Eleição no Canadá redefine relação com os Estados Unidos e abre nova fase geopolítica

A vitória de Mark Carney nas eleições federais do Canadá sinaliza uma ruptura profunda na relação histórica com os EUA, de acordo com especialistas ouvidos pelo think tank Atlantic Council. O Partido Liberal conquistou o maior número de assentos no Parlamento na votação de segunda-feira (28), concluindo uma impressionante virada política em meio ao crescente atrito com o governo do presidente Donald Trump.

Em seu discurso de vitória, Carney foi direto: “Nosso antigo relacionamento com os Estados Unidos, um relacionamento baseado em integração crescente e constante, acabou.”

O resultado eleitoral reflete um Canadá simultaneamente unido e dividido. Christopher Sands, diretor do Hopkins Center for Canadian Studies, observa que a eleição foi “um referendo sobre o relacionamento do país com os Estados Unidos”, mas destaca que o desfecho — um governo minoritário liberal com 162 assentos — revela que “os canadenses ainda estão divididos sobre quem deveria liderar”.

O embate entre Carney e Trump dominou a campanha. Diane Francis, pesquisadora do Atlantic Council, afirmou que “a eleição de 2025 poderia ser considerada um referendo sobre a adesão aos Estados Unidos”, após Trump projetar o Canadá como o 51º estado norte-americano. Mas a ideia, diz ela, foi “rejeitada de forma contundente pelos canadenses”.

Mark Carney, eleito novo primeiro-ministro do Canadá (Foto: WEF/Flickr)

Apesar da pressão norte-americana, Carney conseguiu recuperar terreno perdido, revertendo uma diferença de 21 pontos nas pesquisas. “Os canadenses estavam procurando uma mão firme em tempos turbulentos”, analisou Michael Bociurkiw, do Atlantic Council. Para ele, a postura combativa de Carney contra Trump e a percepção de competência frente à crise econômica explicam a mobilização do eleitorado.

Os próximos meses, no entanto, trarão desafios intensos. Carney terá que liderar o Canadá em dois grandes testes diplomáticos: a cúpula do G7, que será realizada em junho em Kananaskis e marcará a primeira visita de Trump ao Canadá em seu segundo mandato, e a reunião da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) em Haia. Como afirmou Sands, “como Carney se comportar moldará a posição do Canadá no exterior — e em casa”.

No plano da defesa, Carney já dá sinais de que buscará alternativas à dependência tradicional dos Estados Unidos. Segundo Imran Bayoumi, associado do Scowcroft Center for Strategy and Security, “espera-se que Carney busque novos acordos de defesa com uma variedade de nações”, mencionando negociações com França, Austrália e Coreia do Sul. O premiê chegou a reconsiderar a compra dos caças F-35 norte-americanos e anunciou uma nova parceria de segurança com Paris.

A política energética será outro eixo central da nova administração. Reed Blakemore, diretor do Atlantic Council Global Energy Center, destacou que “a energia e a infraestrutura desempenharão um papel fundamental nos próximos meses”. Ele lembra que os recursos energéticos canadenses são vitais para os Estados Unidos e que Carney deverá equilibrar os interesses internos para expandir exportações também para novos mercados globais.

Além disso, a regulação de inteligência artificial (IA) e redes sociais deve ganhar força. Mark Scott, especialista do Digital Forensic Research Lab, afirmou que, após o impacto limitado das campanhas de desinformação nesta eleição, “é provável que Ottawa redobre esforços em torno da governança da IA e de maior fiscalização das redes sociais”.

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