Mostra em Hamburgo reflete sobre o papel do acessório brilhante no mundo da moda, da música pop e no movimento LGBTQ+. Normalmente feito de material plástico, item também já existe em versão menos poluente.Seja adicionando brilho às maçãs do rosto de Taylor Swift ou ao ser usado por manifestantes em protestos políticos ou quando fica grudado teimosamente no seu rosto três dias após um festival de música, a purpurina ou glitter tem uma presença mágica – e confusa – para a humanidade.
Seu legado grandioso vem desde os tempos antigos. Ele aparece em cartões e enfeites de Natal, esmaltes, acessórios de moda, maquiagem para eventos esportivos e até mesmo em alimentos. Em marketing e design de produto, tem sido usado para transmitir vibrações “premium” ou “celebratórias”.
Basta pensar em embalagens de presente brilhantes, rótulos de champanhe espumante e embalagens de produtos de edição limitada: se brilha, é mais provável que se vá parar e olhar. E o material é tema central de uma exposição no Museum für Kunst und Gewerbe (Museu de Artes e Ofícios) de Hamburgo, em cartaz até outubro.
Um caso de amor
“Meu amor pela purpurina começou há mais de 10 anos, em festivais britânicos, onde todos se vestiam com lantejoulas, fantasias e, claro, muita purpurina. Era lúdico, expressivo e simplesmente divertido!”, conta Jeen Low, fundadora da Projekt Glitter, marca de purpurina biodegradável sediada em Berlim. “Foi como se eu tivesse redescoberto a magia da brincadeira – algo que muitas vezes esquecemos quando adultos.” Mas ela não é a única que ama coisas brilhantes.
Tudo o que brilha fascina os seres humanos, desde muito tempo. Acredita-se que o termo inglês glitter tenha origem no nórdico antigo glitra, que significa “brilhar”. Os povos pré-históricos usavam mica, um silicato brilhante, triturada para dar realce às pinturas rupestres. Os egípcios moíam malaquita verde ou lápis-lazúli azul para dar brilho à maquiagem dos olhos e à arte sacra.
Em 2008, pesquisadores australianos descobriram que os antigos construtores de templos maias usavam gesso com infusão de mica para fazer seus templos brilharem à luz do sol.
A purpurina moderna deve sua concepção ao criador de gado e maquinista americano de origem alemã Henry Ruschmann. Na década de 1930, ele desenvolveu uma máquina para cortar sucata de plástico e metal em minúsculas partículas reflexivas, e assim nasceu a purpurina industrial. Mais tarde, ele fundou a Meadowbrook Inventions, que ainda opera nos EUA. Ela se descreve como a empresa líder mundial no setor, produzindo, entre outras, purpurina comestível.
Pop, moda e bombas de purpurina
Purpurina e cultura pop têm uma longa associação com shows, festivais ou shows de talentos, frequentemente com finais brilhantes. Ela adornou o rosto de Ziggy Stardust, o avatar glam rock de David Bowie nos anos 1970, e emprestou seu brilho a estrelas pop modernas como Lady Gaga e Lizzo. A imagem de Taylor Swift com sardas brilhantes num jogo do Kansas City Chiefs em outubro de 2024 rodou o planeta.
Na moda, a purpurina tem sido um item básico da alta-costura maximalista, como os macacões da era Studio 54, as roupas rave dos anos 1990 ou as botas plataforma brilhantes vistas em passarelas de alta costura da Gucci, Marc Jacobs e companhia.
A teimosa aderência do material talvez seja a razão por que do “glitter bombing” – quando ativistas atiram purpurina em figuras públicas para destacar suas causas. A iniciativa ganhou as manchetes no início da década de 2010, quando políticos americanos como Newt Gingrich e Rick Santorum foram bombardeados com purpurina por suas posições sobre os direitos LGBTQ+.
Nos círculos LGBTQ+, a purpurina frequentemente simboliza desafio, alegria e autoexpressão sem remorso, com eventos como a Parada do Orgulho impulsionados pelo brilho.
A Cidade do México, em 2019, foi palco da chamada “revolução da purpurina”, quando ativistas protestaram contra o suposto estupro de uma adolescente por quatro policiais atirando purpurina rosa no chefe de segurança da cidade.
Em 2023, um manifestante interrompeu com glitter um discurso do primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, numa conferência do Partido Trabalhista. O protesto foi posteriormente reivindicado pelo grupo People Demand Democracy, que pressiona pela reforma eleitoral.
O lado sombrio do brilho
Apesar de sua imagem lúdica, esse brilho pode ter impactos ambientais negativos. A maior parte da purpurina comercial é microplástico – feito de PET ou PVC revestido com alumínio e corante. Essas partículas minúsculas são pequenas demais para ser filtradas durante o tratamento de águas residuais, acabando em rios e oceanos e ingeridas por plâncton, peixes e até pássaros. Essas partículas, então, entram na cadeia alimentar – potencialmente até mesmo na alimentação humana.
No entanto há quem busque criar alternativas ecológicas, incluindo purpurina à base de celulose, geralmente feita de eucalipto ou outros materiais derivados de plantas, que se biodegrada naturalmente e não representa uma ameaça à vida selvagem. Quando Jeen Low, natural da Malásia, fundou a Projekt Glitter em Berlim, seu maior desafio foi explicar por que o produto custava tão mais caro.
“Mas descobri que as pessoas que se preocupam com a sustentabilidade entenderam o valor. Muitos clientes, ao longo dos anos, me disseram que pararam de usar purpurina completamente por causa do impacto ambiental, então estão animados para encontrar uma alternativa. E agora, com a proibição de microplásticos na UE, não preciso mais me explicar. Mas ainda me surpreende quanta gente nem sabe que existe purpurina biodegradável.”
Brilho sem culpa
Low também é transparente sobre a porcentagem de plástico em seus produtos. “Nosso produto principal, Sparkle, atualmente é 94% livre de plástico. Mas já temos uma purpurina 100% livre de plástico – nossa linha perolada. É um pouco menos refletiva, já que não tem o componente de alumínio, mas é completamente livre de plástico.”
Mas seu objetivo é tornar todo o estoque da empresa livre de plástico até o fim de 2025 – de preferência com o mesmo brilho refletivo da purpurina tradicional. “Tem sido muito gratificante ver as pessoas se animarem ao perceber que não precisam abrir mão da purpurina – elas só precisam escolher um tipo melhor.”