O cardeal Robert Prevost, bispo-emérito de Chiclayo, no Peru, e agora Leão XIV, o novo papa, veio ao Brasil pela primeira vez em 1992, quando trouxe um noviço (aquele que passa um certo tempo no convento se preparando para professar a fé) da Ordem dos Agostinianos do Peru para receber a formação religiosa na cidade de Bragança Paulista, a cerca de 80 km de São Paulo. Prevost era o prior (superior) dos Agostinianos no país vizinho naquele período e, depois, se tornou o superior geral da Ordem, entre 2001 e 2013.
“Depois de 1992, ele passou a vir ao Brasil quase todo ano, durante muito tempo”, contou o frei Luiz Augusto de Mattos, 72 anos, professor de Teologia, ex-superior da Província Brasileira Nossa Senhora da Consolação e Corrêa, ligada à Ordem de Santo Agostinho e sediada em Belo Horizonte, que virou um amigo de Prevost. “Ele fazia as visitas canônicas, podemos dizer. Eu era o superior e responsável pelo nosso grupo. Eu o recebia em Belo Horizonte e fazia as visitas com ele. Nos reunimos muitas vezes”, conta o Frei Luiz.
Além dos noviços peruanos, vinham também outros vizinhos da Bolívia, Chile e Argentina para receber formação na Província Nossa Senhora da Consolação, dos Agostinianos, em Bragança Paulista. Na primeira visita, em 1992, Prevost viajou de avião do Peru até o Paraguai e, depois, pegou um ônibus até São Paulo e, na sequência, chegou a Bragança.
Frei Luiz mantinha contatos frequentes com Prevost. Esteve com ele várias vezes em Belo Horizonte, em Bragança e também em Roma. Depois que o cardeal assumiu o Dicastério para os Bispos, no Vaticano – cargo que ocupou até o conclave que o elegeu papa -, os contatos se tornaram mais raros. “Aí ficou mais difícil ter contato. Quando ele estava no Peru, era mais fácil”.
O religioso brasileiro exibiu fotografias ao lado do agora papa em cerimônias religiosas na capital mineira, em 2002, como esta imagem em destaque (Prevost está no centro). Prevost já foi visto no Brasil comendo frango em bandejão e com um copo de cerveja na mão em outras fotos, divulgadas por frades mineiros.
“Ele não é de beber, mas se estivesse num grupo e dessem um copo de cerveja ele tomava. E também um vinho. Mas o vinho é cultural, como se toma muito na Itália, Portugal ou Espanha”, diz Frei Luiz.
Fã de futebol, o novo papa, quando estava no Brasil, gostava de ver jogos da Seleção Brasileira. Via também partidas de outros times, mas não manifestava preferência por um ou outro. “Por causa da inculturação (adaptação das normas de uma cultura por outra pessoa) ele não se manifestava muito. Não se expunha. Mas, numa Copa do Mundo, ele torcia pela Seleção Peruana, claro”, explica o Frei Luiz.
Naturalizado peruano, Prevost atualmente “é muito mais peruano do que americano”, observa o frei brasileiro. “É um homem latino-americano de coração”. Como a característica principal dos Ordem dos Agostinianos é a vida em comunidade, Prevost, nascido em Chicago (EUA), se adaptou à sua nova realidade local no Peru.
O cardeal que agora se tornou papa estava com passagens compradas para vir novamente ao Brasil este ano. Viria participar da 62ª assembleia geral dos bispos do Brasil, que aconteceria entre os dias 30 de abril e 9 de maio, em Aparecida (SP), e foi adiada por causa da morte do papa Francisco.
“Cabeça moderna”
O novo papa é um homem “de cabeça moderna, que fala pouco e é muito observador”, de acordo com Frei Luiz. “É um homem de diálogo, de escuta, muito sensível na maneira de ser. É modesto, simples, gosta de uma vida comunitária. Um coração muito bom. Ele ama a Igreja”, descreve o amigo. Prevost é totalmente alinhado às ideias do antecessor, observa o religioso brasileiro. “Ele se identifica muito com a linha do papa Francisco. Com o nível de Igreja, de querer uma igreja de árvore, uma igreja aberta para o mundo, uma igreja preocupada com os pobres. Ele é isso”, afirma.
A escolha do nome a ser usado como papa, conforme o frei, já explicaria a posição de Prevost. “Adotar o nome na sequência de Leão XIII, o papa da encíclica Rerum Novarum (que tratou das relações trabalhistas), já mostra que está muito ligado à questão da justiça, à questão social, à questão dessa política no mundo hoje. É só a preocupação dele. Nunca negou isso. Agora, não é uma pessoa como o papa Francisco, de muito embate. De embate, não. Mas ele se posiciona”, atesta o frei.
Questionado se o agora papa Leão XIV é moderado ou progressista, o religioso garante que conservador ele não é. “É um homem do Concílio Vaticano II (que enfatizou a opção preferencial pelos pobres). Dessa Igreja do Concílio. Por isso, ele se identifica muito com o papa Francisco. E tem um coração muito grande voltado para a América Latina, sobretudo para onde viveu muitos anos, o Peru”, afirma.