[Coluna] Lady Gaga no Rio: liberdade, diversidade e… ódio

Copacabana virou, no fim de semana, uma grande celebração do orgulho. Mas show de Lady Gaga também estava na mira do ódio de pessoas radicalizadas, que miram públicos formados majoritariamente por gays e meninas.”Era tanta a bateção de leque que daria para acabar com o aquecimento global.” Esse post no X (ex-Twitter) faz parte das milhares de frases e memes que li nas redes sociais enquanto acompanhava – infelizmente à distância – o show de Lady Gaga no Rio de Janeiro, que no sábado (03/05) reuniu, segundo a Riotur, mais de 2 milhões de pessoas nas areias de Copacabana.

Nos vídeos, vemos os leques, um dos símbolos da comunidade gay, batendo em sintonia. Do palco, Gaga agradeceu a essa comunidade: “meu amor pela comunidade LGBTQIA + do Brasil é imenso”, disse.

Copacabana virou, no fim de semana, uma grande celebração do orgulho. É sempre bom ver diversidade nas ruas, ainda mais em um país campeão de crimes contra homossexuais e na mesma Copacabana que ficou famosa por abrigar manifestações extremistas de bolsonaristas homofóbicos.

O ódio

Infelizmente, o ódio direcionado a LGBTQIA+ (e também a mulheres e outras populações vulneráveis) continua firme e forte. Não deu nem tempo de ver todas as imagens do show de Gaga antes que a gente lembrasse que “há perigo na esquina”.

No domingo, a Polícia Civil do Rio de Janeiro disse ter impedido um ataque com explosivos no show que era planejado por homofóbicos radicalizados na internet.

De acordo com a polícia, os envolvidos estavam recrutando pessoas, incluindo adolescentes, para promover ataques integrados com uso de explosivos improvisados e coquetéis molotov.

“O plano era tratado como um desafio coletivo, com o objetivo de obter notoriedade nas redes sociais. Os alvos da operação atuavam em plataformas digitais, promovendo a radicalização de adolescentes, a disseminação de crimes de ódio, automutilação, pedofilia e conteúdos violentos como forma de pertencimento”, informou a polícia.

De acordo com os investigadores, os principais alvos dos grupos eram LGBTQIAs.

Tendência preocupante

É assustador. E infelizmente não é novidade. O crescimento do ódio é global e planejar ataques contra públicos formados majoritariamente por gays, meninas e mulheres parece ser uma nova tendência triste.

Em agosto passado, três shows de Taylor Swift foram cancelados em Viena, na Áustria, por ameaça de ataque terrorista.

Um dos suspeitos era um jovem de 18 anos que teria se radicalizado na internet e feito um juramento de lealdade ao grupo jihadista Estado Islâmico (EI).

Em setembro, foi a vez de um adolescente de 15 anos ser preso em Frankfurt no Oder, no estado alemão de Brandemburgo.

Ele tinha ligações com os jihadistas responsáveis pela ameaça de ataque aos shows de Taylor e também planejava ataques contra a parada do orgulho gay da sua cidade.

Também ano passado, uma tragédia aconteceu no Reino Unido. Três crianças morreram e outras cinco crianças ficaram feridas em um ataque a faca que aconteceu durante uma oficina de dança inspirada nas músicas da cantora Taylor Swift na cidade de Southport

O suspeito era um jovem de 17 anos.

Todos esses casos têm muito em comum. Os criminosos são muito jovens e aliciados online em grupos de ódio, aqueles que lucram com misoginia e homofobia. E os alvos são principalmente pessoas da comunidade LGBTQIA + e meninas.

Sim, parece saído da série Adolescência, da Netflix, mas infelizmente é vida real.

Liberdade gera ódio

Meninos radicalizados odeiam a alegria e querem conquistar alguns minutos de fama praticando o terror para assim ganhar respeito de seus “colegas” de comunidade de ódio. A dinâmica é a mesma dos atentados a escola, que viraram “febre” no Brasil em 2023.

Não é coincidência que Taylor Swift e Lady Gaga e seus públicos atraiam tanto ódio. As duas cantoras falam de empoderamento, de se aceitar do jeito que se é e são idolatradas por isso.

A liberdade e a autoaceitação geram ódio. E quanto mais a sociedade avança (vamos lembrar que, não faz tanto tempo assim, não era comum que casais gays demonstrassem afeto em público) mais crescem os grupos radicais de ódio.

Acho que ninguém sabe ainda como acabar com essas redes de crimes de ódio. Mas, uma coisa é certa: voltar atrás não é mais uma opção. Eles podem reclamar, tentar atacar. Mas não tem mais como impedir que as ruas de Copacabana, e de cidades do mundo todo, sejam tomadas por, como disse uma moradora do bairro em um vídeo que viralizou, “tsunamis de viados” (sic). Que venham outros.

_____________________________

Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000, quando lançou com duas amigas o grupo “02 Neurônio”. Já foi colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. É uma das criadoras da revista TPM. Em 2015, mudou para Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada. Desde então, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão.

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.