As preocupações sobre a presença e as atividades do Hezbollah na América Latina, e especificamente no Brasil, têm ganhado destaque com anúncios oficiais e investigações recentes.
O Departamento de Estado dos Estados Unidos, através do programa Rewards for Justice (RFJ), está oferecendo uma recompensa de quase R$ 60 milhões por informações que levem à interrupção dos mecanismos financeiros do Hezbollah, solicitando dados sobre as redes da organização na região da Tríplice Fronteira, que abrange Argentina, Brasil e Paraguai.
A oferta de recompensa dos EUA visa identificar e neutralizar fontes de receita, canais de facilitação financeira, doadores, facilitadores, instituições financeiras ou casas de câmbio que ajudem transações do grupo, empresas ou investimentos controlados por eles, empresas de fachada para aquisição de tecnologia de dupla utilização, e esquemas criminosos que beneficiem financeiramente o Hezbollah.
As investigações dos EUA apontam que, na Tríplice Fronteira, financiadores e facilitadores do Hezbollah arrecadam recursos por meio de diversas atividades ilícitas, incluindo lavagem de dinheiro, tráfico de entorpecentes, contrabando (como carvão, petróleo, diamantes, dinheiro em espécie, cigarros e produtos de luxo), falsificação de documentos e falsificação de dólares americanos.
Além disso, o grupo obtém receitas de atividades comerciais em toda a América Latina, como construção civil, importação e exportação, e vendas de imóveis.
Declaração argentina
A ministra da Segurança da Argentina, Patricia Bullrich, reforçou as suspeitas ao afirmar em outubro de 2024 que o libanês Hussein Ahmad Karaki é o chefe de operações do Hezbollah na América Latina e que ele recrutou pessoas no Brasil.
Segundo Bullrich, Karaki esteve no Brasil, Paraguai e Argentina entre 1990 e 1991. Ele teria entrado na Argentina em 1992 com um documento colombiano, comprado o carro-bomba usado no atentado contra a embaixada israelense em Buenos Aires no mesmo ano utilizando uma identidade brasileira falsa.
A ministra alega que Karaki também recrutou Hussein Suleiman no Brasil na década de 1990 para contrabando de explosivos. Após o atentado de 1992, Karaki teria fugido para Foz do Iguaçu e, a partir de então, passou a ter relação com facções criminosas brasileiras, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV).
Essa relação, inicialmente focada em atentados diretos, teria evoluído para uma modalidade de conexão para “recrutamento”. Bullrich mencionou a Operação Trapiche da Polícia Federal brasileira, deflagrada em 2023 para evitar atos terroristas, no contexto dessa relação.
Investigações pela Polícia Federal
As investigações da Polícia Federal (PF) no Brasil também indicam atividades de recrutamento ligadas ao grupo. A PF concluiu que dois sírios naturalizados brasileiros, Mohamed Khir Abdulmajid e Lucas Passos Lima, foram responsáveis pelo recrutamento de três brasileiros para possíveis ataques terroristas.
Segundo a Divisão de Enfrentamento ao Terrorismo da PF, esses brasileiros foram levados ao Líbano, base do Hezbollah, para negociações, com passagens e hospedagem pagas e recebendo dinheiro e presentes caros.
Um dos recrutados, um músico carioca, relatou ter recebido a proposta de US$ 100 mil (cerca de R$ 550 mil) para cometer assassinatos no Líbano, sendo questionado se fazia parte de alguma facção criminosa.
A PF considera Mohamed Khir Abdulmajid e Lucas Passos Lima como “protagonistas na criação de uma rede nacional ligada ao grupo terrorista estrangeiro”. Mohamed está foragido na Difusão Vermelha da Interpol e a PF suspeita que ele fugiu para o Líbano.
Lucas Lima foi preso ao voltar de Beirute, com US$ 5 mil apreendidos. A investigação teve início após o FBI identificar uma viagem suspeita ao Líbano de um pequeno grupo de indivíduos possivelmente envolvidos em atividades criminosas e potencialmente terroristas no Brasil.
Sobre o Hezzbollah
O Hezbollah é uma organização sediada no Líbano que recebe apoio financeiro e militar do Irã, país designado pelos EUA como Estado patrocinador do terrorismo.
Estima-se que o grupo gere cerca de um bilhão de dólares por ano, provenientes do apoio direto do Irã, negócios e investimentos internacionais, redes de doadores, corrupção e atividades de lavagem de dinheiro.
Nos anos 90, o grupo foi considerado responsável pelos atentados contra a embaixada israelense em 1992 e a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA) em 1994, que resultaram em dezenas de mortes. Juízes argentinos decidiram em abril de 2024 que o ataque à AMIA foi realizado pelo Hezbollah e respondeu a um “projeto político e estratégico” do Irã.
A recompensa oferecida pelos Estados Unidos, evidencia suspeitas de que o Hezbollah opera ou busca expandir sua influência no Brasil e na região da Tríplice Fronteira, utilizando atividades criminosas e tentativas de recrutamento.
Sobre investigações
A CNN entrou em contato com a Polícia Federal e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) ara apurar se há indícios recentes de atuação, operações ou investigações em curso para combater ou neutralizar ações terroristas do grupo no país.
A PF respondeu que não confirma nem se manifesta sobre eventuais investigações em andamento. O Ministério da Justiça ainda não respondeu.
Este conteúdo foi originalmente publicado em Recompensa de R$ 60 mi dos EUA: entenda presença do Hezbollah no Brasil no site CNN Brasil.