Inglês na universidade: necessário ou excludente?

Alguns textos de leitura obrigatória no ensino superior são em inglês, mas boa parte dos brasileiros não é fluente no idioma.Sou bolsista no mestrado e uma das minhas responsabilidades é participar de 25 seminários. Boa parte deles são lecionados por professores visitantes cuja língua materna é o inglês.

Tive o privilégio de aprender inglês, mas olhando para o lado, pela reação de meus colegas, suspeitava que muitos não estavam entendendo. Um deles levou o desabafo para o grupo e corroborou minha suspeita: boa parte vai por ser “obrigado”, devido à bolsa, mas não entende nada ou quase nada da exposição.

Se não tivesse buscado conhecimento por fora, provavelmente não teria aprendido inglês na educação básica. Estranhamente, na graduação me deparei com leituras obrigatórias no idioma estrangeiro e na pós a carga aumentou. E quem não teve o privilégio de aprender? Afinal, o impacto dessa inclusão de literatura estrangeira na academia brasileira é apenas positivo?

Panorama do nível de inglês no Brasil

Creio que seja relevante a exposição de alguns dados sobre a proficiência do inglês entre o povo brasileiro. Segundo levantamento do British Council, em 2018, o Brasil ocupava a 41ª posição no ranking de países com mais fluência na língua inglesa, ficando atrás de países da América do Sul, como Chile e Peru.

Além disso, 95% da população brasileira não falava inglês. Diante deste cenário, é realmente necessário ter literatura em inglês na academia brasileira?

Não acredito que a solução seja não ter mais literatura em inglês na academia brasileira. É indiscutível o quanto há excelentes pesquisadores e produtores de conhecimento, inclusive alguns que simplesmente criaram a área ou a teoria que estudamos, na literatura a qual temos acesso na graduação e na pós-graduação.

Consequentemente, não podemos negar o saldo positivo dessa capilarização e influência de pesquisadores estrangeiros, sobretudo de língua inglesa, em nossa produção científica.

Valorizar pesquisadores brasileiros

Mas vale a provocação: estamos preterindo nossos próprios pesquisadores? Minando o potencial do nosso próprio capital humano? Indo além: estamos sustentando uma manutenção do elitismo na academia brasileira?

Muitas vezes, no mestrado, senti falta de ler sobre políticas públicas brasileiras, e era quase como se não tivéssemos pesquisadores nacionais falando sobre, ou, pelo menos, não com qualidade. Mas a verdade é que temos e precisamos valorizar.

Uma amiga do doutorado precisou levantar artigos sobre um determinado tema. Encontrou brasileiros, mas estavam em inglês. Assim, quem não domina a língua, não poderá ler a produção do próprio país.

O que deve ser feito?

Minha preocupação são os discentes que têm dificuldades na formação devido ao conteúdo em língua estrangeira. Não acho que o caminho seja excluir essa literatura, mas sim criar condições para que consigam ler essas obras ou, ainda melhor, assistir aulas e palestras em inglês.

Algumas universidades oferecem oportunidades de cursos de língua a baixo custo, mas ainda acho insuficiente. É necessária uma política federal do MEC, através da secretaria de ensino superior, que ofereça uma formação sólida em inglês para a comunidade discente acadêmica brasileira.

A inclusão vai para além do acesso e de políticas de permanência, perpassa também por criar condições de que todos os discentes tenham a oportunidade de tirar o maior proveito da própria formação.

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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.

Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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