplomático

Na última quinta-feira (21), uma declaração do secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, dizia que “há uma grande possibilidade” de o país norte-americano aplicar sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro, Alexandre de Moraes.

A justificativa, de acordo com sustentação do deputado republicano Cory Lee Mills, é de que o STF persegue “a oposição, incluindo jornalistas e cidadãos comuns” e o que faz agora “é uma iminente prisão politicamente motivada do ex-presidente Bolsonaro”.

Ele alega que a acusação está sob a Lei Magnistsky, um dispositivo da legislação americana que permite que o país imponha sanções econômicas a acusados de corrupção ou graves violações de direitos humanos.

Especialistas em direito internacional ouvidos pela CNN  avaliam que realmente há uma possibilidade concreta de que as sanções ocorram e, de acordo com o advogado Victor Del Veccio, mestre em direito internacional essa aplicação se divide em duas frentes.

“Uma delas é o Congresso dos EUA, que tem histórico de usar sanções como ferramenta política para pressionar autoridades estrangeiras em casos de violações graves de direitos humanos, corrupção ou ataques à democracia. No entanto, sua aplicação ainda depende de trâmites internos, como aprovação em comissões e, eventualmente, sanção presidencial”, diz.

Para ele, essas eventuais sanções representam um “sinal político claro de reprovação às decisões do ministro [Moraes], que desagradam desde Elon Musk, que ainda é próximo ao governo e com capacidade de influenciá-lo, até a extrema-direita norte-americana e também a brasileira”.

Maristela Basso, professora de direito internacional da USP lembra que os Estados Unidos já aplicaram, anteriormente, sanções desse tipo contra outros países. Como por exemplo à Nicarágua, quando impuseram restrições de vistos a mais de 250 membros do governo e aplicaram sanções a três entidades nicaraguenses em retaliação por “ações repressivas” e por não conter o fluxo de migrantes através do país centro-americano.

“Essas sanções querem mostrar que os EUA é um país defensor dos direitos humanos, da liberdade de expressão e companheiro do Brasil, de países que estão passando por um processo de desmocratização no que diz respeito às liberdades de expressão, e às liberdades principais que dizem respeito à liberdade política e civil”, justifica a professora.

Quais são as sanções

No caso específico de Alexandre de Moraes, as sanções podem incluir o bloqueio de bens e contas bancárias nos Estados Unidos, além do cancelamento do visto e da proibição de entrar em solo norte-americano.

“As consequências práticas são pequenas, tem mais barulho. São decisões administrativas, do poder Executivo, então elas duram até que durar aquele Executivo. Então os efeitos práticos são poucos”, argumenta Maristela.

Victor Del Veccio lembra, no entanto, que a “maior consequência” disso tudo, talvez não esteja nem no campo burocrático, mas sim no campo político.

“Muito além da restrição de mobilidade, é o fato político que se cria em torno da decisão, visando atribuir a Moraes uma imagem de “ditador”, o que pode ter impactos sobretudo no plano político interno brasileiro, onde essa narrativa será ainda mais explorada pela extrema-direita brasileira. Trata-se de uma tentativa de polarizar o cenário político, colocando de um lado Lula e Alexandre de Moraes, e do outro, a extrema-direita brasileira e Donald Trump”.

Atuação de Eduardo Bolsonaro

Um dos filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro, conhecido por ter relações fortes nos Estados Unidos é o deputado Eduardo Bolsonaro (PL), que se licenciou do cargo para permanecer nos Estados Unidos, desde que correu o risco de ter seu passaporte apreendido.

Ele, que iria presidir a Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados no Brasil, optou por deixar a cadeira para o deputado Coronel Zucco, também do PL.

Eduardo está em solo estadunidense desde a posse de Donald Trump, no início desse ano. Por lá, ele diz que se dedica “integralmente” a buscar as “devidas sanções aos violadores de direitos humanos” e também a “resgatar liberdades perdidas” no Brasil.

Pelas redes sociais, o parlamentar comemorou o anúncio do secretário de Estado dos Estados Unidos: “Marco Rubio diz que está NESTE MOMENTO analisando sanções contra Moraes sob a ótica a Lei Magnitsky (violação de direitos humanos) (…) Obrigada Dep. Mills. Venceremos!”.

De acordo com Victor Del Veccio essas sanções, se aplicadas, seriam como a “última conta” do filho do ex-presidente.

“Esta última conta, inclusive, com o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, que atualmente mora nos EUA e tem buscado aproximar os dois movimentos e avançar sua agenda política também dentro da administração americana”.

De acordo com apuração da CNN, ele deve retornar ao Brasil ainda neste ano, para se preparar para a eleição prevista para o ano que vem.

Após o anúncio das sanções, o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias protocolou um documento na Procuradoria-Geral da República (PGR), solicitando a prisão preventiva de Eduardo alegando que isso garantiria a “ordem pública”, além de “assegurar a aplicação da lei penal e preservar a autoridade e a independência do Poder Judiciário brasileiro”.

Aplicação da sanção

Quem decide ou não pela autorização das sanções à Moraes é o presidente Donald Trump, que tem a palavra final. De acordo com a lei Magnistky, ele precisaria apresentar provas ao Congresso americano das supostas violações de direitos humanos.

Para Marisela, caso sejam aprovadas, as sanções serão apenas uma “diplomacia da retórica”.

“É mais uma retórica, é mais uma diplomacia simbólica, uma diplomacia da retórica, diplomacia do empurrão do que qualquer outra coisa”.

Eleição à vista

Uma outra intepretação de Victor Del Veccio é a de que as sanções, se aplicadas fortaleceriam a “narrativa que associa Moraes à censura e à ditadura”, sustentada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, o que poderia vir a prejudicar o desempenho de Lula, caso tente a reeleição em 2026.

“Considerando o vínculo que se faz entre ele [Moraes] e o governo Lula, servir de combustível para críticas ao governo petista — que, em breve, irá concorrer à reeleição em um cenário de baixa aprovação interna”

Além disso, ele cita um atrito na relação bilateral com os EUA.

“Tende a gerar algum atrito diplomático, sobretudo se o governo brasileiro encarar a medida como uma tentativa de interferência externa e um ataque à soberania nacional. — interpretação que, a meu ver, é legítima à luz do princípio da soberania no direito internacional, que atribui ao Estado a autoridade suprema sobre seu território, incluindo não apenas recursos naturais, fronteiras e população, mas também a jurisdição sobre as decisões de seu Judiciário”, acrescenta.

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