Quando o apoio de dirigentes como Trump ou Milei repercute nas criptomoedas

O recente apoio às criptomoedas por parte de Donald Trump e do argentino Javier Milei provocou perdas de bilhões de dólares para os investidores, enfraquecendo um setor que ainda busca legitimidade, alertam especialistas ouvidos pela AFP.

Na Argentina, tudo começou em meados de fevereiro, quando Milei anunciou no X um projeto para financiar empresas locais, incluindo um link para um contrato digital para comprar uma criptomoeda “$LIBRA”, criada nesse mesmo dia. Pouco depois, excluiu a postagem, desligando-se da iniciativa.

Em poucas horas, o preço do ‘token’ subiu de poucos centavos a quase cinco dólares e depois despencou abruptamente, quando um pequeno grupo dos primeiros compradores decidiu vender, embolsando milhões, com perdas enormes para a maioria dos demais investidores.

Milei, que depois tirou seu apoio, rejeita qualquer responsabilidade, afirmando que os afetados são “hiperespecialistas” que “sabiam muito bem no que estavam se metendo”. “São operadores de volatilidade, nenhum deles não sabia o que estava acontecendo. Se você vai ao cassino e perde dinheiro, qual é a reclamação?”, disse Milei.

“Com o efeito halo, toda a criptomoeda foi impactada”, explica Claire Balva, diretora de estratégia da empresa de tecnologia financeira Deblock.

Embora um apoio político possa de início aumentar a legitimidade do setor, “todo conflito que deriva disso, todo ‘hackeamento’, todo ataque especulativo” pode ter “um efeito contraproducente”, explica à AFP Larisa Yarovaya, diretora do Centro de Finanças Digitais na Southampton Business School, na Inglaterra.

– A queda após a euforia –

Foi isso que aconteceu quando Donald Trump lançou, antes de sua posse, uma criptomoeda chamada “Memecoin”, de um tipo muito volátil, baseado em uma personalidade ou em um fenômeno viral, com o único objetivo de se divertir e especular.

Depois da euforia inicial, a criptomoeda “Trump” caiu, fazendo com que 810.000 compradores perdessem mais de 2 milhões de dólares (11,4 milhões de reais) acumulados, disse a empresa Chainalysis ao The New York Times.

A operação gerou, no entanto, pelo menos 350 milhões de dólares (2 bilhões de reais) ao bilionário americano, estima o Financial Times.

Não é coincidência que um dos criadores da “$LIBRA”, o americano Hayden Davis, tenha confessado que se inspirou no sucesso de Trump.

Ironia do destino, o bitcoin, a primeira criptomoeda, foi lançado em 2008 exatamente para se libertar de todo poder central, apoiando-se em uma tecnologia que envolve computadores de todo o mundo para validar as transações, o “blockchain”.

Mas, diante da falta de uma autoridade centralizada, os criptoinvestidores dependem “das pessoas que apoiam esses produtos”, conta à AFP Maximilian Brichta, da Universidade da Califórnia do Sul.

– “Fraude pura e simples” –

Antigo crítico feroz das criptomoedas, Donald Trump se tornou seu maior defensor, fazendo com que os preços disparassem, especialmente o do bitcoin, depois de eleição, mas, desde então, eles só caíram.

O presidente bilionário propõe vários produtos relacionados às criptomoedas, especialmente através de sua própria plataforma de trocas, o que alimenta as acusações de conflitos de interesse.

Seguindo o exemplo de Donald Trump, a República Centro-Africana, o segundo país do mundo a adotar o bitcoin como moeda oficial depois de El Salvador, também lançou a sua criptomoeda, o “CAR”, inicialmente percebido como uma fraude pelos atores do setor. Seu valor caiu mais de 90% apenas uma horas depois de seu lançamento.

Muitos ‘traders’ aproveitam esse momento, utilizando programas automatizados para comprar as novas moedas o quanto antes e depois revendê-las obtendo o máximo lucro.

Para evitar manipulações nos preços, “quando se lança uma criptomoeda, as boas práticas requerem que os primeiros investidores, que entram antes que o público em geral, possuam uma parte minoritária da oferta e estejam sujeito a um período de bloqueio de vários anos”, explica Claire Balva.

No entanto, no lançamento da “$LIBRA”, “mais de 80% dos ‘tokens’ disponíveis estavam nas mãos de “poucos grandes compradores”, que “poderiam liquidá-los a qualquer momento”, o que constitui, segundo Balva, “ou uma imprudência monumental, ou uma fraude pura e simples”.

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