A poucos dias da primeira rodada da eleição presidencial na Polônia, marcada para domingo (18), o ambiente político e social do país tem sido marcado por uma escalada do sentimento anti-ucraniano. Após o início da invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, os poloneses demonstraram solidariedade massiva. Mas, três anos depois, a disposição da população em acolher os refugiados vem diminuindo drasticamente, segundo a rede BBC.
De acordo com o Centro de Pesquisas de Opinião Pública CBOS, apenas 50% dos poloneses são atualmente favoráveis à permanência de refugiados ucranianos no país, uma queda de sete pontos percentuais em apenas quatro meses. Em 2022, esse número era de 81%. Segundo dados oficiais, cerca de 2,5 milhões de ucranianos vivem hoje na Polônia, o que representa quase 7% da população total.
A tensão tem se refletido diretamente na campanha presidencial. O candidato mais bem colocado nas pesquisas é Rafal Trzaskowski, da coalizão do primeiro-ministro Donald Tusk. Embora seja o nome mais pró-Ucrânia da disputa, tem evitado destacar esse posicionamento para conquistar eleitores de centro.
“Ele está respondendo à mudança de atitudes do público. O entusiasmo inicial em apoiar vítimas da guerra está desaparecendo, sentimentos negativos estão se sobrepondo, e isso se tornou um tema desconfortável para ele”, afirma o analista político Marcin Zaborowski.

Outros concorrentes adotam posturas hostis. Karol Nawrocki, em segundo lugar nas pesquisas, é contra o apoio financeiro aos refugiados e se opõe à entrada da Ucrânia na União Europeia (UE) e na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Mais radical é a posição do populista de extrema direita Slawomir Mentzen, que aparece em terceiro lugar e defende um “acordo” com o presidente russos Vladimir Putin. Outro nome da extrema direita, Grzegorz Braun, que tem 3% das intenções de voto, está sendo investigado pela polícia após arrancar uma bandeira ucraniana da fachada de um prédio público durante um comício.
A ONG do analista Michal Marek, que monitora campanhas de desinformação, alerta para uma onda coordenada de conteúdos russos voltados à polarização do eleitorado polonês. “As principais narrativas são de que os ucranianos estão roubando o orçamento da Polônia, que não nos respeitam, que querem nos assaltar e matar, e que são responsáveis pela guerra”, afirma Marek. Segundo ele, essas mensagens têm origem em canais russófonos no Telegram e são republicadas com traduções automáticas para o público polonês. “E estão sendo empurradas para dentro da infosfera polonesa.”
Crianças ucranianas sofrem bullying
Para além das redes sociais, episódios de xenofobia têm afetado o cotidiano de milhares de refugiados. Svitlana, mãe ucraniana de 31 anos que pediu anonimato, relatou à BBC que a filha, aluna de uma escola polonesa, passou a sofrer bullying.
“Duas semanas atrás, ela chegou em casa e disse: ‘Um menino me disse hoje: volte para a Ucrânia’”, contou a mãe. Ainda segundo ela, dias depois, colegas simularam um bombardeio gritando “Míssil! Abaixem-se!” e rindo. Na mesma semana, um míssil russo havia atingido a cidade natal da menina, matando dezenas de civis, inclusive crianças. “Ela voltou para casa chorando”, conta Svitlana.
Casos semelhantes foram registrados em transportes públicos, ambientes de trabalho e redes sociais. Natalia Panchenko, ativista e presidente da fundação Stand with Ukraine, com sede em Varsóvia, relata que o discurso de ódio ultrapassou o ambiente virtual. “Recentemente, temos cada vez mais dessas situações: abuso xenofóbico contra pessoas que trabalham em lojas ou hotéis apenas porque falam com sotaque ucraniano.”
Natalia lembra com emoção do período inicial da guerra, quando milhares de poloneses se mobilizaram para ajudar. “Foi incrível. Todos os dias as pessoas ligavam perguntando: ‘Como podemos ajudar?’ Organizaram comboios humanitários, abriram suas casas, deram comida, tudo o que tinham, e seus corações também.”
A ativista acredita que a maioria da população ainda apoia a Ucrânia, mas reconhece a virada. “Esses grupos de mulheres e crianças estão aqui por causa da guerra. Muitas vezes seus parentes estão na linha de frente, em cativeiro ou mortos. E são justamente essas pessoas que estão sendo atacadas.”
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