Entenda o que é o crime de “domínio de cidade”, evolução do “novo cangaço”

Imagine uma cidade tomada pelo crime organizado durante horas, com delegacias interditadas, pontes bloqueadas, bancos assaltados, funcionários reféns e autoridades sequestradas. Um caos instalado em uma grande capital. Esse é o chamado “domínio de cidades”, nova modalidade do crime organizado.

As forças de segurança federais e estaduais a caracterizam como “a evolução negativa do novo cangaço” e já se preparam para enfrentamento – de forma estratégica.

Cidades dominadas

Em Campinas, município do interior paulista, no final de 2015, um mega-assalto a uma transportadora de valores causou terror durante uma madrugada. Um bando, formado por cerca de 20 homens, alvejou carros da Polícia Militar e de vítimas que passavam pelo local.

Houve explosões de dinamite e de um transformador de energia. Na fuga, os criminosos atearam fogo em um caminhão perto da empresa. Outro caminhão foi atravessado na rodovia Santos Dumont (SP-075), próximo ao aeroporto internacional de Viracopos.

Segundo testemunhas, os homens chegaram por volta das 4h atirando com fuzis contra a sede da empresa. Veículos fecharam a rua e parte dos bandidos entrou na empresa com a ajuda de dinamites. O sistema de segurança liberou um gás e frustrou a ação, gerando a fuga dos criminosos.

Esse terror instalado na cidade, o forte armamento e o planejamento organizado e ações orquestradas é o que as polícias chamam de domínio. A partir dessa ação, que se repetiu no ano seguinte da mesma forma, os policiais passaram a observar e se preparar.

Em 2021, 26 pessoas foram mortas pelas polícias Militar e Rodoviária Federal em Varginha (MG). Elas estavam fortemente armadas com fuzis dentro de uma casa e se preparavam, segundo a polícia, para atacar a cidade no dia seguinte. Seria um planejamento para o “domínio de cidades”.

A evolução

O delegado André Gossain, da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), do Ministério da Justiça, explicou à CNN de que maneira o novo cangaço evoluiu ao ponto dos criminosos dominarem cidade sinteiras.

“O novo cangaço começou durante o dia, havia de 10 a 20 delinquentes armados com fuzis invadindo pequenas ou medianas cidades no nordeste ou centro do país. Eles dominavam uma área do banco, exclusivamente ali, e usavam os populares como escudo humano. Os explosivos eram unicamente usados para explodir cofres, pegavam dinheiro, os reféns, em cima das caminhonetes e fugiam até determinado ponto. No determinado ponto soltavam os reféns, colocavam fogo no carro e fugiam. Era esse. Ainda existe, numa menor proporção, porque as polícias se prepararam com seus sistemas de defesa, e os bancos também”, relata o delegado.

“[A cidade] Vira um caos. Os planos são feitos durante anos. Há o uso de explosivos, o uso de armamento de grosso calibre, como a famigerada .50, que derruba aviões, coletes, toda uma estrutura criminosa que o policiamento convencional não consegue enfrentar porque as viaturas não têm estrutura de blindagem para suportar a .50.”, destaca Samir de Oliveira Rodrigues, policial militar de Mato Grosso do Sul.

O PM explica como é o combate nesses casos.

“O enfrentamento na área urbana não é a melhor opção e vai impactar a sociedade de bem que está dentro de casa. O armamento tem poder de atravessar as paredes de uma residência. O remédio que foi feito para isso é um mecanismo de defesa estatal chamado de plano de defesa, que visa salvar vidas, dos policiais, de pedestres. O plano de defesa é um mecanismo que conduz os criminosos para área externa da cidade e é tirada a vantagem dos carros blindados. E isso dá tempo de as forças de segurança fazerem a prisão e apreensão dos armamentos. Não existe um outro crime que impacta tanto a sociedade, e tão violenta, como o domínio de cidades”.

Treinamento das Forças de Segurança

Por conta da gravidade dos ataques, o Ministério da Justiça está realizando treinamentos em algumas regiões do Brasil com a participação de polícias estaduais, municipais e forças federais.

Na última sexta-feira (26), a CNN acompanhou um ataque simulado, em Paracatu (MG). A encenação aconteceu durante a madrugada, uma parceria do Ministério com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que assinou cooperação técnica com o governo federal.

Foram usados tiros de festim (balas de borracha), veículos queimados, explosivos e outros elementos para dar mais veracidade ao crime que simulou a invasão na cidade.

Paracatu foi escolhida por ser conhecida como a “Cidade do Ouro”, pois tem a maior mina do Brasil e municípios assim são vistos pelos criminosos como fonte de dinheiro e valores.

“Nós faremos uma análise crítica desse exercício e a ideia é estender esse convênio a outras localidades mineradoras”, disse à reportagem o general Fernando Azevedo e Silva, vice-presidente do Ibram. A próxima cidade a ter a simulação será Brasília.

Este conteúdo foi originalmente publicado em Entenda o que é o crime de “domínio de cidade”, evolução do “novo cangaço” no site CNN Brasil.

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